Livro 3: Kauê e os filhos da Amazônia - O Sangue De Eldorado

Capítulo Especial - ANHANGÁ

A Tartaruga se movimentou lentamente entre as rochas negras cheias de fissuras, ela odiava ter que andar para fazer tal percurso, no entanto, não podia usar seus poderes de deusa da chuva e voar, primeiro que este não é um lugar muito adequado para uma tartaruga voadora, ela poderia ser vista e isto não seria muito bom e usar seus poderes a fariam ser sentida... E isso com certeza seria pior ainda! Então o único jeito foi ir andando, ela está fazendo tal percurso a 1000 dias... Sim, 1000 dias andando sem qualquer descanso, qualquer folha de alface ou água, somente escuridão, fogo, gritos de fantasmas e criaturas monstruosas andando de cima para baixo... Realmente, ela sente que está tendo muita sorte ou não, afinal, todo mundo pensa que ela está morta, ou seja, ninguém sente falta de um morto... Ao menos é o que ela espera até que finalmente chega em seu destino.

À medida que chegava lentamente perto, seu casco parecia pesar muito, mas muito mais, com certeza é a reação ao poder de Tupã... O Deus que a amaldiçoou, mesmo sentindo como se seu corpo fosse ser esmagado por tamanha pressão, ela continuou em frente, estava ali para pagar uma dívida e... Quem sabe até mesmo de quebra voltar a sua forma normal, claro apenas uma consequência pelo seu enorme esforço...

Quando seus pequenos olhos de réptil avistaram a enorme caverna que tinha grades feitas pelos raios do próprio Tupã, seu pequeno coração deu um salto... Havia também selos desenhados pela própria Yushã em cada parte da caverna, impossível a entrada desta vez... Antes havia sido fácil, ainda mais quando ela estava em sua forma verdadeira, como deusa da chuva totalmente poderosa... Ela se aproximou das grades feitas de raios, o poder ali a fazia sentir todo seu corpo tremer... Até mesmo sua pequena cauda que ela sempre odiou... Seus pequenos olhos conseguiram avistar em meio a escuridão de dentro da caverna apenas uma luz laranja... Retida em dois olhos... Os olhos que um dia ela já temeu olhar diretamente, na verdade que todo ser deste mundo excluindo os deuses, temeram olhar...

Barulhos de correntes foram ouvidas, ele com certeza está sentindo sua presença... Ela se curvaria se pudesse, mas seu casco pesado a impede de tal coisa é sinceramente, ser uma tartaruga e virar de barriga para cima em meio ao próprio Submundo seria o ápice de seus 1000 dias conturbados e cansativos...

-Hehe, olá, minha velha amiga, finalmente conseguiu sair do esconderijo que eu a enviei, se passou quantos anos? 30 anos terrestres? Eu acho, veja só você, me parece bem, emagreceu ou esse casco está encobrindo sua banha? - riu ele com um certo humor sádico.

A Tartaruga reviraria os olhos se pudesse, mas não passou por todo este perrengue para ouvir calada as risadinhas dele, além do mais, há algo que ela quer muito fazer a anos.

-E olha só você, ainda preso aqui, de verdade, eu achei que já estivesse solto e não estaria aqui, certo? Se tivesse me ouvido e não tivesse feito a burrice de se aliar a Ares - disse ela sem qualquer medo, agora sim, toda a fúria e frustração que ela guardou dentro de seu casco vão sair.

As correntes se mexeram, ela engoliu em seco, talvez tivesse sido um tanto mal educada ao se dirigir a ele e o pior é que correr não seria uma opção para ela em seu estado e gritar muito menos... Ele foi saindo da escuridão aos poucos... Seu corpo e sua face logo começaram a serem iluminados pela luz dos raios e finalmente ela pode ver seu corpo inteiro e está do mesmo jeito que ela se lembrava, continua musculoso e robusto como um cavalo com seus 2,5 metros de altura, seu corpo ainda é todo branco e pálido, assim como seu cabelo curto, pintados com tinta vermelha, em seu peito tem um rosto de esqueleto de um veado... Seus olhos alaranjados profundos com certeza são o que mais chamam a atenção além de sua face que às vezes parece ser ameaçadora com um sorriso vil e outra brincalhona com um sorriso quase gentil... Seu senhor, Anhangá, Deus do submundo, ainda continuava mesmo com sua presença implacável e paralisante...