Capítulo 10

192 10 0
                                    

Depois de retirar todas as roupas, ela se acalmou o suficiente para notar como sua raiva era contraproducente. A parte estressante do trabalho sequer tinha começado e ela já se sentia tão contraída quanto uma mola de aço. Se quisesse superar as próximas semanas, teria que relevar a maneira abrupta de Camila, assim como fazia com as variações de humor de Dom e com as demandas exigentes de Toya.

Podia fazer isso. Era uma profissional. Assim como Camila. Ela só estava fazendo seu trabalho, da mesma forma que ela tinha que fazer o dela. Apenas tinha que recorrer à reserva de paciência que acumulara todos esses anos em frente às câmeras. Fingir que Camila não estava ali, como agia com relação à equipe que acompanhava as fotos.

Menos de quatro horas depois, Lauren concluíra que poderia morar no mesmo planeta que Camila e manter a paz interior necessária para seu trabalho.

Ela não conseguia compreender como uma mulher podia invadir seu espaço e sua consciência de forma tão intensa. Não que ela se colocasse à frente de tudo ou se intrometesse. Ao contrário. Quando ela a acompanhou ao restaurante do resort para o jantar, escolheu uma mesa só para ela, longe do barulho da equipe que a recebeu. Mas ela percebeu os olhares sobressaltados que Camila jogou e o sorriso amigável de Toya quando ela se uniu a Camila para tomar café. Lauren a observou durante todo o jantar e, agora, quando deveria estar concentrada no trabalho, sentia sua presença em todos os poros.

Camila se estatelou com sua beleza sem compromisso no sofá, com um dos pés apoiado na beira de uma mesinha, enquanto passava os olhos com uma velocidade estonteante em um livro. Olhando-a de esguelha, Lauren a analisou com a perspicácia aguçada de uma modelo com relação a linhas e formas. Ela  desabotoara a gola da camisa de algodão azul-escura e enrolara as mangas para revelar braços. O brilho de seus cabelos castanhos contrastava perfeitamente com os planos bronzeados de seu rosto e...

— Você está interessada nesta nova técnica de programação de produção ou não?

Lauren voltou a atenção para a mulher sentada na cadeira ao seu lado.

— Claro que estou.

Dom bateu no teclado do notebook que colocara na mesa entre eles. Em segundos, uma imagem colorida foi pintada na tela.

— Preste atenção — ele pediu, com irritação. — Eu ganho um bom dinheiro para ensinar isso no instituto, você sabe.

— Eu sei — disse Lauren, calmamente.

Ela também sabia que em seus momentos mais generosos, Dom reconheceria a contribuição de Lauren para sua carreira espetacular. As primeiras fotos que fez dela o ajudaram a entrar no mundo competitivo e restrito dos fotógrafos de moda. Os trabalhos que desempenharam mais tarde solidificaram a reputação internacional dele e o levaram a ser professor substituto do Rochester Institute of Technology, um centro de excelência para a arte e a ciência da fotografia desde 1880.

Com seu humor excêntrico, no entanto, Dom tendia a esquecer a longa associação dos dois, bem com seus modos e sua maturidade. Infelizmente, ele ficara irritado desde que Camila o atirara no chão de concreto mais cedo. Apesar dos maiores esforços de Lauren para tentar melhorar seu humor, ele permaneceu quieto e pouco comunicativo o dia todo. Quando apareceu na cabana dela depois do jantar para a rotineira avaliação da programação do dia seguinte, ela pensou que o entusiasmo pelo trabalho fosse ajudar a melhorar a situação. Mas não ajudou.

Momentos depois, ela estremeceu quando Dom bateu com a tampa do computador.

— Não consigo me concentrar — ele anunciou, pegando o notebook. — Vou até a cidade verificar os locais que vamos usar para o ensaio.

A caminho da porta, ele parou e fez um convite sem graça.

— Quer vir? Com a permissão do seu cão de guarda, é claro.

— Não, obrigada — ela respondeu rapidamente, muito acostumada ao sarcasmo de Dom para se deixar contagiar. Se quiser começar a fotografar às sete, terei que começar a maquiagem às seis, o que quer dizer...

— Eu sei, eu sei. Que você tem que acordar às cinco para correr. Então vá para a cama e durma, ou nem mesmo eu serei capaz de abrandar as linhas do seu rosto. Você não está ficando mais nova, você sabe — ele acrescentou, com um toque de malícia.

Rindo, Lauren caminhou até ele e beijou a metade careca de sua cabeça.

— Com sua câmera, seu computador e suas técnicas criativas, você pode disfarçar qualquer coisa. Você é um gênio, Dom. Um gênio ligeiramente detestável, mas adoro você.

O fotógrafo lançou um olhar arrebatador a Camila, então deliberadamente envolveu o pescoço dela com o braço.

— Bem, eu posso tolerar você. De vez em quando.

Lauren aceitou o beijo dele e fechou a porta quando ele saiu, passando a chave no novo cadeado. Ao se virar, encontrou o olhar de Camila fixo nela. O alívio que sentira com o supremo esforço do amigo para mostrar bom humor passara instantaneamente.

Por mais que tentasse, Lauren não conseguia entender por que aquela mulher a afetava tanto. Ela passara os últimos dez anos agüentando a avaliação minuciosa de homens e mulheres que dissecavam cada detalhe do seu rosto e de sua figura. Desde que chegara ao topo na profissão, aprendera a dobrar os curiosos, e às vezes ávidos, olhares dos fãs. Mesmo assim, desde o primeiro momento em que Camila a observara na festa, Lauren não foi capaz de abrandar as sensações que ela causara nela.

O que ela via quando a olhava com aqueles olhos Castanhos fuzilantes?, ela imaginava.

Simplesmente tudo o que todos viam, o lado prático de seu pensamento respondeu, de forma debochada. Um rosto. Dois braços. Um corpo que podia ser considerado ossudo e sem atrativos na Pré-História, apesar de um bom número de homens hoje parecer achá-lo sexy. Inclusive, ela lembrou, fora o fã que ligava tarde da noite que colocara Rafe em sua vida em primeiro lugar. Apesar de se esforçar para controlar isso, ela sentiu um pequeno arrepio nos braços.

—Frio?

A voz profunda dela arrepiou mais alguns pêlos. Agradecida pela desculpa dela, Lauren apertou os braços.

— Um pouco. Vou demorar alguns dias para me acostumar com as noites frias de Santa Fé.

— E à altitude. Você deveria repensar essa corrida logo de manhã.

— Eu repenso todas as manhãs — ela admitiu. — Primeiro quando o despertador pára de tocar, e depois, quando me arrasto para fora da cama.

Ela uniu as mãos por trás da cabeça.

— E ainda assim você corre todas as manhãs?

Com algum esforço, Lauren evitou que seu olhar percorresse a forma de tanque de lavar roupa da barriga dela. Por Deus, ela mal podia contar a quantidade de torsos que vira em toda a sua carreira. Só porque aquela mulher especificamente irradiava uma força contida, da qual ela tivera uma demonstração de manhã no hangar, não havia razão para perder a pulsação.

— Eu uso dieta e exercício para controlar meu peso, em vez de drogas — ela respondeu, demonstrando indiferença. — Vi muitas amigas destruírem suas carreiras e suas vidas ao substituírem comida por produtos químicos.

Ela olhou rapidamente para a porta.

— Você tem alguns amigos interessantes.

— Sim, tenho — ela respondeu, tranqüilamente. — E apesar de seus altos e baixos, Dom é um dos meus melhores amigos.

A modelos e a Guarda costas Onde histórias criam vida. Descubra agora