Capítulo 6

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Felipe Bellini

Todo meu autocontrole e profissionalismo tinha ido para bem longe nesse momento.
A ver deitada em meu colo tão confortável me fez sentir coisas que nunca senti antes. Eu me senti bem, leve e feliz.
Porém, por outro lado me sentia a pior pessoa do mundo. Primeiro por ter colocado meus sentimentos acima da minha ética profissional, e segundo por saber que Heloísa é praticamente uma criança. É óbvio que ela possui TDI, mas além disso, Heloísa possui traços infantilistas. Talvez seja pela falta de contato com o mundo exterior, afinal metade da vida dela foi trancada em um hospital psiquiátrico. Mas mesmo sabendo disso, me sinto péssimo por ter outros pensamentos por ela, ainda mais depois de vê-lá totalmente sem roupa sendo que a mesma nem sequer sabia que isso é errado.

Nesse momento já sai do hospital e estou indo em direção a casa dos meus pais, jantamos juntos sempre que possível. Deixei minhas meninas sob cuidados de Suzie. Trabalho com ela a muito tempo e não pude deixar de trazer-lá para cá. Expliquei toda a situação de Heloísa e Suzie prontamente aceitou. Fico feliz por ter alguém de confiança cuidando dela. Além disso, ela me aconselhou a fazer exames clínicos em Helo por precaução, afinal não sabemos quando foi a última vez que fizeram isso.

Chego na grande casa onde meus pais moram. A desculpa deles para ter uma casa tão grande foi "queremos muitos netos brincando por aqui", então, quem somos nós para discordar. Por enquanto, possui apenas um bebê na família, meu sobrinho Theo, filho do meu irmão mais velho com sua esposa. Mas é claro que minha mãe já deixou explícito sua vontade de ser avó novamente, e todas as suas indiretas em relação ao assunto são direcionadas a mim e ao meu irmão mais novo.

Olho para o jardim a minha frente, e por um breve momento imagino um serzinho loiro de olhos verdes correndo pela grama. Balanço a cabeça negativamente, eu só posso estar ficando louco. Heloísa não deve saber nem o que é beijar, imagina o que é ter um filho.

Abro a porta principal entrando direto na sala encontrando meus pais e meu irmão mais novo. Victor é simplesmente o mais mimado de todos nós, e nossa mãe o trata como um bebê, mas a real é que nós três somos extremamente apegados a nossos pais e não nos importamos em demonstrar nossos sentimentos por eles.
Cumprimento meu pai com um toque de mão, meu irmão com um tapinha de leve e minha mãe com um beijo na testa.

P: Como foi no hospital, filho? - pergunta quando sento no sofá.

F: Mãe, sinceramente, eu não faço ideia. - falo passando a mão no rosto. - Ao mesmo tempo que foi tranquilo, foi conturbado. Minha ética profissional foi parar lá na China e pela primeira vez me senti perdido. - solto tudo de uma vez e vejo três pares de olhos me encarando sem entender. Ah se eles soubessem Hellen quase matou alguém hoje. Eu já tinha comentado sobre Heloísa e seus problemas com eles, mas não aprofundei muito.

M: E desde quando você deixa seu profissionalismo de lado? Como aconteceu isso? - pergunta surpreso me fazendo suspirar.

F: Heloísa tem feito com que eu deixasse tudo de lado. - fecho os olhos sorrindo quando lembro do seu sorriso ao ver o sol pela janela. - Ao mesmo tempo que tenho vontade de liberta-la de tudo, tenho vontade de colocar ela em um potinho e proteger de todo mal do mundo, mas a quero do meu lado. - falo mas me assusto quando meu irmão começa a tossir.

V: Felipe Bellini? Você está bem? Não, você não é meu irmão. - fala e eu taco uma almofada nele.

F: Não enche Victor. - falo emburrado. - Eu não queria, mas aconteceu. Ver ela deitada encolhida no meu colo, foi o fim pra mim. - suspiro sabendo o que vou escutar de agora em diante.

