CAPÍTULO 31

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Ele está morto.

Eu o matei.

Meus olhos não se desviaram dos de Adrian e do seu corpo no chão a minha frente. O sangue dele está escorrendo pela superfície até a minha direção, enquanto estou apertando meus dedos sujos ao redor da navalha.

— Em?

Eu precisava fazer isso, eu tive que fazer isso ou ele não iria parar.

Depois de me tocar, Adrian e Thomas não iriam deixar barato para Erick. Adrian era o meu dono e iria me levar com ele para algum lugar que eu não faço ideia para um tipo de trabalho que eu teria que me submeter a ele durante o resto da minha vida.

— Em?

E se Thomas entrar agora e ver essa cena? Vou ter que matá-lo também e conviver com a imagem do seu cadáver toda noite antes de dormir?

— Em!

Viro meu rosto em direção à voz e minha consciência retorna para o assunto de mais importância nesse momento.

— Erick. — sussurro.

Transfiro as forças que me restam para as minhas pernas e me levanto, cambaleando por um momento quando minha visão escurece e as imagens a minha frente se distorcem. Corro até ele e começo a cortar as amarras que o estão prendendo, suspirando de alívio quando ele se levanta em um pulo assim que o liberto.

A primeira coisa que ele faz é andar até o corpo no chão. Erick vasculha os bolsos das roupas de Adrian e guarda o celular que rouba dele, para depois pegar a arma que está ao lado de Adrian e em seguida, as minhas roupas.

Só então a ficha realmente cai e percebo que estou quase nua e que Erick vasculha meu corpo rapidamente quando para na minha frente. Sua respiração está ofegante e ele parece muito cansado.

— Por favor, solte isso. — pede ele, parecendo odiar tanto quanto eu a lâmina nas minhas mãos.

Quando deixo a lâmina cair, Erick rapidamente limpa a minha mão com a camisa que joguei de lado. Ele esfrega o meio dos meus dedos com força, franzindo os lábios e parecendo irritado. Em seguida, quando percebe que não vai mais conseguir tirar o sangue, ele me ajuda a colocar o casaco, abotoando a frente para que meu busto não fique a mostra. Depois entende a calça na minha direção e se vira, ficando de costas enquanto me visto.

— Você está bem? — pergunta, enquanto termino de amarrar os meus cadarços. — Ele te machucou?

— Estou bem. — respondo, esfregando a palma da minha mão suja na calça e engolindo o choro preso na minha garganta.

— Vamos sair daqui. — ele se vira e pega a minha mão, mesmo sendo a que usei para ferir Adrian.

Meus olhos se desviam para a arma que está segurando e aperto de volta seus dedos, tentando me segurar em algo.

— Não podemos sair pela porta da frente, Thomas está nos esperando. — falo, e Erick se vira para me encarar.

— Eu sei.

Ele começa a me puxar até o fundo do armazém e apenas quando começamos a nos aproximar é que vejo uma abertura grande pela madeira velha e desgastada. Erick me indica para que eu vá primeiro e me agacho, quase me arrastando, para sair do outro lado.

Quando me levanto, começo a olhar ao redor em busca de algum caminho que podemos pegar para sair daqui. E o mais importante de tudo, um caminho para longe de Thomas.

— O que nós vamos fazer? — questiono a Erick, quando ele finalmente consegue passar pelas tábuas velhas e ficar de pé ao meu lado.

— Não temos outra escolha, linda. — fala, olhando ao redor rapidamente e pegando a minha mão. — Nossa única opção agora é correr.

Nós dois encaramos a grama alta ao nosso redor e o pequeno rochedo que está se erguendo a nossa frente e que nos impossibilita de avançar. O caminho a nossa direita chamaria mais a atenção de Thomas e o da esquerda é o mais arriscado, já que a grama parece se tornar cada vez mais alta.

Para a minha infelicidade, Erick me puxa pelo caminho da esquerda.

