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PERSEU

Quando finalmente voltei a mim de vez, não havia nada de estranho com o lugar ao meu redor, a não ser que era mais agradável do que eu estava acostumado. Estava sentado numa espreguiçadeira em uma enorme varanda, olhando ao longo de uma campina para colinas verdejantes à distância. A brisa tinha cheiro de morangos. Havia uma manta sobre as minhas pernas, um travesseiro atrás do pescoço. Tudo isso era ótimo, mas minha boca me dava a sensação de ter sido usada como ninho por um escorpião. A língua estava seca e pegajosa, e todos os dentes doíam. Sobre a mesa ao lado havia bebida num copo alto. Parecia suco de maçã gelado, com um canudinho verde e um guarda-chuva de papel enfiado em uma cereja.
Minha mão estava tão fraca que quase derrubei o copo quando passei os dedos em volta dele.

- Cuidado - disse uma voz familiar.

Grover estava apoiado no gradil da varanda, e parecia não dormir havia uma semana. Embaixo de um braço, segurava uma caixa de sapatos. Estava usando jeans, tênis de cano alto Converse e uma camiseta laranja-claro com os dizeres ACAMPAMENTO MEIO-SANGUE.
Apenas o velho Grover. Não menino-bode.
Quem sabe não tive um pesadelo? Talvez minha mãe estivesse bem. Ainda estávamos de férias e tínhamos parado ali naquela grande casa por alguma razão. E...

- Você salvou minha vida - disse Grover. - Eu... bem, o mínimo que eu podia fazer... voltei na colina. Achei que você poderia querer isso.

Reverentemente, ele colocou a caixa de sapatos em meu colo.
Dentro havia um chifre de touro branco-e-preto, a base irregular por ter sido quebrada, a ponta salpicada de sangue seco. Não tinha sido um pesadelo.

- O Minotauro - disse eu.

- Ahn, Percy, não é uma boa ideia...

- É assim que o chamam nos mitos gregos, não é? - perguntei. - O Minotauro. Meio homem, meio touro.

Grover mudou de posição, pouco à vontade.

- Você ficou desacordado por dois dias. Do que se lembra?

- Minha mãe. Ela está mesmo...

Ele abaixou os olhos.
Olhei ao longo da campina. Havia pequenos bosques, um riacho sinuoso, campos de morangos espalhados embaixo do céu azul. O vale era cercado por colinas ondulantes, e a mais alta, bem na nossa frente, era a que tinha o grande pinheiro no topo. Mesmo isso parecia bonito à luz do sol.

Minha mãe se fora. O mundo inteiro deveria estar escuro e frio. Nada devia parecer bonito.

- Desculpe - fungou Grover. - Eu sou um fracasso. Eu... sou o pior sátiro do mundo.

Ele gemeu, batendo o pé com tanta força que ele saiu, quer dizer, o tênis Converse saiu. Dentro, estava recheado de isopor, a não ser por um buraco em forma de casco.

- Oh, Styx! - murmurou ele.

Um trovão ecoou no céu claro.
Enquanto ele lutava para pôr o casco de volta no falso pé, pensei: Bem, isso resolve as coisas. Grover era um sátiro. Podia apostar que, se raspasse o cabelo castanho cacheado, encontraria pequenos chifres em sua cabeça.
Mas eu me sentia infeliz demais para me importar com a existência de sátiros ou mesmo minotauros. O importante era que minha mãe realmente tinha sido espremida para o nada, dissolvida em luz amarela.

Afterglow [Percy Jackson]Onde histórias criam vida. Descubra agora