capítulo 7

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Quando a campainha tocou alguns momentos depois, ela abriu a porta, estremecendo um pouco ao ter a vista salpicada por vermelho-fogo, laranja e violeta. Na noite anterior, a gravata de Camila a intrigara. Na luz do dia, ela agredia seus sentidos.

— Bom dia — ela saudou, em um tom seco e pegando a mala. — É melhor corrermos. Estamos atrasadas. Os outros estarão esperando.

Camila apertou os lábios imperceptivelmente. Depois de três anos, ela se acostumara com a reação que sua aparência causava. Mas o recuo involuntário de Lauren e sua saudação seca vinham antes da noite mal dormida e das muitas horas passadas no telefone naquela manhã, apurando o status das investigações sobre as ligações que ela recebera. Camila não gostava de se atrasar, assim como não gostara da informação que finalmente arrancara do Departamento de Polícia de Nova York. Conseqüentemente, sua saudação foi tão concisa quanto a dela.

— Eles terão que esperar um pouco mais. Você precisa mudar de roupa. Está chamando muito a atenção.

Surpresa, ela olhou para a própria roupa. Camila não tinha nada contra a calça preta dela, mas a túnica rosa-choque de cadarço preto amarrado sobre um dos braços e a bota do tipo militar em um preto cintilante atrairia os olhos de qualquer um, especialmente no corpo de Lauren.

— Vou dividir com você uma dica do meu negócio — disse ela. — A menos que queira parecer uma armadilha, é bom disfarçar a vítima.

Camila pôde ver que ela não gostou de ser descrita como uma vítima. Mas depois de ouvir as transcrições da fita que ela dera a polícia com as ligações noturnas, Camila não podia descrevê-la de forma diferente.

— Pelo menos nas próximas semanas — ela continuou —você deve chamar o mínimo de atenção.

Os cabelos longos e brilhantes de Lauren caíam sobre seus ombros, quando ela ergueu a cabeça para examinar o rosto de Camila. Camila se esticou quando ela olhou para seu pescoço.

— Seria mais fácil para mim não chamar a atenção se minha guarda-costas não vestisse vermelho e laranja estampados em olhos-de-peixe — ela sugeriu.

Camila tocou em sua gravata, imaginando por um momento se ela tinha compreendido mal a reação de lq3uren quando ela abriu a porta. Mal conseguiu impedir um sobressalto quando ela viu o item em questão pela primeira vez. Mas tinha sido um presente da criança de cinco anos que ela salvara em um gueto de viciados fortemente armados e racistas. A menina tinha sido seqüestrada pelo pai, que não acreditava que a corte ou sua ex-mulher tivessem autoridade sobre ele. Jody escolhera a gravata sozinha, ela dissera a camila, solenemente. Ela a vestira para agradá-la, mas desde então a gravata virou uma espécie de talismã. Naquela ocasião, pelo menos, servira a um propósito útil.

— Eu prefiro que os olhos das pessoas se direcionem a mim do que a você — ela falou à cliente. — A gravata ajuda quase tanto quanto as cicatrizes.

Ela arregalou os olhos suavemente quando Camila mencionou sua desfiguração. Camila aprendera que a maioria das pessoas preferia rodear um assunto em vez de ir diretamente ao ponto. Ela jamais aprendera a fazer rodeios.

— Você pode fazer sua parte se vestindo um pouco menos como uma... — Ela a examinou rapidamente. — Como uma super modelo.

Camila esperava uma tromba ou um protesto. Em sua experiência limitada, a última coisa que uma mulher bonita queria era minimizar a importância de seu poder de atração. Para sua surpresa, ela reprimiu sua impaciência óbvia com o atraso e a conduziu para dentro.

— Não trouxe muita coisa comigo de Nova York, mas posso pegar algo emprestado com Rocky.

Camila ficou pensando nesse nome enquanto entrava. Rocky. Rachel Jauregui. A irmã gêmea de Lauren.

— Você quer uma xícara de café ou alguma coisa, enquanto eu troco de roupa?

— Não, obrigada.

— Não demoro.

Com as mãos nos bolsos, Camila apoiou um ombro na parede e analisou o hall de entrada e a imensa sala de estar. Na noite anterior, a casa estava cheia de pessoas e barulho.Camila notou sua elegância, mas absorveu pouco de suas características.

Nessa manhã, a luz do sol entrava pela janela em forma de leque acima da porta e aquecia o assoalho de carvalho com um fulgor dourado. Flores frescas acrescentavam cores intensas aos verdes e azuis das cadeiras de encosto alto e dos conjuntos de sofás da sala. Apesar de toda a sua vastidão, a mansão dos Jaureguis passava a impressão de um lar.

Camila certamente não podia dizer o mesmo sobre o apartamento para o qual se mudara em Miami depois do divórcio. Apesar de estar mobiliado com o básico, faltava algumas qualidades características de um lar. Talvez isso se devesse ao fato de ela passar apenas alguns dias do mês em casa, se tanto. Por um momento, Camila brincou com a idéia de voltar para uma casa com uma atmosfera de beleza e uma certa elegância... e para uma mulher com as mesmas qualidades. Uma mulher como Lauren.

Ela sacudiu a cabeça negativamente. Já passara por uma situação como essa. Não estava disposta a enfrentá-la novamente. O som de passadas ecoando contra o chão de madeira limparam suas memórias desagradáveis, e Camila se ajeitou quando Lauren apareceu.

Seu primeiro pensamento foi o de que ela fizera coisas estúpidas em sua vida. Fazer com que a cliente trocasse a calça larga por uma calça jeans que marcava seu quadril e mostrava as curvas de seu traseiro com certeza foi uma das mais idiotas. Todos os homens que tivessem passado da puberdade virariam a cabeça quando ela passasse.

O segundo pensamento foi que ela trocara mais do que de roupas. Primeiramente, Camila não podia precisar exatamente o quê. Os cabelos longos dela caíam sobre os ombros na mesma onda espessa. Cílios negros emolduravam os olhos verdes. Sua boca parecia tão tentadora quanto quando ela abriu a porta para ela, momentos antes. Mas algo relativo à forma como ela estava disparou uma dúvida instintiva na cabeça de Camila.

Demorou alguns segundos para ela perceber que aquela mulher que o observava não era Lauren.

Deus! O dossiê indicava que ela e a irmã eram gêmeas, mas aquela breve anotação sequer começava a descrever a similaridade estarrecedora das duas. Se Camila não tivesse passado metade da noite memorizando os trejeitos e hábitos da sua cliente, provavelmente jamais saberia que aquela não era Lauren.

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