Bernardo
Acordei sentindo um leve caminhar sobre meu corpo. Ao abrir os olhos me deparei com Cão sobre meu abdômen. Droga. Tinha um cachorro em minha cama e o pior de tudo é que isso não me deixou louco como eu achei que ficaria. Não que eu não goste de cachorros mas nunca gostei muito da ideia de ter animais na cama.
Catarina, ao contrário, vivia dormindo com Banzé quando os dois moravam na mesma casa. Aquilo era meio nojento mas era de certo modo bonitinho, admito. Era inevitável não se apaixonar pelo pequeno cão, que agora se aproximava de Catarina. O peguei, para que não a acordasse. Dormia serenamente.
Estava começando a me acostumar a dormir com ela e a acordar com essa maravilhosa visão. Ontem foi divertido, adorava o entrosamento de Cata com meus pais e o fato de ela se dar muito bem com a minha família. Sem esquecer de que ela cuidando de Carol era demais. Catarina até que tinha bastante jeito com crianças, mas apesar de adora-las sempre abominou a ideia de ter um filho. Nunca entendi o motivo, mas enfim... Observei ela levar uma de suas mãos até Cão, que continuava comigo, e o acariciar lentamente.
- Bom dia! - Falou sorridente.
- Bom dia, bela adormecida. - Dei um beijo em sua testa.
- Achei que vocês dois estariam mortos ao amanhecer. - Disse, divertida.
- Por? - Perguntei.
- Bom, você mataria o Cão por ele ter feito as necessidades no seu quarto e depois teria um ataque. - Eu ri. Realmente, eu ficaria puto se o cachorro fizesse algum tipo de bagunça no meu quarto.
- Eu deixei uma fresta na porta pra ele poder sair e ir até a área de serviço. Você deu mais sorte com esse. - Disse e logo me arrependi.
- Pois é, estou fazendo de tudo para adestrá-lo. A parte de "você só pode no jornal" não foi das mais difíceis, ainda bem. - Desabafou. Coloquei Cão no chão, e então deitei de frente para Ana. Os olhos escuros me encararam, os lábios carnudos foram umedecidos pela língua que vivia me causando arrepios, os cabelos estavam levemente bagunçados, a cara de sono... Não pude evitar o que viria a seguir.
- We don't need anything or anyone... If I lay here, if I just lay here would you lie with me and just forget the world? I don't quite know how to say how I feel.- Comecei, olhando em seus olhos.
- Those three words are said too much. They're not enough... If I lay here, if I just lay here. Would you lie with me and just forget the world? - A música não saia de minha cabeça e expressava perfeitamente meus sentimentos. Catarina sorriu, reconhecendo uma de suas musicas favoritas, Chasing Cars. Mais uma influência dela na minha vida musical.
- Forget what we're told, before we get too old. Show me a garden that's bursting into life. Let's waste time chasing cars around our heads... I need your grace to remind me to find my own. - Me surpreendi quando Catarina continuou e parei de cantar para ouvir sua voz. Ela não cantava bem, do contrário, mas aquilo me deixou emocionado, me deu uma vontade enorme de dizer a ela que eu a amo, que a quero só pra mim, cantando daquela forma todos os dias. Senti algo totalmente indescritível. Amor, eu acho.
- If I lay here, if I just lay here would you lie with me and just forget the world? - Cantamos juntos. Catarina me encarou por um tempo e então levantou rapidamente da cama, saindo do quarto. Droga. Esse era meu medo, não queria assustá-la.
Encontrei ela na cozinha. A cabeça baixa e as mãos encostadas na pia só revelavam a cagada que eu havia acabado de fazer. Ela percebeu minha presença então virou de frente pra mim, dando um sorriso fraco.
- Estou morrendo de fome. - Tudo bem, aquilo provavelmente era verdade. Mas ela não saiu do quarto apenas por isso, não mesmo.
