Capítulo 16 - Contagem Regressiva (parte 4)

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Três dias...


"Não aguento mais..."

"Não aguento..."

"Não..."

"Preciso sair daqui. PRECISO SAIR DAQUI"

-ME TIRE DAQUI! - gritou Becca Myers, em desespero, de dentro do porão, desatando a chorar. Um choro de raiva, de frustração. Um choro de ódio.

Rebecca Myers. Uma garota que trabalhava numa lanchonete. Tinha uma melhor amiga.

Alguém que já fora, um dia, um ser humano. Naquele momento, no entanto, era algo além. Além do humano. Além do natural. Simplesmente além. Simplesmente demais para se entender. 

Consumida por si mesma, estava Rebecca Myers ali em sua maior agonia e sofrimento. Cercada de cadáveres de ratos e de aranhas esmagadas, com os dedos manchados de sangue seco e as unhas carcomidas.

Ela mesma se via diferente. Não estava, de fato, fisicamente diferente. Mas para ela, estava. Porque ela mesma era capaz de ver o que estava consumindo seu corpo, seu ser. Quando olhava para suas próprias mãos, enxergava garras. Garras negras, manchadas, afiadas e gastas. Armas mortíferas. Ela quase podia sentir presas protuberantes brotando de seus lábios, que se curvavam num rosnado puramente animal.

-NÃO! - gritou, e voltou a si. Não havia mais garras, nem presas. Apenas um ser humano, na miséria de suas próprias emoções, torturado, mal tratado, esquecido...

A porta do porão se abriu. A luz do lado de fora queimou seus olhos. 

Com dificuldade ela conseguiu ver uma silhueta descendo as escadas. Logo percebeu que era Alexander Cruz. Vestido como um executivo que acabara de chegar em casa, camisa social por dentro da calça social. Ele estava descalço, e parecia não se importar com os ratos mortos e o cheiro podre. 

-Alex... - balbuciou Rebecca.

-Vou tirar você daqui. Esse lugar tá imundo, não é? 

-Sim... - conseguiu dizer, fraca. Derrotada. Humana.

-Mas você precisa entender que o que eu fiz foi necessário. Eu tive que fazer aquilo. Você entende, não é?

-Ent...end... - ela mal conseguia formular a palavra.

-Bom, bom, não precisa se esforçar, ok? Vou te levar lá pra cima. Mas quero que me prometa que não vai fugir e que não vai gritar. Esse é o nosso pequeno combinado, certo?

-Hmhm... - ela assentiu, já caída nos braços de Alexander, que não tinha dificuldade alguma em segurá-la.

Ele a pegou no colo. Ela deitou a cabeça em seu peito, e se deixou levar pelo cansaço, enquanto Alex a carregava pela escada. 

***

Ela acordou com um grito no meio da madrugada. O grito havia ecoado por seus ouvidos e a despertado, a deixando em estado de alerta, adrenalina e terror. Seus olhos se acostumaram com a meia luz da lua que invadia o quarto, ela se situou. Estava de volta no quarto de Alexander Cruz. Estremeceu e se levantou por mero instinto, indo até a porta, que já estava entreaberta. Ela empurrou, e as dobradiças responderam com um berro agonizante. Rebecca começou a suar, seu coração começou a pulsar mais rápido.

O corredor escuro se dirigia às escadas para o andar de baixo, de onde uma fraca luz avermelhada vinha. As paredes cinzentas misturadas com a luz fraca da lua e a luz vermelha do andar de baixo só tornava tudo mais macabro e sombrio. Ela queria voltar e dormir, queria chamar por Alex ou Violet, mas não conseguia, como se não obedecesse a ela mesma. Tudo o que seu corpo fazia era andar para frente. Seu rosto mantinha uma expressão aterrorizada e tensa. A cada passo que dava, Rebecca sentia seus músculos gritarem, explodirem, resistindo rígidos ao movimento. Seu corpo não queria. Rebecca não queria... Mas algo, ou pior, alguém queria que ela continuasse a andar. As batidas do seu coração se tornaram mais intensas.

Mente Insana, Corpo InsanoOnde histórias criam vida. Descubra agora