.:49:. Madame, lobisomem e 100-Corpo

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.:49:. Madame e 100-Corpo

Doutor Zé Graça — Madame falou ao jogar a cabeça do androide contra o tampo da bancada —, agora somos você e eu, eu e você, viado! — Olhou para o lobisomem. — E o cachorrão aqui.

— O que você pretende fazer para acessar meus dados? — a cabeça perguntou calmamente.

— Tá com medo, é? — Madame puxou um laptop e um cabo de uma gaveta e os pôs sobre a bancada, ao lado da cabeça.

— Não, apenas curioso. Não consigo imaginar como você poderia acessar o meu...

— Cachorrão, tira a pele pra mim — Madame ordenou enquanto ligava o laptop.

A minha pele?!

— Não, porra. A do androide.

— Ah...

Lobisomem e cabeça encararam-se mutuamente e, sem qualquer emoção de ambas as partes, a tarefa foi executada. A pele sintética saiu com um puxão, deixando para trás apenas um crânio metálico com olhos ainda nas órbitas. Antes mesmo de tocar o piso, os restos de tecido perderam suas cores marrom e rosinha para um cinza médio.

Madame então espetou o cabo no laptop e na nuca do androide, abriu um prompt de comando, digitou alguns códigos e executou a ação. A cabeça começou a abrir e fechar a boca, a girar os olhos nas órbitas e os ossos de material mimético cresceram e encolheram, alterando as feições...

— O que tá acontecendo? — O lobo deu um passo para trás.

— Um teste em busca de algoritmos não-nativos — explicou a mulher.

— Como assim?

— O 100-Corpo instalou alguma caralha de controle semi autônomo no Breno. Tu não sabe o que é esse bagulho, né? — Madame encarou seu "estagiário". — Tá, então, um controle semi autônomo faz com que as máquina hackeada continuem no rolê sem a necessidade de comandos diretos do "Zé Graça", 'sacolé? É mó útil quando teus robôs tem chance de perder sinal. E é por isso que esse corno — Madame apontou para o crânio — continua falando mesmo com a gente sem Rede. Tem uma caralha de um programa aí dentro que tá controlando o sistema operacional do Breno. Daí eu tô usando um progaminha maroto que eu mesma escrevi justamente pra achar 'sas tretas.

O lobisomem pareceu surpreso:

— 'Cê... A senhora saca de programação?

— Viado! Sabe de nada! Eu tive que aprender umas linguagem aqui e ali depois uma cagada que rolou comigo. A preta aqui sabe codar, filho! Vez ou outra eu rodo esse meu pente fino pra catar bagulho infiltrado e... opa! — A tela do prompt, inundada de letras verdes, parou de repente com a mensagem:

>>!PAU NO CÚ ENCONTRADO!<<

CUTUCAR CUZINHO DO CORNO?

SIM/NÃO:

FODER CUZINHO DO CORNO?

SIM/NÃO:

— Ahn... o que cada opção faz?

— Vamos de "cutucar". — Madame deu o comando e mais letras verdes encheram a tela em uma enxurrada de linhas. — Isso aí serve pra separar melhor o programa zoeiro do resto. Ele faz uma busca mais profunda até achar o código completo. É a diferença entre achar a ponta do rabo de um gato e achar o bichano inteiro.

— E o "foder cuzinho"?

— Acha o gato e depois atira o pau nele. Só que no caso o gato morre.

— Hm...! Então a senhora criou um antivírus?

— Pode-se dizer que sim, meu nego. Eu fiz uma caralhada de cursos de programação na época em que eu ainda limpava casa de madame (tudo com carinha de Freya, hahaha! Tudo loirinha, branquela e dondoca). Eu fiz os curso pra subir na vida, saca?, ganhar uns barão a mais e virar eu a patroa (ou "Madame", entendeu?). Mas aí o mundo te joga 'prum lado, depois pro outro e quando tu vê, tu tem uma cabeça de androide numa bancada e um hacker cheirador de calcinha cagando pra todo o la...

Madame calou-se subitamente e franziu o rosto. Linhas e falhas riscaram a tela do laptop, o prompt travou e uma voz saiu dos alto-falantes:

— Foi uma boa tentativa, devo admitir. Inútil, mas bem além do que eu imaginava do que você seria capaz.

Má que porra?! — Madame tentou inutilmente reiniciar seu computador, porém nem mesmo sobre o cursor ela possuía controle.

— Que informações você procura, exatamente? Talvez a melhor forma de consegui-las seja me perguntando.

Madame bufou furiosa, virou-se para o lobisomem e ordenou entre dentes:

Felpudinho, tem uma caixa aberta ali atrás com dois rádios. Pega um pra tu, me dá o outro, depois corre pro telhado da fábrica e fica de vigia. Qualquer merda que tu ver, tu me avisa. Eu vou ter um papinho a sós com esse babaca aqui.

— Ok. — O lobisomem, suando frio, assentiu e saiu na direção das caixas.

Agora tu, viado de merda, o que tu quer comigo?

— Oh, mas logo essa pergunta?

Porra, seu corno! Tu metralhou a merda do meu depósito, quase me matou e matou meus garoto! Por que tu fez isso?

— Isso você saberá em breve. — Enquanto 100-Corpo falava, o lobisomem entregou o rádio já sintonizado nas mãos de Madame ("Valeu, cachorrão") e se afastou em direção à porta. — A paciência é uma virtude. Em breve você terá as respostas. Aliás, meu plano inclui contar a vocês o plano. É um meta-plano por assim dizer.

"Meta-plano" de cú é rola, viado! Eu quero saber porque tu me atacou!

PLÁ!

Madame deu um tapão na mesa.

— Você saberá em uma hora, precisamente.

Vai tomar no cú, seu bosta! Pára de enrolar e fala logo!

— Ainda não.

Eu vou te caçar até o quinto dos infernos, porra! Tu se meteu com a preta errada, seu filha de uma puta!

— Não será necessário me caçar, senhorita Jordana. — Madame foi pega de surpresa ao ouvir seu verdadeiro nome. — Depois de hoje, no mínimo um dos dois lados, eu ou vocês, não estará mais vivo.

— O quê, como assim?! — Madame franziu o rosto.

— Eu não pretendo sair vivo ou deixá-los saírem vivos dessa fábrica. De uma forma ou de outra, hoje será o fim. De vocês, meu ou de todos nós.

Piratas Espaciais - E a Consciência de HildaOnde histórias criam vida. Descubra agora