Capítulo 22

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Eu nunca o havia visto daquela forma.

Seu rosto estava abatido, extremamente pálido e seu corpo magro como eu nunca o havia visto.

Aquele era mesmo Lewis?

— Louis... — Até sua voz parecia fraca, um mero murmúrio em seu elegante escritório. — Faz muito tempo que não nos falamos, filho.

Engoli em seco, caminhando em passos lentos até a poltrona em frente a sua mesa.

— Pois é... Sinto que precisamos conversar, sobre muitas coisas.

—Com toda certeza, Louis. Fui muito bem informado por Royer.

Mas é claro que foi.

Desviei o olhar, passando os olhos pelas estantes de livros históricos e políticos, muitos sobre Washington e um livro de capa negra, sem título na lombada. Aquele livro me chamou a atenção.

Fui tirado dos meus pensamentos pela voz fraca e ao mesmo tempo julgadora do meu pai.

— Por que você não está mais com a filha dos Pringle? Estava tudo resolvido, mas recentemente recebi uma ligação enfurecida do senhor Foster, me perguntando o motivo pelo qual eu o permiti terminar com a filha dele. — Até então, apesar da voz intimidante e o olhar contido de fúria, sua voz expressava uma calma mortiça. — E Royer me informou que isso tem a ver com uma garota, gorda e de um bairro de classe média baixa. O que tudo isso significa, Louis?

Em outra época, eu ficaria com medo e iria fazer de tudo para dar uma resposta "agradável", aos olhos de Lewis.

Mas, com toda dignidade e coragem que notei que havia em mim, eu o respondi da mais sincera forma possível.

— Eu terminei com Florence, pois não a amo. Nunca amei. Nunca senti absolutamente nada além de afeição por ela. E acredito que essa seja uma escolha minha, se eu quero me casar ou não com ela, afinal isso afetará diretamente o MEU futuro — Fiz uma pausa, observando seu olhar surpreso pelo fato de eu não ter demonstrado medo e não ter gaguejado uma única vez. — E sobre a garota "gorda de classe média baixa", ela tem nome e se chama Cassidy Stewart. Estou perdidamente apaixonado por ela, é a garota que quero ao meu lado, mesmo sendo tão jovem eu sei o que quero e não vou abrir mão dos meus reais e profundos sentimentos por uma fachada.

Seu olhar que antes estava surpreso, foi  aos poucos tomado por raiva, o vi cerrar os dentes antes de dar um forte murro na mesa de madeira, me pegando de surpresa e me assustando.

— E você acha que eu amava a sua mãe quando me casei com ela?! Que tipo de ideia ridícula é essa?! Os Pringle são a família de médicos mais renomada de Arcadia!

Não me deixei intimidar, olhei em seus olhos e pensei em expor toda a realidade que assolava os Pringle naquele momento, no fato de que apenas queriam casar Florence comigo para salvar a família da total falência.

Mas não fiz isso, apesar de tudo, eu ainda tinha afeição por Florence e não queria destruir mais ainda a sua família.

— Eu não quero isso para a minha vida, Lewis. Se essa foi a sua escolha, com toda certeza não será a minha. Não quero um casamento sem amor e sem brilho, não me importo com o que os outros vão achar, eu quero viver por mim e pela minha felicidade — Me levantei da cadeira, tomando coragem para dizer tudo o que estava entalado em minha garganta por anos. — Eu não quero seguir carreira na política, não quero me tornar prefeito dessa cidade, eu tenho outros sonhos, outras ambições. Eu quero escrever o meu próprio destino, não viver o que você escreve e deseja para mim.

Sua reação, foi imediata.

Lewis se levantou tão rápido quanto se aproximou de mim, não me encolhi e não demonstrei medo.

O tapa foi certeiro, forte.

Mas não doeu em minha pele, não me machucou fisicamente.

Aquele tapa machucou minha alma, e eu soube naquele momento que nunca o esqueceria.

