"Quanto a mim serei poesia até o fim"
Desde pequena minha mãe sempre me ensinou que a morte era algo natural, "nascemos para morrer e morremos para renascer" era isso que ela sempre dizia para mim e meu irmão, crescemos ouvindo isso como um mantra.
É engraçado parar pra pensar que ela sempre nos preparou para esse sentimento, de perda, vazio e angustia. É como se ela soubesse de coisas que mais ninguém soubesse, e tivesse vivido mais do que todo o mundo, mesmo sendo tão nova. Ela costumava dizer que quando morresse, gostaria de renascer nas águas do mar, não importava se fosse como uma pequena alga ou uma grande baleia, com tanto que elas estivesse no oceano, estaria em casa. Papai sempre brigava com mamãe quando ela nos falava coisas do tipo, até hoje nunca entendi o por que dessas brigas bobas que eles tinham.
Eu e Henrique não entediamos muito bem, éramos apenas crianças querendo brincar na beira do mar e aproveitar nossas férias na casa da vovó.
Fomos crianças felizes, na verdade, fomos uma família feliz. Apesar de todas as brigas e discussões com o papai, sempre estávamos alegres e saltitantes, mamãe sempre se certificava disso.
Até ela morrer.
Encerro meus devaneios quando meu pai para o carro na frente de um condomínio de luxo na beira da praia. Sinceramente não esperava nada menos que isso para o filho de ouro dele.
- Chegamos - é a primeira palavra que meu pai fala em 8 horas de viajem.
Imediatamente desligo a música que estava escutando no fone de ouvido e saio do carro. Estamos tão perto do mar que consigo escutar as ondas quebrando na costa e sentir o cheiro salgado do mar.
- Mamãe amaria isso tudo - Deixo escapar baixinho enquanto desamarro a minha prancha de surfe do teto do carro.
- Amaria se estivesse viva - Ele praticamente ruge, enquanto tira uma única mala do portas malas.
Encolho meu corpo o máximo que consigo diante de seu olhar frio e de desprezo. Não é como se eu não estivesse acostumada com isso, mas também não é como se não machucasse todas as vezes que acontecem.
Seguimos em direção a portaria do condomínio, onde o porteiro nos informa qual é o prédio e o apartamento do meu irmão.
Quando chegamos no segundo prédio luxuoso, entramos no elevador, onde meu pai aperta o botão para o décimo andar. Ficamos em completo silêncio durante todo o tempo que passamos na caixa de metal. Logo que as portas se abrem vejo apenas uma porta em todo o andar, o que dá a entender que é um apartamento apenas.
Toco a campainha e quase que imediatamente meu irmão aparece na porta sem camisa, com o cabelo molhado e o sorriso mais grande que eu já vi na vida. Dou um sorriso genuíno em ver sua felicidade em nos ver.
- Pai - ele fala alto e dá um abraço bem apertado no nosso pai, que imediatamente retribui na mesma intensidade.
- Oi filho, quanto tempo meu garoto - ele fala orgulhoso, dando um tapinha nas costas do meu irmão, como forma de carinho.
- Isso não teria acontecido se tivessem vindo me visitar ano passado - fala se afastando do abraço de papai com uma cara de deboche engraçada, o que me faz deixar escapar uma risada baixa, chamando sua atenção.
Ele vem rapidamente em minha direção parecendo um urso com os braços abertos e um sorriso de coringa.
- Henrique seu doido - grito rindo enquanto ele me abraça pela cintura me tirando do chão e me rodando no ar rapidamente.