24. Não se pode apagar o passado - pt. 5

62 10 1
                                    

Ninguém entenderia minha história. As coisas que eu fiz. Ou melhor, que tive que fazer. E mesmo assim, cá estou, contando a verdade.

Todos na roda me olhavam, petrificados como as rochas da caverna do lago em que nos encontrávamos. Eu tinha acabado de revelar que eu tinha cortado minha perna fora. E agora eles queriam saber o porquê.

Por quê? A resposta é relativamente fácil: era isso ou a morte.

Mas isso vocês vão entender mais pra frente. Essa história começa um pouco antes...

Mais especificamente no dia em que os Cascavéis invadiriam Brasília e tomariam o poder.

***

Acordei na cama de Gaspar no grande dia, e, por um breve momento, fiquei confusa.

Até que me lembrei dos acontecimentos do dia anterior. De como Gaspar havia me beijado e me conduzido até seu quarto. De como ele falava sobre dominação, sobre querer herdeiros.

De como ele havia me usado.

Quando abri os olhos aquela manhã, estava claro: Gaspar havia me usado. E a sensação que senti em seguida foi como se um pedaço de mim houvesse morrido.

Porque eu confiava em Gaspar cegamente e eu simplesmente não entendia como ele podia ter feito aquilo.

Mas eu ainda era inocente demais e doutrinada demais para entender a gravidade da situação.

Por isso, continuei deitada, pensando em como aquele dia traria desafios. O plano para invadir Brasília era cheio de etapas, mas minha parte consistia em uma das mais importantes dele.

Naquela manhã, depois de preparar meu equipamento de intercomunicação da equipe dos Cascavéis, eu embarcaria num helicóptero que aterrissaria numa base secreta de outro grupo revolucionário brasileiro: os Lua Negra.

Os Cascavéis e os Lua Negra não eram exatamente aliados, mas tínhamos os mesmos objetivos. Gaspar tinha conseguido negociar uma invasão a Brasília conjunta.

Sabe como é, o inimigo do meu inimigo é meu amigo. Para tirar o ditador Graecus do poder, valia tudo, mesmo planos arriscados como o de hoje.

Naquela noite, quando todos os ministros estivessem reunidos no Palácio do planalto para o rebuscado jantar mensal que o ditador adorava dar para discutirem seja lá quais planos doentios eles tramavam, eu era a responsável por desativar os sistemas de segurança que permitiriam a entrada da equipe tática.

Usando minha individualidade, o plano era manipular a visão dos seguranças e entrar no palácio. Uma vez lá dentro, eu tinha que fritar o sistema de segurança, desligando os protocolos que isolariam Abel Graecus em caso de ataque. Assim, o ditador e seus ministros estariam expostos, e quando nossas equipes invadirem, eles não teriam escolha se não se renderem.

Com os mais poderosos chefes de Estados como nossos reféns, seria fácil instituir um novo governo. Uma nova era sem preconceitos, onde todas as pessoas com individualidades seriam livres.

Ninguém precisava mais morrer. Sem mais esse banho de sangue. Naquela noite, esperávamos uma rendição pacífica do ditador.

Era um plano complicado, e muito dependia de mim e dessa individualidade que me foi dada. Mas eu sabia que conseguiria.

Era meu dever.

Deitada naquela cama estranhamente confortável, percebi que Gaspar ainda dormia. Como ele conseguia dormir tanto no dia mais importante da nossas vidas? Ele deve estar muito confiante mesmo. Se algo desse minimamente errado, estaríamos todos mortos.

Sentimentos Explosivos - UA de BNHAOnde histórias criam vida. Descubra agora