M: Você está apaixonado. - fala sem mais nem menos e eu arregalo os olhos em sua direção. - Não faz essa cara pra mim moleque. Você tem 27 anos na cara, sabe muito bem o que sente.

F: Não pai, você não entende. - suspiro. - Heloísa tem a mente de uma criança. Pior, ela tem a mente de uma criança e mais duas personalidades dentro dela, sendo uma delas também criança. - encosto no sofá. - Eu não posso tirar a inocência delas assim.

P: E quem disse que você vai tirar a inocência delas? - fala batendo na cabeça do meu irmão para ele levantar e dou risada vendo ele resmungar. Minha mãe vem até mim se sentando do meu lado e pegando em minhas mãos. - Você apenas irá cuidar delas como elas merecem, com amor e carinho. Além disso, elas estarão muito mais protegidas ao seu lado do que sozinhas naquele hospital. - fala sincera. - Não estou dizendo que você precisa levar elas para morar com você, nem nada disso, se você precisar tomar alguma atitude, que seja por amor e não por pena. Entendeu? - pergunta e eu concordo. Minha mãe está sempre certa. - Agora vamos jantar porque estou com fome. - fala levantando enquanto nós três apenas assentimos obedecendo a dona da casa.

Durante o jantar não tocamos mais no assunto. Nossa conversa foi regada das brincadeiras de Victor enquanto nossa mãe resmungava que não tínhamos elegância. Sinto meu celular vibrar sem parar no meu colo e olho para baixo vendo o nome de Suzie na tela. Um sentimento ruim de angústia invadiu meu peito na hora me deixando preocupado, alguma coisa aconteceu com Heloísa. Peço licença para meus pais saindo da mesa e indo atender a ligação.

~ Ligação on

F: Suzie, tudo bem? Aconteceu algo? - pergunto assim que atendo.

S: Doutor, desculpa te ligar esse horário, mas você pediu para ligar caso algo acontecesse e... - interrompo.

F: Suzie, o que aconteceu? - pergunto ja no auge da preocupação.

S: Entrei no quarto da Heloísa agora e a encontrei no chão desacordada e sangrando. Eu... eu cheguei perto dela e percebi que ela tinha uma ferida muito grande na altura da barriga. - fala me fazendo desacreditar no que ouvi, ela não pode ter feito isso.

F: Me diz que ela não tentou ... - dessa vez ela me interrompe.

S: Não. Alguém fez isso. - suspiro um pouco aliviado mais ainda sim, quase surtando. - Tinha um bilhete ao lado dela escrito "ela mereceu. Não deveria nem ter nascido." - nesse momento já estou dentro da casa dos meus pais pegando minha carteira e as chaves do meu carro.

F: Estou indo para aí. - falo chegando na sala de jantar. - Não vou demorar. - desligo.

ligação off ~

M: Vai onde? - meu pai pergunta.

F: A Heloísa, ela... - sinto a angústia me corroer por dentro - alguém machucou ela dentro do próprio quarto. - lágrimas se acumulam em meus olhos e recebo olhares surpresos. Estou preocupado com Heloísa mas também com o que vão falar do meu hospital. - Não sei como fizeram isso, mas eu preciso ir pro hospital. - falo respirando fundo e pegando a chave do carro.

V: Você não vai dirigir assim. - fala pegando a chave da minha mão entregando ao meu pai. - Eu te levo. - tirou as chaves do seu carro do bolso. - Ele sai e vou logo atrás sem discutir e mal me despedindo dos meus pais. Victor dirige rápido mas com calma pelas ruas, a calma que está totalmente distante de mim agora. - Você gosta dela, não é? - pergunta atraindo minha atenção.

F: Conheço ela a menos de uma semana. - falo vendo o hospital um pouco mais à frente.

V: Isso não te impede de gostar dela. - fala e eu apenas concordo. Nesse momento só quero saber se ela está bem.
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Fortes emoções por aqui 😢

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