Capítulo 15

181 10 0
                                    

Enquanto limpava os efeitos da corrida e do tombo na estrada suja, Lauren relembrava a cena do jardim inúmeras vezes.
Ela realmente lidara bem com o acontecido! Só se fosse para a sofisticação ostentada que a mídia adorava reproduzir em histórias sem-fim sobre príncipes e pretendentes de Wall Street pelos quais ela supostamente balançava. Por que diabos não fora perspicaz o bastante para preencher a lacuna deixada pela grosseria inadvertida de Stephanie?
Provavelmente porque sua perspicácia ainda estivesse vagando por uma estrada suja, tentando sacudir os efeitos do beijo de Camila.
Ela tinha razão, Lauren disse a si mesma enquanto passava xampu nos cabelos. Aquele beijo fora uma estupidez. Uma estupidez enorme. Ela sabia disso mesmo antes de abaixar a cabeça e sentir o gosto salgado da boca dela. Apesar de Rocky ter recomendado um caso fugaz e intenso, Lauren não precisava de alguém em sua vida agora. Não quando tinha que concentrar todas as energias no ensaio. E especialmente não com uma mulher que deixou claro que não queria complicações em sua vida.
Desejando enxaguar a imagem de Camila tão facilmente quanto o xampu, Lauren colocou a cabeça sob o chuveiro. Momentos depois, ela se enrolou em uma das imensas toalhas do resort e caminhou descalça até o quarto. Imediatamente, o pequeno grupo que estava esperando por ela entrou em ação.
Enquanto Toya  procurava em sua bolsa os acessórios que Lauren usaria em seqüência, os maquiadores espalhavam suas ferramentas em uma mesa perto da janela, onde podiam tirar proveito da luz natural. Lauren sentou-se imóvel enquanto um cabeleireiro secava o cabelo dela e o prendia no topo da cabeça. Balançando a cabeça diante do efeito, ele deixou a pesada massa cair e começou a trabalhar com babyliss. Ainda insatisfeito com o resultado, ele atacou os cabelos dela com uma escova com cerdas de javali e desfez a maioria dos cachos.
Quando o cabeleireiro temperamental terminou, Stephanie e sua assistente entraram em ação. Lauren normalmente fazia a própria maquiagem, mas esta campanha era muito importante para confiar apenas nas próprias mãos. Com as sobrancelhas erguidas em concentração, Stephanie aplicou uma base opaca clara. Ela sabia tanto quanto Lauren que uma base pesada atraía o olho da câmera para as linhas do rosto. O verdadeiro segredo da beleza estava em sombrear e realçar. Ela manejava seus pincéis com a habilidade de uma artista. Quando terminou, Lauren analisou os resultados no espelho.
— Parece bom, Stephanie. Muito bom.
— Espero que sim — disse a moça mais velha, sorridente. Como todos na Cosméticos Jauregui, ela sabia o quanto dependia dessa nova linha de produtos.
Enquanto Stephanie colocava seus pincéis e seus kits de maquiagem dentro da bolsa, Lauren olhou seu rosto sob diversos ângulos, fazendo uma nova verificação. A linha homogênea de seu queixo atraiu seu olhar, e ela parou. Inconscientemente, levou uma das mãos à garganta.
Sua feição ficou embaçada no espelho e por um momento ela não via a si mesma, mas o rosto de Camila Seus olhos castanhos e brilhantes. As bochechas bronzeadas e rígidas ao amanhecer. Sua boca firme. A pele enrugada em um dos lados de sua bochecha e de seu pescoço.
Lauren pressionou os dedos contra sua garganta. Que irônico! Algumas pessoas diziam que ela tinha as feições perfeitas. Ela acreditava que muitas achariam as de Camila defeituosas. Mas ela suspeitava que as duas fossem muito parecidas por dentro. As duas queriam que as pessoas vissem além da casca para enxergá-las por dentro.
O rosto de Toya de repente apareceu no espelho, tirando Lauren de sua contemplação silenciosa.
— Está pronta para mim? — perguntou a produtora, impacientemente. — Se não quisermos ver Dom pulando nas tamancas o dia todo, é melhor você se vestir e se posicionar.
— Estou pronta.
Colocando de lado a toalha na qual estava enrolada, Lauren entrou em uma saia longa de camurça cinza que Toya deu a ela. Curvando-se, ela abaixou a cabeça para que a produtora pudesse manobrar uma blusa branca com uma gola de xale rendado sobre seus cabelos. Enquanto Lauren puxava a blusa até a cintura, Toya se enterrou em suas sacolas onipresentes.
— Aha! Aqui está.
Metal bateu em metal enquanto ela pegava um cinto de concho prateado. Estupefata pelo trabalho intrincado dos elos prateados e brilhantes, Lauren pegou o cinto.
— Que lindo! Você roubou ou se arruinou para comprar um de seus acessórios visando uma troca?
— Eu vi na loja de suvenires ontem à noite e... pedi emprestado. Não se preocupe! Pedi permissão ao zelador.
— Vamos rezar para que ele tenha se lembrado de falar com o dono da loja — retrucou Lauren.
Toya tinha uma merecida reputação em Nova York de ser capaz de procurar qualquer item para um ensaio fotográfico, de chifres de bezerros a condutores de supercomputadores em miniatura. Logo que começaram a parceria, Dom parou de se meter nos métodos que ela usava para conseguir as coisas. Desde que a polícia não aparecesse no estúdio e interrompesse um ensaio, ele proclamou, não se importava com os locais em que ela adquiria os itens da produção. Lauren tinha suas próprias idéias sobre os insultos ácidos que a produtora e o fotógrafo trocavam regularmente. Do lado de toya, pelo menos, ela suspeitava que eles fossem mais do que simplesmente o toma-lá-dá-cá profissional.