Nós começamos a correr, sem tempo para esperar que Thomas sinta a nossa falta e que venha atrás de nós. Mesmo que a grama esteja pinicando o meu rosto conforme nós abrimos caminho, tento me manter firme e forte enquanto aperto a mão de Erick.

Depois de alguns minutos, em que já estou arfando pelo cansaço e sentindo o ar começar a faltar, a grama já está desaparecendo e as árvores estão surgindo. As copas são altas e cheia de folhas grandes e largas que quase nos impedem de ver a lua e as estrelas acima de nós.

A única coisa que não me impede de me perder ou desistir é a visão de Erick a minha frente, me puxando com ele sem hesitar enquanto nossos passos fazem ainda mais barulho do que os próprios insetos ao nosso redor.

Posso quase sorrir ao perceber que o consegui liberar da armadilha de Thomas e que me encontro junto dele. Essa última parte com certeza não estava nos meus planos, pois tudo que eu conseguia pensar era que Thomas iria se livrar de mim de algum jeito.

E eu estava certa.

Adrian era o comprador, o meu "dono" segundo Thomas, e me enoja ao pensar que ele não foi o primeiro a comprar garotas e de que eu não seria a última a entrar para uma vida assim.

— Vamos parar um pouco. — anuncia Erick, se apoiando em uma árvore e respirando com dificuldade.

Fico ao lado dele, adorando a ideia, e me sento por um momento, tentando recuperar o fôlego. Quando ergo meu olhar e observo o caminho que fizemos até agora, imagino o quão longe já chegamos e se Thomas já sentiu a nossa falta.

Erick se senta ao meu lado, me observando, e faço o mesmo. Seu rosto está ainda mais machucado por causa da grama alta em que tivemos que nos aventurar e sua testa está coberta de suor. Seus lábios estão entreabertos, puxando o ar com força, e ele pisca os olhos algumas vezes, parecendo espantar algo.

— Por que você veio? — questiona, apoiando o braço que está segurando a arma no joelho.

— Não podia deixar Thomas machucar você. — respondo, encolhendo minhas pernas contra o meu peito ao prever a bronca em que vai me dar.

— Ver eles te machucarem é ainda pior. — rebate, parecendo com raiva. Ele morde os lábios que estão machucados e fecha os olhos. — Sabe o que senti ao ver Adrian tocar em você? Sabe o que senti ao ver que eu não podia fazer nada pra te salvar?

— Eu estou bem agora. — falo, enquanto meus olhos ardem pelas lembranças.

— Mas podia não estar! — ele passa a mão pelo cabelo.

— Preferia que eu te deixasse lá? — enxugo meus olhos rapidamente, sem querer chorar agora.

— Eu que devia ter matado aquele desgraçado. — resmunga, desviando o olhar.

— Mas fui eu que fiz isso! — rebato, surpreendo a nós dois pelo tom em minha voz.

— Era por isso que eu não queria que você viesse, porque eu sabia que algo assim iria acontecer!

— Eu não me arrependo do que fiz. — sussurro, mas meu corpo me trai e em questão de segundos estou tremendo e soluçando em pânico.

Erick larga a arma ao seu lado e me puxa para os seus braços, me envolvendo com força contra o seu peito enquanto agarro a camisa dele em busca de apoio. Posso ouvir seu coração bater acelerado e seus dedos trêmulos pentearem meu cabelo em uma tentativa de me acalmar.

— Você não tinha escolha. — murmura, enquanto segura meu corpo frágil em seus braços.

Concordo com a cabeça, me afundando ainda mais contra ele e respirando seu perfume em uma tentativa de me recompor. Mesmo assim, a cada segundo minha mente volta para a cena da morte de Adrian. Os olhos que me perseguiram até mesmo na sua morte, quando esticou a mão ao tentar me alcançar e o corte profundo na sua garganta que não parava de jorrar sangue.

Esses pensamento e lembranças não vão fazer com que eu continue em frente ou que eu dê o suporte o suficiente para Erick ao ponto de que eu não seja apenas uma casca vazia durante a nossa tentativa de fuga.

