Na minha mente todas as lembranças dos péssimos momentos que eu vivi com Vladimir fazem com que eu queira sair correndo dele pra nunca mais sofrer de novo. Sempre foi assim, primeiro o êxtase e depois a queda dolorosamente abismal. Mas meu coração e meu corpo... Não conseguem desgrudar nossos lábios. O amor e a saudade que sinto por ele me paralisam. É uma mistura muita insana de paixão mesclada com ódio, euforia e hesitação. Algo me diz para eu ficar e aproveitar a ocasião e no dia seguinte colar, mais uma de milhares, todas as partes de mim que ele quebrar quando me dar as costas e se acovardar perto das pessoas, incapaz de assumir nosso amor, mas eu também não quero viver um romance apenas entre quatro paredes. Mereço mais do que isso. Então, com muita dificuldade, eu me afasto.
— Eu preciso ir — comunico pensando em Daniel e Ícaro que devem estar esperando por mim no restaurante que marquei de encontrá-los. Eu mandei uma mensagem avisando que tive um problema inesperado e que iria me atrasar um pouco. Eu já deveria saber que essa conversa com Vladimir não acabaria bem.
— Não... Não vai... Fica aqui comigo... — Vladimir me puxa pela camisa e começa a distribuir beijos por meu pescoço. É praticamente impossível me esquivar. É irresistível e incontrolável. Uma ereção já se formando, implorando por atenção.
Resisto, pego em seu pescoço com as duas mãos e o empurro, irritado.
— Pra quê? Pra você me usar e depois me jogar fora como se eu fosse algo descartável? Não, Vladimir. Não! E você ainda teve a ousadia de achar que eu iria me submeter a ameaça ridícula do Virgílio pra salvar sua pele?
Vladimir me solta e fica cabisbaixo. Arfo, impaciente. De repente, ele dá início a um choro copioso.
— Eu sou uma merda de pessoa, eu sei! Mas eu não faço por mal, eu juro! — ele balbucia escondendo o rosto com as mãos como um garotinho que acaba de receber uma bronca.
— Meu Deus, Vladimir! — passo a mão pelo rosto e cabelo nervosamente. — Por que é tão medroso? Vai esperar a vida toda para expor o óbvio? Por puro orgulho?! De quantas vidas você vai precisar pra vencer essa autohomofobia? Não entende que pouco importa a forma de amar desde que estejamos amando? Você precisa se resolver consigo mesmo primeiro e depois a gente conversa.
— Me dá uma chance? — ele enfim me fita. — É só isso o que eu te peço. Você melhor do que ninguém conhece a minha situação. As coisas são complicadas demais para serem resolvidas rapidamente.
— Eu não sei... — expresso sentindo veracidade em suas palavras. Seu pedido me deixa balançado. Pensando em quem sabe resgatar o que eu tinha com Daniel e Ícaro, argumento: — Eu não sei se você está pronto pra esse novo Ramon.
— O que quer dizer? — seus olhos marejados me fixam curiosos.
— Eu vivi muitas coisas e... Não sei se você concordaria com a maioria delas.
— Está falando de se relacionar com mais de uma pessoa, não é?
— Não só isto. O mundo não é do tamanho da caixa onde você se condicionou a viver.
— Eu posso não ter a mesma experiência de vida que você porque eu me impedi de viver como deveria, mas eu estou disposto a conhecer o mundo além das minhas paredes se for com você. Eu só preciso de que você tenha paciência comigo.
— Eu tive toda a paciência do mundo com você e o que você fez? Preferiu se casar com minha irmã!
— Eu não me arrependo. Se eu não tivesse me casado com a Iaskara, eu não teria tido dois filhos maravilhosos. Mas me arrependo de não ter tido uma vida com você. Só que, não dá pra ter tudo.
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Beba deste cálice (CIGANO/GAY)
RomanceRamon é cigano, pertence a etnia Calon e cresceu levando uma vida peregrina pelo Brasil até sua comunidade finalmente conseguir se instalar em terras mineiras. Ele se entende gay e terá que enfrentar a própria cultura para ser quem realmente é.