13. Honrados - Briseis

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Girei o cabo da minha espada no peito de Merrick, sem conseguir acreditar que ele havia baixado a guarda a ponto de me permitir virar um jogo quase perdido.

Embora eu não me considerasse uma péssima combatente para alguém que foi introduzida no mundo dos espadachins há poucos dias, a ilusão que imitava Merrick era excepcionalmente boa. Todos os seus movimentos eram precisos e calculados para detectar meus menores erros que, a propósito, foram muitos.

Mesmo sabendo que o melta era apenas uma miragem, não consegui impedir que o desespero tomasse conta de mim.

Seus olhos quase caricatos e o rosto cruel me traziam à tona os mais diversos sentimentos: medo, raiva, dor... dúvida. Já havia desistido de contar quantas vezes executara um movimento errado e pagara com minha própria pele. Mas o que eu esperava? Que os cristais me colocassem para duelar contra as crianças matruakys? Não, já estava bem claro que nada ali seria me dado de mão beijada.

Ainda assim, após perder algumas (muitas) gotas de suor e sangue, eu conseguira abrir, sabe-se lá como, uma oportunidade de matar Merrick.

Então a agarrei com todas as forças.

Soltei o ar preso em meus pulmões ao sentir a lâmina da espada avançando através dos músculos, ossos e cartilagens na caixa torácica de Merrick. O sangue que brotou ao redor da arma suscitou em mim uma esperança e alegria que há muito não me permitia sentir.

Infelizmente, aqueles sentimentos duraram milésimos de segundos. Apenas até minha atenção finalmente se fixar no fundo dos olhos de Merrick e eu me dar conta de que, na verdade, estava diante de orbes verdes como esmeraldas.

Assim como os olhos de Heitor. Idênticos a eles.

Seria outra ilusão?

Desencravei a espada do meu oponente e deixei que o corpo despencasse no chão.

Em uma fração de tempo eu já desenhava todos os cenários possíveis em minha mente. Um deles terrível o suficiente para me causar arrepios e me fazer desejar estar errada...

Ouvira o garoto solicitar o desafio logo depois que me dirigi aos cristais, mas achava que eles não o considerariam. Não deveriam o considerar. Se eu me pronunciei primeiro, caberia apenas a mim a dádiva da participação.

Tive esperanças de que meu adversário voltasse a ser Merrick ou que apenas sumisse, porém, não aconteceu. Para meu horror, quando voltei a atenção ao corpo no chão, ele ainda era Heitor. A camisa azul, que poucos minutos antes eu havia puxado entre os meus dedos para trazê-lo até mim, agora estava tomada pelo carmim no ponto onde a ponta irregular da espada adentrou.

Caí sobre minhas pernas, aparando-o entre os braços. Não conseguia processar coisa alguma. Sequer pensava racionalmente.

Parece que temos um vencedor ao cair do último grão de areia, mas, sua vitória não nos satisfaz. — Entoaram as mesmas vozes que estiveram dentro da minha mente durante a luta, zombando e apontando o quão fraca eu era.

— Do que estão falando? — Eu estava tonta. —  Levem essa coisa para longe de mim, eu... não quero vê-lo assim. Não quero mais ilusões!

Você é um ser peculiar. Indiscutivelmente traz em suas veias a essência, mas também traz sombras tão densas quanto a própria escuridão. Nos intriga saber que chora e abraça a criatura que você mesma feriu.

— Por que a prova não acaba? Eu fiz o que mandaram! Venci meu oponente — protestei ignorando o falatório em minha cabeça.

Nenhuma resposta.

Ventos do Outono - Livro 2Onde histórias criam vida. Descubra agora