— Eu costumo ter muitos sonhos todas noites. Às vezes, porque elas são agitadas. Às vezes, são os efeitos dos remédios — afirmei.
— Ontem a sua noite não foi agitada — disse Vanessa, finalmente olhando em meus olhos — e você não tomou clonazepam para dormir.
— Tem razão.
— Então, sabe de qual sonho estou falando, agente Norman.
Eu lembrava de Sophia, dos conselhos que lhe dei sobre os garotos da escola, das nossas brincadeiras com Collie e das folgas de trabalho. Quando visitava mamãe, via minha irmã na cama do quarto, escrevendo. Era triste lembrar de cada momento nosso. Sentia raiva da vida por tê-la tirado de mim. E descobri que o luto só termina, em média, depois de nove meses. Mas tudo ainda parecia tão claro na minha cabeça.
O lado racional do nosso cérebro se desliga durante todas as fases do sono, principalmente no sono REM, onde as atividades cerebrais se agitam e os sonhos mais vivos acontecem. O inconsciente é ativado e ignora as cenas que não fazem sentido. Podemos pular de um prédio de dez andares e sobreviver, desviar de tiros, nadar por horas e horas sem cansar.
Durante as investigações, os sonhos foram se tornando repetitivos e dolorosos. Ainda que não pensasse mais em minha irmã com tanta frequência, eu sonhava com os coveiros desenterrando-a naquele cemitério fedorento. Eles faziam isso porque os médicos erraram no diagnóstico e declararam a sua morte equivocadamente. Eu encontrei a verdade de alguma forma inexplicável e fui atrás de justiça, até conseguir o direito de tirá-la debaixo da terra. Ao abrir o caixão, Sophia levantava, no auge de sua beleza adolescente.
Eu não sei como Sophia sobreviveu dois meses em um espaço apertado, ou de que maneira os médicos erram no diagnóstico. Ela apenas saía do caixão, sorria para mim, depois estávamos em casa, conversando sobre as mesmas coisas de sempre. Entretanto, logo pela manhã, assim que os pássaros começavam a trinar, eu acordava com o mesmo vazio no peito de antes.
— Srta. Jones, não vim conversar sobre os meus assuntos, — eu disse à assassina. — Vim conversar sobre os seus problemas.
— A sua irmã não está morta — Vanessa voltou sua atenção para as cartas.
— Sophia foi enterrada no cemitério de Charlotte. Eu mesmo ajudei com o funeral. E não acredito nessas coisas de... espíritos, nem de... cartas de tarô.
— Se não acredita, por que espera que eu confesse sobre ele?
Assassinos em série caminham assombrados por passados turbulentos. Traumas durante os primeiros anos de vida, como violência sexual, assédios e estupros moldam as características mentais de uma criança, tornando-a suscetível a desenvolver transtornos psicológicos. Quem não recebe amor, corre o risco de não entender o significado desse sentimento. Mas quem recebe ódio, descarrega nos outros as suas frustrações.
Psicopatas se acham superiores, pensam que não possuem fraquezas, consideram-se o ápice da evolução humana. Eles são arrogantes por natureza, desmembram os seus medos e torturam você mentalmente quando não conseguem atacar de maneira física.
Nunca revele os seus medos. Esconda-os. É incerto dizer se alguém será parceiro ou rival. Se for inimigo, ele não terá misericórdia, nem piedade.
Vanessa não sentia nenhum tipo de afeto por mim. Ela não queria consolar a pessoa que colocou o seu traseiro dentro de uma cela suja e quente. Ao dizer que Sophia não estava morta, o seu único desejo era me fazer lembrar de algo doloroso, como forma de punição.
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Confissões de uma assassina
Mystery / ThrillerEllis Norman é uma agente do FBI que colecionou muitos desafetos no mundo do crime. Quando surge uma série de assassinatos nas redondezas de Portsmouth, ela descobre que há um padrão de vítimas escolhidas para morrer na mesma hora e no mesmo lugar...