Começo a respirar fundo e controlar as batidas frenéticas do meu coração, que parecem querer atravessar o meu peito, e ocupo a minha mente em como posso ajudar Erick e a mim mesma para sairmos dessa, vivos. Leva mais tempo do que eu gostaria, mas alguns minutos depois me afasto dele e o encaro, levando minha mão limpa até o seu rosto.

— O que eles fizeram com você, lindo? — pergunto, arrancando um sorriso dos seus lábios.

Ele cobre a minha mão que está em sua bochecha com a sua e beija a minha palma.

— Nada que eu nunca tenha passado antes. — responde, mesmo que o veja tremer por um instante pela dor do hematoma em sua bochecha.

— O que nós fazemos agora? — pergunto, descansando minha cabeça em seu ombro.

— Vou tentar ligar pra polícia.

O vejo tirar o celular que pegou de Adrian do bolso e desligar a tela para fazer a chamada de emergência. Erick me espia nervoso algumas vezes enquanto esperamos a ligação ser atendida.

— Aqui é Erick Prior, código 0802, preciso de ajuda imediatamente. — fala, enquanto tento entender o porquê do código. — Alguém está tentando matar a minha namorada e eu não faço ideia de onde estamos agora. Conseguimos escapar deles por enquanto, mas acho que vão nos seguir. — ele olha para mim, enquanto ouve o policial do outro lado. — Enquanto vocês fazem isso, preciso que me transfiram para Michael Lawrence, ele é meu contato de emergência. — Erick pega minha mão e a acaricia, enquanto parece esperar por algo. — Michael, graças a Deus. — ele fecha os olhos e respira aliviado, e posso ver sua postura mudar. — Preciso de ajuda. Thomas está atrás de Emily e eu e estamos perdidos em algum lugar que não conhecemos... Jessy me entregou a ele e Thomas me usou para conseguir chegar até Emily... Venha o mais rápido que conseguir... Antes de desligar, preciso que me fale onde nós estamos e se há algum lugar pra nos abrigarmos até você chegar... Ok.

— Então? — questiono, quando Erick guarda o celular de volta no bolso da calça.

— Pelo o que eles conseguiram nos rastrear, vai levar cerca de uma hora até chegarem até nós.

— Uma hora? — repito, desanimando com a notícia.

— Pra nossa sorte, nós temos um lugar pra nos escondermos.

— Onde?

— Michael me disse que a alguns quilômetros a nossa esquerda tem uma pequena fazenda.

Uma fazenda?

Arregalo meus olhos quando me recordo da pequena casinha em que avistei enquanto era trazida para emboscada de Thomas.

— Eu vi esse lugar enquanto estava vindo. — falo, e Erick parece se animar ao perceber que nós realmente temos uma chance.

— É melhor começarmos a caminhar. — ele se levanta, pegando a arma e estendendo a outra mão para me ajudar.

Eu o envolvo com meus dedos e tento parecer confiante, enquanto começamos a caminhar através do matagal ao nosso redor com a ajuda da pouca luz que a lua nos proporciona.

— Mesmo que a gente chegue até lá, acha que as pessoas que vivem na fazenda vão nos ajudar? — pergunto, depois de alguns minutos que estamos em silêncio.

— Vamos torcer que sim. — fala, enquanto afasta uma folha do seu caminho. — Só vamos precisar de cerca de uma hora debaixo de um teto e um lugar seguro até Michael nos encontrar.

— Eu sei. — suspiro. — É que não sei se eu abrigaria um casal desconhecido que acabou de surgir do nada e que parecem ter saído de uma briga.

O vejo sorrir por um momento e acabo fazendo o mesmo, percebendo que eu estava com medo de nunca mais ver esse sorriso desde que atendi a ligação de Thomas no banheiro.

— Eu também não abrigaria, mas vamos torcer pra que sejam mais gentis do que nós.

Ele aperta a minha mão, tentando transparecer confiante, e me aconchego para mais perto dele. Sorrio em sua direção e ele retribui, enquanto começamos a caminhar novamente pelo desconhecido.

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