Toya colocou o cinto na cintura de Lauren e o afivelou, afastando-se para admirar seu trabalho.
— Perfeito! Tive que remover três argolas para deixá-lo do seu tamanho, mas posso repô-las depois. Tome, calce as botas. Vamos sair logo daqui antes que Dom tenha um enfarte.
Camila tomou uma chuveirada rápida e trocou de roupa depois do café da manhã. Prendendo sua arma ao lado do joelho direito, calçou botas de cano baixo, calça jeans e uma camisa branca. Ela enrolou as mangas para facilitar os movimentos e encolheu os ombros dentro de seu colete de pele de ovelha para proteger-se contra o frio da manhã. Momentos depois, saiu para encontrar Lauren.
Apoiando uma bota em um dos imensos vasos de ferro com gerânios colocados sob os arcos dos corredores que ligavam as cabanas, ela apoiou o cotovelo no joelho e observou a agitação que ocorria no fim do jardim. Daquela distância, não podia identificar todos os membros da equipe. Camila supunha que o rapaz magro de expressão preocupada fosse o diretor de arte da agência de publicidade. Ou talvez o diretor de moda. Ela não tinha compreendido totalmente as diferenças entre as duas funções.
Manter todos em ordem devia demandar certo esforço. O lado técnico da equipe incluía, entre outros, um casal de artistas, Avendez e seu enxame de assistentes e dois especialistas em digitalização de imagens fotográficas do Center for Creative Imaging de Camden, Maine, que atuavam como consultores especiais. Do pouco que Camila conseguira compilar sobre o centro, ele era único no mundo. Aparentemente, combinava uma gama de novas tecnologias em digitalização, gravação de filme e câmeras eletrônicas de alta resolução com imagens de computador de última geração.
Apesar de Camila ter obtido uma lista de toda a equipe antes de sair de Minneapolis, ainda esperava os resultados das investigações que mandara fazer sobre a vida de cada um. Todos aqueles personagens podiam ser o fã secreto de Lauren, pensava Camila. Um deles pode ter se fixado nela ou ter alguma razão específica para importuná-la. Qualquer um podia ter inventado uma desculpa para ser parte da equipe. Não excluía ninguém, nem mesmo Avendez.
Especificamente, nem Avendez.
Quando ouviu a porta da cabana de Lauren se abrir, Camila se levantou. Um pequeno rebanho de profissionais se espalhou, carregando as respectivas ferramentas. Toya lançou um sorriso a ela enquanto passava correndo, e então sua cliente saiu da cabana para aquele nascer de sol que aquecia lentamente.
Qualquer pessoa que não fosse cega teria ficado boquiaberta. E Camila tinha visão total.
Aquela era a Lauren Jauregui que o mundo normalmente via. Glamourosa. Confiante. Os cabelos eram uma capa macia e brilhante . Seus olhos eram luminosos.
Mentalmente, ela comparou aquela beleza perfeita, estonteante, com a mulher que vira ensopada pela água do lago ou suja de poeira de estrada. Ela levou menos de um segundo para decidir qual versão de Lauren Jauregui preferia. A que rolara na poeira com ela ganhou de lavada. Ela demorou consideravelmente para afastar a imagem da pele coberta por pêlos  de Allie e de seu rosto enrubescido, emoldurado por um céu totalmente azul.
— Ainda está no horário? — ela perguntou, caminhando ao lado dela.
— Estou em cima da hora, acho que ainda não saí do programado. Parece que Dom ainda não acabou de organizar tudo.
Sob a perspectiva de Camila, Avendez estava longe de estar pronto. O fotógrafo estava no meio de uma multidão de técnicos, acenando e gritando com eles para que colocassem os malditos estroboscópios no alto e os geradores funcionando, agora! Vestindo calça preta e blusa branca e com sua meia-cabeça de cabelos pendentes, ele lembrava a Camila uma zebra mal-humorada.
Pisando nos cabos do gerador que rastejavam como espaguetes pretos espessos, Lauren se uniu ao grupo que estava perto da parede. Camila tomou seu lugar a alguns metros e observou Avendez colocar ordem naquele caos.
— Tudo bem, pessoal. Tudo bem! Ouçam, droga! Quero fazer a primeira seqüência rápido. Faremos uma fotos sóbrias com efeito natural, usando o céu com cenário.
Camila ergueu uma das sobrancelhas, impressionado com a quantidade de equipamento para se chegar ao efeito supostamente "natural". Além de luzes estroboscópicas montadas em um andaime portátil, uma enorme quantidade de refletores enormes se empoleirava em suportes como mosquitos gigantes com as asas recolhidas. O assistente principal de Dom estava curvado sobre um imenso baú contendo bandejas que guardavam uma quantidade estarrecedora de lentes e filtros e Deus sabe o que mais. Eles tinham até mesmo uma câmara escura portátil, ao menos era o que Camila pensava sobre o trailer anexo à cabana de Avendez. Se alguma coisa ficou no estúdio daquele homem em Nova York, foi apenas o banheiro.
Unindo a metade cabeluda de sua cabeça com um elástico para cabelos, presumivelmente para mantê-los fora do alcance das câmeras, o Zebra levantou o queixo na direção de Lauren.

— Vamos começar o show.

Começamos com as fotos de teste de sempre. Fique apoiada na parede, com o queixo para cima.
Lauren caminhou até o muro baixo que rodeava a hacienda. Apoiando os quadris na argila do muro, colocou as duas mãos para trás e levantou o rosto na direção dos picos das montanhas distantes.

A modelos e a Guarda costas Onde histórias criam vida. Descubra agora