- Deixe comigo. - Disse, abrindo a geladeira. - Você precisa parar de influenciar meu gosto musical. - Falei, tentando dar a ela uma outra ideia do que havia acabado de acontecer. - Já me basta John Mayer. - Catarina deu uma risada e eu senti o alívio tomar conta de mim. Peguei o que precisaria para nosso café da manhã e comecei a fazê-lo.
- Não acredito! - Ana foi até mim quando percebeu o que eu iria preparar.
- Você merece. - Ela sorriu.
- Quer ajuda? - Se ofereceu.
- Me alcance os ovos, por favor, esqueci deles. Preciso de dois. - Catarina assentiu, indo até a geladeira. Ouvi um barulho de ovo quebrando e me arrependi amargamente de ter pedido que ela pegasse.
- Ops! - Me virei e lá estava ela, com o ovo estatelado a sua frente. Os lábios inferiores sendo mordidos me deixaram com água na boca. Não consegui segurar e ri alto da cena. - Não ria de mim.
- Eu já deveria saber que você ia derrubar. - Falei, balançando a cabeça negativamente enquanto segurava a risada. Ana franziu o cenho e logo senti um ovo me atingindo em cheio. Ainda bem que estava sem camiseta. Ela me olhava apreensiva quando levou a mão até a boça, parecendo surpresa.
- Desculpa, foi um ato impensado. - Falou. Eu queria tanto poder rir. Tudo bem que ela não precisava ter feito isso, mas já que Catarina havia começado, não vi motivos para não continuar. Peguei um punhado de farinha de trigo e fui até ela.
- Ber, não faça isso. - Pediu. - Desculpa, é sério. Não queria ter feito isso. - Parecia sincera, ainda mais pela cara que havia feito logo depois que me acertou. Catarina fazia isso as vezes e eu geralmente adorava seus atos impensados. Joguei todo o conteúdo que tinha em minhas mãos em seu cabelo, recebendo um olhar enfurecido.
- Estamos quites princesa. - Disse, rindo.
- Estamos quites o caralho. Você jogou no cabelo. - Apontou o punho cerrado em minha direção e eu me afastei. Cata enfiou a mão na geladeira, pegando mais um ovo.
- Pare com isso, Catarina, você já me arremessou um desses e eu nem reclamei. - A verdade era que eu estava me divertindo pra caramba com aquilo.
- Fique quieto seu puto, joguei um ovo nesse seu abdômen ridículo, que é bem fácil de limpar. Você jogou no cabelo. - Tudo bem, eu entendo que deve ser difícil de limpar, mas Cata nunca foi do tipo que fugiu de uma bagunça.
- Ei, pode parar. Você começou com essa merda toda. Nem venha com essa Catarina, se não queria se sujar era só não ter começado. Não pode tomar um banho e lavar o cabelo depois? - Falei, irritado.
- Eu...eu. - Começou, desconcertada. - Desculpa. - Pediu novamente. A observei pegar alguns guardanapos e limpar o chão. Encostei na bancada, ainda pensando no que tinha acabado de acontecer.
- Eu preciso ir embora. - A voz estava tão baixa que eu mal a ouvi. Foi até meu quarto e eu a segui.
- Desde quando você foge assim, Catarina? - Perguntei, verdadeiramente intrigado. Ela juntou suas coisas, pegou Cão e finalmente me encarou.
- Obrigada por... Bem, por me deixar ficar aqui e... - Saiu. Sentei na cama ao ouvir a porta da frente fechar. O que tinha acabado de acontecer afinal de contas? As palavras trocadas na cozinha eram normais, claro, discutíamos de vez em quando. Mas ela nunca ia embora, nunca. Fiquei sentado, olhando pro nada por mais um tempo e então voltei a cozinha. Precisava comer.
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Gravity
RomanceDepois de um trauma, Catarina percebeu que não conseguia mais se entregar a ninguém de verdade. Mas será que era pelo que aconteceu? Ou por seu coração pertencer a alguém? "Eu correria, se não fosse tão bom estar em seus braços" NÃO RECOMENDADO PA...