Joyce DeLuna pode ver fantasmas ─ seres que para muitos são translúcidos, para ela são tão reais quanto os seres vivos.
Apesar das peculiaridades que a cercam, ela vê a rotina mudar ao conhecer Sunwoo Kim: o fantasma de um jovem desaparecido antes d...
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⠀⠀⠀ERAM QUASE QUATRO horas da tarde quando o garçom finalmente colocou os pratos diante de Joyce, cujos lábios bufava vez ou outra enquanto os dedos batiam na mesa devido à demora de Sarah, que estava no banheiro há mais de doze minutos.
Ela suspirou pesadamente e olhou ao redor, buscando, na direção do toalete, a cabeça de Sarah. Talvez devesse ir até lá, se certificar de que a amiga não havia caído no vaso? Joyce apoiou os braços na mesa e fez menção de se levantar, no entanto, ao notar que o restaurante se tornara um mar de pessoas, com ruídos e garçons correndo de um lado a outro, desistiu.
Do lado de fora, o mesmo caos parecia cercar as ruas de San Peul que, apesar de ser Véspera de Natal, se encontravam lotadas de pessoas e espíritos.
Aquela época era terrível. Joyce odiava. Os fantasmas ficavam mais sensíveis e tendiam a grudar nos familiares — até nos que odiavam. Se notassem que ela podia enxergá-los, a infernizavam para enviar algum recado a alguém ou para os ajudar a resolver suas pendências. Alguns pediam coisas impossíveis, e a médium não queria receber pedidos de vingança naquele fim de ano. Ela havia experienciado mais do que o suficiente de vingança e tentativas de assassinatos naquele ano — e nos anteriores.
Depois de sobreviver ao assassino das rosas estava convicta disso: não queria mais saber de problemas catastróficos que pudessem levá-la à morte nem tão cedo.
Yuan parecia pensar o mesmo, pois logo após encontrarem Sunwoo vivo, no sítio pertencente à família Tshar — o mesmo sítio onde Sarah parou durante a viagem universitária —, lhe informou que finalmente tiraria o período de descanso que acumulara nos últimos anos. Ele havia partido no dia anterior, numa viagem pelo país, sem rumo onde esperava assimilar tudo que havia acontecido e... se reencontrar.
Joyce entendia o que havia nas entrelinhas do sorriso forçado de Yuan, ao mencionar a viagem, mas, assim como ele, não mencionou — a dor da traição ainda a machucava quando pensava em Miguel, para ele deveria ser mil vezes pior pensar em seu ex melhor amigo.
Nesse ínterim, o detetive Hélio Golvino, responsável pelo caso de Kim antes do fechamento, retomara as investigações, não mais como um caso de desaparecimento, e sim de tentativa de homicídio, enquanto outra equipe havia se juntado a ele para a resolução do caso de prostituição envolvendo a Tshar Entretenimento. O escândalo na empresa acabou adiando o debute do ABYSS para o ano seguinte. As ações da empresa despencaram, o presidente e o CEO foram substituídos numa votação entre os acionistas na manhã seguinte à prisão de Félix.
A mudança no nome da agência estava em votação, o futuro dos artistas sem debute era incerto, a maioria não queria ter o nome atrelado a uma empresa com aquele histórico. Metade das pessoas envolvidas no esquema haviam sido presas, por pura pressão da população e mídia, enquanto outras — as mais poderosas — estavam sob investigação.