— Tudo o que eu fiz! Tudo! Tudo foi por você e é assim que você responde toda a dedicação e amor que dei totalmente a você? — O grito dele podia ser ouvido por toda casa, eu tinha certeza. — Você é o meu primogênito, meu filho perfeito, quem eu dediquei toda a minha vida. Você tem noção de quantas expectativas as pessoas dessa cidade colocaram em cima de você? Você tem noção do que seu avô me fez passar para ser quem eu sou hoje? E tudo o que você faz é me responder dessa forma, escolhendo ser um vagabundo pintando aquelas porcarias de quadros!

Dessa vez eu me encolhi, sentindo meus olhos ficarem marejados e minha bochecha arder cada vez mais pelo seu tapa. O garotinho assustado havia voltado, mais uma vez.

— E você chama isso de amor? — Sussurrei, ainda ousando olhar em seus olhos.

— Amor? O que é amor para você, Louis? Você não vê que não é nada sem isso, sem meu título, sem essa casa, sem dinheiro... — Ele ficou bem próximo de mim, quase me encurralando em uma de suas grandes estantes. — Antes era só você, até que nasceu a idiota da sua irmã, que só me deu desgosto e me envergonhou. Você, era a única esperança para essa família.

Queria protestar, defender minha irmã e mostrar que era uma pessoa nova e forte.

Mas não consegui, tudo o que fiz foi escutar, enquanto meu rosto se molhava pelas minhas lágrimas.

— Louis... Eu... — A voz de Lewis ficou fraca, notei seu olhar perdido e vazio. — Eu estou morrendo, o que vai ser do nosso legado quando eu for? O que vai ser de tudo, se você não tomar frente e fazer essa família prosperar e honrar o nome dos Theodore?

O olhei confuso, como assim ele estava morrendo? Passei a mão pelo meu rosto, enxugando as lágrimas enquanto o observava se afastar.

Lewis abriu uma gaveta de sua mesa, retirando um envelope grande e marrom. Ele simplesmente o jogou na mesa, se sentando em sua cadeira com um olhar exausto e perdido.

Me aproximei, pegando o envelope, eu tremia com medo do que havia ali.

Assim que o abri, entendi completamente tudo o que continha naquela folha branca, escrita com letras pretas e inevitavelmente impressa com uma tinta escura.

Câncer de Intestino.

Terminal.

Não consegui sustentar o papel em mãos, o deixando cair. Um arrepio tomou meu corpo e tudo o que fiz foi encarar Lewis, desacreditado.

Sua aparência de repente, pareceu bem pior em minha visão. Era óbvio o motivo de sua ausência agora.

Ele estava em busca de tratamento, em busca de uma cura.

— Há quanto tempo você teve esse diagnóstico? — Perguntei com a voz trêmula.

— Já faz quase um ano... Eu estive melhor em uma época, estive fazendo tratamento em um dos melhor hospitais de Washington. — Ele suspirou, a voz com aquela terrível calma mortiça. — Mas não há mais o que fazer, o câncer é terminal e eu estou cansado de fazer tratamento, dessa quimioterapia pesada... Estou cansado de tudo.

— Eu...

Eu não conseguia murmurar nenhuma palavra. Foi como se um flash passasse em minha mente, me lembrando de todos os momentos que tive com o meu pai até chegar aqui, até saber que ele iria morrer em algum momento e que ele estava me fazendo um pedido que mudaria minha vida por completo.

— Eu te peço, meu filho. Por favor, não deixe o nome dos Theodore morrer, não o desonre dessa forma... Eu sei que eu tenho sido duro mas... Tudo o que eu fiz, foi por amor por essa família.

Ou, por pura ganância e ambição.

Não consegui ficar na sala, me virei e saí em passos rápidos, abrindo a porta e dando de cara com Louisa, que soluçava de tanto chorar.

Ela havia escutado tudo.

Não consegui abraçá-la, não consegui a confortar como sempre fazia.

Corri, explodindo em lágrimas e sem saber aonde ir, sem saber o que fazer, sem conseguir pensar direito.

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