Capítulo 16

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Toya  corrigiu o caimento da saia de camurça e colocou o que parecia um buquê de alfinetes atrás da blusa de Lauren  para ajustar as dobras da gola. O cabeleireiro murmurou algo e atacou Lauren com uma escova em cada mão. Em segundos, o cabelo dela passou de uma cortina brilhante e macia de seda para algo que o homem chamara de livre. A diretora de maquiagem de macacão azul-claro rogou uma praga quando viu a intensidade de luz, e correu para bater com uma quantidade de pincéis na testa e no queixo da modelo.

Durante todo o tempo, Dom examinava por meio do visor de sua câmera e rosnava com os vários assistentes para que obscurecessem o estroboscópio da esquerda, aumentassem o refletor da direita e encontrassem as malditas macrolentes Zeiss! Finalmente, ele ordenou que todos saíssem do caminho, pois queria tirar algumas fotos antes de o sol mudar todo o quadro de referência.

— Levante mais a mão direita, Lauren — ele dirigia. — Mais alto. Vire a cabeça um pouco mais para a esquerda. Bom. Agora fique assim.

Colocando a câmera de lado, Dom apanhou a polaróide que estava a postos na mão de um dos assistentes. Em uma rápida sucessão, ele tirou meia dúzia de fotos. Instruindo Lauren a manter a posição, ele então se reuniu com o diretor de arte para rever as fotos instantâneas.
De acordo com a conversa que Camila ouviu no vôo, a Cosméticos Jauregui planejava fazer um ataque maciço em todas as revistas femininas, coordenado com inserções na TV. A campanha impressa mostraria os novos produtos de beleza em todo tipo de abordagem, da atlética à casual, da empresarial à formal. Santa Fé fora escolhida como local para o primeiro ensaio porque a cidade e seus arredores carregavam um ar de sofisticação, além de manterem uma atmosfera de estar perto da terra e do céu. Algo para todos, pensou Camila, examinando a pequena multidão de funcionários e hóspedes que observava os procedimentos.
Ao examinar a lista de hóspedes na tarde do dia anterior com o gerente, ela notou um ou dois nomes de pessoas conhecidas, o que não era surpreendente para um resort que custava mais por semana do que muitas pessoas ganhavam por mês. Seus contatos em Miami estavam averiguando as vidas de todos os hóspedes. Ela não acreditava que o fã obsessivo de Lauren pudesse arcar com as despesas de uma estadia prolongada no Rancho Tremayo, mas não queria correr qualquer risco.
Um grito colérico do Zebra chamou a atenção de Camila de volta para o ensaio. Com o rosto enrubescido, Avendez gesticulava com raiva para um assistente, um rapaz desengonçado usando uma camiseta laranja da Universidade do Texas e um boné com a aba para trás.

— Pegue o maldito fotômetro, vá até Lauren e me passe uma medição precisa dessa vez!

Aparentemente, as fotos de teste não estavam "naturais" o bastante para Avendez. Insatisfeito, o fotógrafo se curvou sobre o visor e mexeu na grande lente que se projetava de sua câmera. Filtros foram trocados. O cabeleireiro ajeitou o cabelo de Lauren mais uma vez.
Em todo o processo, ela não se moveu. As mãos continuavam plantadas na parede de argila e os olhos permaneciam plantados no topo da montanha Sangre de Cristo. Depois de seu ataque recente contra um músculo retesado, Camila só podia admirar o controle que ela tinha sobre o corpo.
Finalmente, Avendez estava pronto de novo.

— Certo, Lauren, faça sua expressão lunática. Mantenha a expressão limpa. Limpa, droga! Não temos o dia todo.
Apertando os olhos, Camila observou Lauren. De onde estava, ela não parecia ter movido um único músculo do rosto. Não apertou ou afrouxou os lábios, ou alterou o ângulo do queixo ou dos olhos. Na realidade, o rosto dela parecia estar dentro de um vazio.

