Capítulo 12

36 5 22
                                    

Não prestei atenção em nenhuma jogada seguinte, aquilo não me interessava. Meu marshmellow ficou como um carvão e eu não aguentava mais escutar os beijos molhados de Peter e Charlotte.

Eu mesmo me sinto insuportável.

Passei as mãos pelos meus cabelos cansado. Eu posso simplesmente me levantar e ir para barraca, mas a ideia de ficar sozinho ali não me agradava.

— Por que você saiu do Canadá e veio para esse fim de mundo? — Perguntou Charlotte para Cassidy.

Levantei o olhar interessado, havia muitas coisas que eu ainda queria saber sobre Cassie.

— Ah... — Ela suspirou um tanto desconfortável. — Minha irmã conseguiu emprego no hospital daqui e...

— Conta outra! Tantos hospitais no Canadá, fala sério! Ninguém saí de um lugar tão grande para vir trabalhar aqui, aliás foi um milagre que ela tenha conseguido algo no Chemical Flowers. — Peter a interrompeu enquanto mastigava um marshmellow.

O fuzilei com o olhar.

— Talvez ela não esteja confortável em falar sobre isso. — Falei secamente, chamando a atenção dele, que me olhou com cara de poucos amigos.

— Resolveu abrir a boca?

— Ah! Cala a boca seu idiota, não aguento mais ouvir essa sua voz insuportável. — Miranda exclamou com raiva.

E mais uma confusão estava por vir.

Entre xingamentos, Florence tentando acalmar os ânimos e Miranda quase avançando sobre Peter, vi Cassidy levantar discretamente e caminhar em direção a floresta.

Me levantei também e a segui, enfim escapando daquela confusão.

A noite estava como uma obra de arte de Van Gogh. Desde que botei os olhos em A Noite Estrelada, tento a todo o momento imaginar a noite como um dos quadros mais maravilhosos.

A noite estava linda, coberta de estrelas e foi muito fácil para mim pensar em mil possibilidades de desenhos e pinturas. Eu precisava da minha tela e minhas tintas o quanto antes.

— Aqui é bem melhor, né?

Cassie murmurou, seus olhos focados no céu.

— É...

Ainda era possível escutar a gritaria, mas já estávamos afastados o suficiente da confusão.

— Há duas coisas que mais inspiram os artistas — Cassie se virou para mim com um sorriso. — O amor e as estrelas.

Sorri me escorando em uma árvore grossa.

— E... Bem, não posso negar que o sexo também. — Ela riu.

— Tem muitas músicas sobre sexo por aí — Refleti voltando a olhar para o céu. — Muitas pinturas, muitos livros, muitas poesias...

— Você tem uma música favorita? — Cassie perguntou de repente.

— Ah... Elephant Gun... —  Respondi um tanto confuso.

— Nossa, acho que nunca escutei essa música.

— É simplesmente a melhor música do mundo! — Sorri animado. — Me traz uma sensação de liberdade e um tipo de alegria melancólica... Não sei explicar muito bem, mas a música é de uma orquestra chamada Beirut.

Lembrei-me dos versos e do instrumental magnífico de Elephant Gun, é impossível não amar essa música. Eu a conheci quando tinha 13 anos, costumava escutar sentado no jardim e às vezes até dançava e rodopiava ao seu som com meus fones de ouvido. Essa música me inspirou para diversas pinturas, mesmo que eu tenha as descartado há alguns anos.

— E a sua?

Paradise, Coldplay.

Ela não disse mais nada, seus dedos brincavam com seus próprios cabelos e ela sorria fraco. Eu queria mais, estava tão curioso sobre ela que precisava saber seus sentimentos mais profundos e o porquê aquela era sua música favorita.

— Sério? Eu amo o instrumental dessa música. Por que ela é a sua favorita? — Perguntei olhando diretamente para ela.

Cassidy desviou seus magníficos olhos do cabelo e olhou para mim, mesmo apenas a luz da lua eu conseguia ver os traços de seu rosto jovial e único.

— Escutei muito ela durante uma época difícil da minha vida. Ela é muito importante para mim e... — Ela desviou o olhar e pareceu refletir por um breve segundo. —  E é isso.

Ela não queria falar mais sobre isso, pude ver em sua face tão transparente. Estava tudo bem.

— Nesses dias que estamos aqui, percebi que você gosta muito de flores. — Murmurei buscando suavizar a expressão em seu rosto.

— Sim, especialmente tulipas amarelas, são as minhas favoritas desde a infância! — Seu rosto se iluminou novamente. — Sonho em um dia ter um jardim maior que a minha própria casa,  coberto de tulipas amarelas e algumas outras flores e árvores.

Tulipas amarelas...

Muitas memórias foram desbloqueadas em minha mente, eu conhecia um lugar o qual Cassie amaria.

E eu precisava levá-la até lá.

— Acho melhor a gente ir pra barraca, já está bem tarde e aquele pessoal não vai parar de brigar tão cedo — Cassidy suspirou esfregando os olhos. — Digo, eu já vou. Se você quiser ficar...

—  Não, você tem razão. Se eu te disser que quero voltar para casa desde o primeiro dia em que pisamos aqui, você vai me achar mimado?

Cassidy riu enquanto caminhávamos, pegamos outro caminho para não termos que passar pela barraca.

— Acho que não, mas é preciso se adaptar fácil — Ela sorriu. — Novos lugares e experiências são coisas excitantes.

— É, sair da zona de conforto é muito importante às vezes.

Quando já estávamos bem próximos da barraca roxa, lembrei de algo que aconteceu na fogueira.

Eu deveria ter ficado calado, mas não consegui.

— Sobre o beij...

— Ela é sua namorada, não precisa se justificar sobre isso. Muito menos comigo.

Corei, não tendo mais coragem para olhar em seu rosto.

Por algum motivo que eu ainda desconhecia, aquilo me machucou.

— Eu fui um pouco grossa, desculpa.

Dei um sorriso forçado enquanto abria o zíper da barraca.

— Tá tudo bem, você está completamente certa. Não fazia o menor sentido mesmo. — Engoli em seco.

— Eu... Eu espero que a gente ganhar pelo menos uma prova do acampamento. — Ela murmurou mudando de assunto.

— Pois é, eu também.

PrimaverilOnde histórias criam vida. Descubra agora