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Lavínia: nessa manhã

A cirurgia que estive mais nervosa na minha vida com certeza foi a de Gabriel. Me paramentei toda e entrei no centro cirúrgico quando ele já estava dormindo com um acesso na veia do braço e com o tornozelo direito preparado.

Débora estava tranquila na cadeira de anestesista decidida a ouvir todas as poesias acústicas desde a 1, e olha que nós já estamos na de número 27. Sim, vinte e sete. E o mais doido é que eu sei todas. Ignorei a galeria cheia de médicos assistindo, todos queriam ver se eu ia salvar ou acabar com a carreira do cara que é artilheiro do ano há dez anos.

A cirurgia estava tranquila mas eu estava concentrada como nunca estive na vida. Toda paciência era pouca pra ter cuidado e não atingir nenhum nervo do pé de Gabriel, e eu já tinha limpado os desgastes da articulação, já tinha reconstruído o calcancofibular anterior e já estava reconstruindo o talofibular posterior dele quando ouvi uma das enfermeiras dizer: - "Dra, os batimentos cardíacos dele estão acelerados."

Olhei pra tela e lá estava o ritmo cardíaco. 160 bpm. 163, 169, 177.

"São as células de defesa dele querendo expulsar a anestesia!" - Débora constatou se levantando.

182, 188, 192 bpm... Eu paralisei ao ver o ritmo se aproximar do 200 e ouvir o bip bip bip que indicava alerta, além do bpm estar vermelho piscante na tela. As palavras que me fizeram reagir foram de uma das enfermeiras: - "Ele está com taquicardia com potencial de óbito."

Não. Pensa, Lavínia. Pensa.

"25 de ditialzem. Agora!" - Ordenei.

"Eu vou intubar! Paciente perdeu o controle da respiração." - Ouvi Débora gritando enquanto algumas enfermeiras traziam o tubo necessário.

"Paciente atingiu o pico de 200 bpm, taquicardia muito arriscada. Perca de controle da respiração e grave risco de infarto do miocárdio, potencial de óbito." - A mesma enfermeira repetiu me olhando, o nervoso e o pavor não me deixavam pensar. Não, não, não. Pensa, Lavínia.

"Mais 30 miligramas." - Ela me olhou receosa e aplicou na veia de Gabriel. Débora começou uma massagem cardíaca enquanto uma outra enfermeira ventilava o tubo na garganta dele, levando oxigênio.

"O bpm não para de subir. Dra Lavínia, você é a chefe dessa cirurgia e eu preciso que você ordene o que fazer."

"Mais 50 miligramas." - Todas elas me olharam nervosas. O pessoal que assistia a cirurgia na galeria estava falando coisas que poderiam ser feitas, mas eu não interpretava.

"Ele não vai aguentar ao todo 105 miligramas no corpo, doutora."

"Vai! Eu estou mandando! 50 miligramas a mais na veia dele, agora! Débora, pega o desfribilador!" - Eu estava gritando. Eu não posso perder Gabriel, eu não posso.

E eu não vou.

Débora me entregou o desfribilador para fazer o choque cardíaco nele, já que ela não pode fazer por estar grávida. Gritei: - "Carrega em 10. Afasta!" - Dei o primeiro choque e ele não respondeu. - "20! Afasta! - Dei mais dois choques e nada. - "Aplica as 50 miligramas!!!!!"

As enfermeiras se recusavam a aplicar mais do medicamento por causa do risco pro fígado e pra outros órgãos dele, mas eu ainda gritava e mandava que o fizessem se não nos proximos minutos eu posso perder de vez o amor da minha vida. A pessoa no topo da minha lista de favoritos.

Meus superiores desceram as escadas, colocaram máscaras e entraram aqui. - "Doutora Lavínia, você está completamente fora de si. O risco de perder esse paciente pela dosagem de ditialzem é alta."

Casamento Arrumado - GabigolOnde histórias criam vida. Descubra agora