Respirei fundo, ciente que minhas mãos tremiam até demais enquanto eu caminhava pelo corredor hospitalar, talvez atraindo olhares por conta dos hematomas roxeados espalhados por meu rosto que não me oferecia uma aparência nem um pouco agradável, não que eu me importasse com isso, pelo menos não agora. Havia se passado cinco dias, cinco dias e ninguém mais parecia viver, principalmente Satoru e Wakasa. Mais uma vez, respirei, antes de deslizar para o lado daquele que era meu melhor amigo, mesmo após todas as recentes confusões.
Ficamos ali, parados e silenciosos com nossos olhares presos em uma porta, pois a pessoa mais importante para nós dois se encontra presa a uma cama, ligada a aparelhos enquanto sua consciência vaga por algum lugar, já que Azumi estava em coma por conta da perda de sangue após ser atacada por Sawako e ninguém parecia lidar muito bem com isso. Nem mesmo eu...
Pisquei os olhos, meus dedos roçando a pulseira em minhas mãos, assistindo o pingente de açor balançar levemente e sabendo que meu coração estava despedaçado em mil pedaços com a certeza de que tudo aquilo era culpa minha por ter sido estúpida, imbecil que conseguia arrastar todo mundo para suas merdas. Era culpa minha pela gangue ter acabado nas mãos de Sawako, era culpa minha que Shinichiro estivesse não só com um braço quebrado mas como o corpo coberto de hematomas que o faziam grunhir de dor a cada movimento realizado, era culpa minha que Wakasa agora parece uma carcaça, a sombra do que já foi, era culpa minha que Zuzu estivesse em um coma.
Era tudo culpa minha... Talvez se eu fosse uma pessoa normal, sem traumas ou algo do tipo, a vida de todo mundo estivesse infinitamente melhor.
Respirei, tentando afastar aquele tipo de pensamento por saber que Zuzu me socaria caso soubesse deles. Respirei, e então, chorei, pois ela não estava ali para ralhar comigo por tá pensando naquelas merda. E não demorou muito para que eu estivesse nos braços de Satoru, sendo consolada por ele, porque nosso demônio talvez nunca acordasse e isso era completamente nossa culpa.
─ Não precisa ficar me tratando como um bebê.─ Ri, já que com aquele biquinho emburrado e sobrancelhas franzidas, Shinichiro parecia o tal bebê que tanto falava que não era.─ Se não consegue comer sozinho, vou continuar com isso, bebê.─ Zombei, erguendo a colher mais uma vez e a guiando para sua boca, vendo-o engolir toda a sopa, continuando com aquela expressão que me lembrava muito Mikey e até mesmo Emma. Pensar nos dois loiros me fez sorrir. Os dois me acompanharam até o hospital para entregar flores pra Azumi que continuava em coma. Um mês se foi e Satoru não aguentava mais, vê-lo desabar se tornou tão comum ultimamente que a dor parou, apesar de continuar ali, sempre me lembrando que todos os acontecimentos foram causados por minha culpa.
─ É isso que vamos ver, só mais uma semana e vai parar com essa história de babá.─ Resmungou, virando o rosto para o lado. Suspirei, abaixando o prato e o depositando na mesa em nossa frente. E era isso mesmo, ele ficaria livre do gesso em seu braço na próxima semana...
Ele franziu o cenho mais uma vez, dessa vez preocupado. Nos últimos dias, desde que parei de visitar Azumi, todos começaram a me tratar como uma coisinha frágil, alguém que deveriam tomar cuidado redobrado e... Eu não entendia o motivo, quer dizer, minha amiga estava em coma e por conta das porradas que recebi, às vezes mal conseguia respirar de tanta dor nas minhas costelas.
─ Vamos nos casar.─ Pisquei meus olhos, mas o que...
─ O quê?─ Exclamei.
─ Você é a mulher da minha vida, tem algo contra isso?
─ Ahm, não?─ Soltei em um tom duvidoso. Shinichiro espreitou os olhos, parecendo desconfiado e me fez encolher os ombros. Quando é que mudamos os papéis e agora ele é quem solta maluquices?─ Só que... Não somos jovens demais pra casar?
Ele ficou em silêncio, pensando em minhas palavras quando sorriu tanto que seus olhos se tornaram duas fendas.
─ Não, não somos.
E eu me calei, sorrindo de bochechas coradas por ter entendido suas palavras.
Shinichiro Sano me ama...
Dois meses se passaram, 1460 horas e... Simplesmente Azumi continuava dormindo. E uma semana que eu não a visitava, parte por conta de não conseguir suportar mais o sentimento de culpa que se espalhava aos poucos, começando a dominar meus pesadelos por completo, e parte por Shinichiro e eu estávamos ocupados em juntar dinheiro para comprar um prédio que é dividido entre uma oficina abandonada e um pequeno apartamento que possuía apenas um quarto, uma cozinha e uma sala.
Pequeno, mas confortável, tudo que precisamos depois de tudo...
Sentada no piso do apartamento que aluguei junto de Shinichiro, bem acima de uma velha oficina que daríamos uma forma de reformar e abrir nossa própria loja de motos, com meus cabelos agora pintados de um castanho-escuro, um cigarro se encontrava entre os meus dedos, aos poucos sendo consumidos pelo fogo. Suspirei, levando-o até meus lábios mais uma vez e lançando um olhar para a janela, me dando conta que já anoitecia e nada de Shinichiro.
Estalei a língua, começando a ficar preocupada com sua demora. Era apenas ir buscar algum lanche para que a gente comesse. Pisquei os olhos, me levantando e olhando ao meu redor com o cenho franzido. Não hesitei em caminhar até a porta do nosso futuro quarto que já possuía uma cama com colchão e me jogar nela, me encolhendo no calor do acolchoado.
Quase uma hora depois, ouvi o som familiar da porta se abrindo e continuei em posição fetal, conforme passos andaram pelo apartamento, logo orbes tão escuras quanto a noite me fitaram e o sorriso aliviado em seus lábios fizeram com que eu me sentasse no colchão e as palavras do meu namorado causaram meu choro pelas próximas horas que se seguiram.
Chorei pelo alívio, pela felicidade, pela minha libertação da culpa e, principalmente, por saber que ela estava bem, respirando e acordada. Azumi estava bem...
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Black Goshawk • Tokyo Revengers
FanfictionCom olhos vermelhos ferozes, penas cinzentas escuras e garras enormes, o açor é a maior ave rapina florestal e um dos animais mais ferozes que existe, representando um grande perigo a tudo que o rodeia. E é um açor que está estampado em todas as jaq...