20. No lugar de qualquer um

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Acordo e há uma luz que me encandeia. Ponho a mão em frente da cara tapando a luz que era apontada aos meus olhos. Espreguiço-me e bocejo. Roço o nariz na almofada e abro as pernas criando um espaço mais confortável para se estar deitada. Bati com o pé contra algo. Abanei a cabeça, confusa, e sentei-me rapidamente, dando de caras com Michael.

Eu estou deitada com Michael, na cama dele? Mas que merda...

"O que se passou?" Guinchei, já a transpirar de nervos e a tremer de aflição.

"Nada." Ele riu. "Tem calma. Havia uma grande possibilidade de não fazermos nada. Estavas com sono e a dormir, não bebeda."

"Quando estou a dormir faço muitas coisas de que não me lembro no dia seguinte." Puxei os lençois contra mim e discretamente olhei para baixo deles, tentando ver como me encontrava. Ok, eu estou com a roupa de ontem. Ufa. Ele não me tirou nada.

"Eu entendi isso quando tu começaste a falar, a gemer, rir, chorar, puxar-me os lençois, tentar-me atirar abaixo da cama." Michael disse-o sem conseguir controlar o riso.

"Desculpa." Murmurei envergonhada. "Que horas são?"

Ainda tentei procurar algum relógio algures por aqui, mas não havia nenhum. Arqueei-me por cima das pernas de Michael, ficando literalmente em prancha por cima dele, olhando para a mesa-de-cabeceira para ver se ele tinha lá algum relógio.

"Dez da manhã." Ele disse num tom sério.

Ainda por cima dele, eu encarei-o. Ele estava com uma expressão séria. Calculei que fosse por eu estar a fazer peso nas suas pernas. Trinquei o lábio inferior inocentemente, rindo ao mesmo tempo, para que o meu olhar de "pessoa que não parte um prato" o acalmasse. Ele começou a rir também.

"Desculpa." Disse com dificuldade ao levantar.

Pois bem, a primeira coisa que eu fiz, foi mesmo deixar-me cair. Porra. Eu e o meu desequilíbrio.

"O Ashton chega em menos de uma hora." Sussurrou com a sua voz rouca contra o meu cabelo. "Acho melhor ires arranjar-te."

"É... Também acho." Aclarei a voz. "E também acho que não deverias estar tão perto de mim." Fiquei cara a cara com ele. Realmente muito proximos. Quase como uma provocação para com ele, visto o que eu tinha dito anteriormente.

"Porque não?" Disse-o contra os meus lábios. Eles estavam quase colados aos dele.

"Porque tu não te podes apaixonar."

Levantei-me rapidamente da cama por entre risos. Achei uma enorme piada àquilo que aconteceu agora e à maneira como eu reagi e o fiz reagir.

As suas expressões eram demasiado engraçadas para eu me conseguir controlar. E a maneira que eu joguei com o psicológico, e o fiz jogar também, deixou-me na duvida sobre o tipo de pessoa que eu seria.

Dirigi-me ao meu quarto e eu já estava com a chave na mão para abrir a porta, visto que a deixei trancada na outra noite, quando esta foi aberta. Por dentre. De lá saiu Ashton. Merda.

"Então... passaste a noite fora, não é?" Disse-o de forma ameaçadora. "Com o motorista?" Gargalhou. "Pelo menos tu mudas de homem como quem muda de cuecas."

"AH AH." Simulei um riso. Um riso cínico. "Falou alguém que me colocou como prostituta." Franzi-lhe a sobrancelha.

Com o passar dos dias eu sinto-me mais forte e mais capaz de o enfrentar. De o deitar abaixo talvez. Não lhe posso mostrar que é ele que manda, quando não é. Não me posso deixar ficar. Não é a minha idade que me vai definir a capacidade de defesa.

Ashton pareceu surpreendido da maneira que o abordei e eu sorri-lhe.

"Não, eu não mudei de homem." Esclareci. "E tu só dizes isso porque gostavas de estar no lugar de qualquer um dos dois, não é?" Trinquei o lábio. "Talvez se não fosses uma pessoa tão pobre de espírito tivesses tido aquilo que querias." Aproximei-me do seu ouvido e puxei-lhe a gravata. "Recomendo-te a mudar de postura pessoal e social."

"Para de fazer isso." Ele empurrou-me. Recompus a minha postura e cruzei os braços. "Isto é para ti." Atirou para o chão diante mim uma caixa de papel e foi-se embora.

Posto isto, apanhei a caixa do chão e entrei para o quarto. A cama estava desfeita. Consegui ver que tinha um monte de papeis por cima. Eram fotografias e eu nem me apercebera do que se tratava até me continuar a aproximar, a passos lentos.

Peguei em algumas, com as mãos a tremer. Eram assustadoras. Aterrorizantes. Conseguia ver Luke sentado e amarrado numa cadeira, com um pano na boca, embora esta estivesse ensanguentada. Outra tantas fotos tinham um homem ao lado do Luke. Um homem muito semelhante a Ashton, mas eu sei que não era ele. Quer dizer, ele estava aqui agora. Ele está diferente, mas ele está aqui em casa e não foi sequestrado. Mas que estava ali um homem a sofrer, muito parecido com ele, lá isso estava.

Levei as mãos à boca como habitual expressão de choque.

"O que fizeram contigo, Luke?" Murmurei de mim para mim.

Passei para a próxima foto. Ele estava no chão, ainda com as mãos amarradas. A sua cara gritava desespero e dor. O meu pobre rapaz. Eu amo-o e estou vê-lo a sofrer lentamente por fotos. O que é isto? Ashton, seu filho da puta.
Atrás da foto dizia: "Abre a caixa." A caixa. Aquela que Ashton me deu. Eu assim fez. Já não estou receosa. Sei que tudo pode acontecer, então pretendo vê-lo rapidamente. Merda. Continuo nervosa.

Penso que o nervosismo ninguém me pode tirar, depois de ver o sofrimento da pessoa que eu amo. E se isto não for de agora? E se depois destas fotos se tiver passado alguma coisa? Sei lá... E se ele já não estiver mesmo cá? Se nunca mais estiver comigo para além da vida. A verdade é que eu o amo. Muito. Mais do que me amo a mim. Preciso de uma maneira de concertar isso porque eu não devo viver assim. Foi uma das poucas coisas que a minha mãe me ensinou, logo depois de o meu pai nos ter abandonado.

Abrindo a caixa eu vi um gravador com uma cassete. Carreguei no play. Como fundo ouvia gritos de dor. Consegui entender que era o Luke. Poucos segundos depois eu ouvi uma respiração ofegante e logo a seguir começaram a falar.

"Qual é a sensação de víveres numa mentira?" Era a voz de Ashton. "Qual é a sensação de perderes a pessoa que mais amas? Tudo isso está envolvido aqui, Lola Martinez. E tu vais perder tudo aquilo que gostas. Tal como eu perdi quando tinha a tua idade." Parou de falar durante uns momentos. Eu senti a mágoa dele e eu não entendia. "Quando tu estiveres a ouvir isto, já não vais ter rasto de mim por muito perto que eu possa estar. Mas olha, minha querida, ficas com a minha casa, com os meus bens, mas eu fico com a tua vida." Gargalhou. "Se pisares o risco com alguma coisa, eu vou torturar o teu amado. Tens a certeza que é isso que queres?" Ouvi um grito vindo de Luke. "Queres ver o teu amor a sofrer?"

DADDY'S FAVORITE •  L.H • 1ª VERSÃO (NÃO EDITADA)Onde histórias criam vida. Descubra agora