— Assim está melhor. — Ele apertou o botão da câmera. Agora tente parecer sonhadora. Sim, sonhadora! — Clique. — Por Deus, você acordou ao amanhecer! Parece que ainda está dormindo! Melhor. Fique assim. Assim. — Clique, clique. — Agora acorde um pouco. Um pouco! Não arregale os olhos para mim. Simplesmente aja como se tivesse algo melhor para fazer hoje do que... Oh, diabos! Toya, tire aquele maldito franzido da gola dela! Lauren, mantenha a posição.
Enquanto Toya arrumava a dobra ofensiva, Lauren mantinha a pose. Segundos, e depois minutos, se arrastaram. Os músculos de Camila começaram a se contrair em solidariedade. Por quanto tempo mais ela teria que ficar com o queixo para cima e o pescoço para baixo?
Pelo visto, por horas, apesar de terem passado apenas dez ou quinze minutos. Então, ela e Dom começaram uma dança coreografada e de muito estilo que misturava movimentos excitantes, paradas absolutas e uma variedade de expressões que iam de suaves a brincalhonas a então verdadeiramente sensuais.

— Incline um pouco para a esquerda — instruía Dom. —Só um pouco. Bom. Agora mostre-me surpresa. Surpresa, não susto! Bom. Bom. Fique assim. Fique assim.

Enquanto Avendez gastava oito ou dez filmes com a Jauregui em várias poses contra a parede, um assistente corria para fazer folhas de contato de cada filme. Entre as tomadas, o fotógrafo e o diretor de arte examinavam os contatos com uma lente de aumento, circulavam as fotos que queriam e tiravam mais fotos. Demorou três horas para Avendez chegar ao look que desejava.
Então Lauren se moveu da parede para o alto portão e se apoiou na viga de cedro para o processo recomeçar.
A cada hora que passava, o sol aquecia o ar, até que o friozinho da manhã era apenas uma lembrança. No processo, o céu perdeu a claridade estonteante. Nuvens enormes e fofas se formaram enquanto o ar quente subia do nível do deserto para colidir com o ar mais frio no topo da montanha. Dom praguejou em cada mudança de lente e se irritou com toda a equipe, indiscriminadamente, até que todos, com exceção de Lauren, olhassem para ele e se entreolhassem de forma ameaçadora.

— Não sei como ela faz isso — murmurou Toya para Camila, depois de um episódio exasperante. — Todos os dias que trabalho com este homem eu juro que será o último. Lauren simplesmente ignora o gênio dele.

Ela ignorava várias coisas, notou Camila. Críticas infinitas. Direção constante. Os profissionais atentos e numerosos que voavam em torno dela como moscas em cada intervalo para corrigir a maquiagem ou o cabelo, ou medir a intensidade da luz.

— Abaixe o queixo, Lauren. — Dom fotografava, esquecendo-se de tudo, menos da composição em seu visor. Camila suspeitava que um míssil podia surgir pela poeira ao lado dele e ele sequer notaria.

— Mais um pouco para baixo. Mais. Agora olhe para a sua direita. Jesus, para a sua outra direita!

Em um movimento lânguido, Lauren inclinou a cabeça na direção de Camila. Ela piscou por um instante e caiu na cilada dos olhos dela.

— Vamos sorrir. Não, assim não! Assim você sorriu para sua tia solteirona de Hoboken. Eu quero o que está escondido. Aquele sorriso que todo homem quer levar para a cama com ele. Melhorou. Assim. Fique assim.

Camila ficou retesada quando Lauren emitiu para Dom o tipo de sorriso que um homem sonha obter de uma mulher que tocou e beijou e com quem rolou na sujeira. O tipo de sorriso que dizia que ela estava pronta para repetir aquilo, sempre que ela quisesse. Ela queria. Deus, como queria!

— Agora mais. Mais. Vamos, Laur. Sorria. Ah, sim, assim está bom. Mantenha assim. Assim.

A mão de Camila começou a suar.

— Um pouco mais para a direita. Fique assim.

Ela ficou sem ar.

— Desça o queixo um pouco mais. Mantenha. Mantenha... Droga, estou sem filme.

Por mais um instante, os olhos de Lauren mantinham Camila fixado, como espécies raras de inseto alfinetadas em uma placa de isopor. Nenhuma das duas se moveu. Camila não respirava. Não conseguia.
Então ela piscou e, vagarosamente, se ajeitou.
Só então Camila notou que a câimbra que a acometera mais cedo era suave, se comparada ao que sentia agora. Com um esforço concentrado, ela relaxou o corpo todo retesado. A ideia de aquela mulher exercer tal poder sobre ela com apenas um olhar e um sorriso mexia muito com ela.

A modelos e a Guarda costas Onde histórias criam vida. Descubra agora