CAPÍTULO 27

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MARIA CLARA 


Alguma coisa estava perturbando Salvatore. 

E não deveria ser algo pequeno porque ele mal trocou duas palavras comigo desde que chegamos na casa de Mama para o nosso almoço semanal. 

Depois de ter acordado em meu apartamento sozinha, eu sabia que tinha sido ele quem tinha me levado para casa. O cheiro dele estava grudado na minha pele, sua presença ainda ali. Alguma coisa me dizia que sua estranheza se explicava pelas dezenas de quadros abarrotados na minha sala de estar. A grande maioria deles retratava cada detalhe do meu instrutor, chefe e melhor amigo. 

De alguma forma, era isso que ele havia se tornado.

Meu melhor amigo. 

Meu confidente. 

Meu protetor. 

E tão mais...

Por isso, pelo respeito que tenho por ele, permito que ele me ignore. 

Quer dizer, ele não estava me ignorando. Só estava sendo muito bem em ser sua versão cordial com que lidei pelos primeiros cinco anos que Salvatore esteve na minha vida. E odeio isso. Odeio sequer a ideia de voltarmos ao que éramos antes. 

Esse pensamento vence o anterior, então caminho em sua direção, sem ligar que a família inteira esteja aqui, nos observando de perto, e o puxo pelo braço, pra longe dos olhares curiosos. 

Salvatore não parece surpreso por minha aproximação, só se deixa levar, mantendo os olhos distantes dos meus. 

- O que está acontecendo? - Pergunto, de súbito, sem tempo para adoçar minhas palavras. 

Ele franze o cenho antes de responder. 

- Do que você está falando? 

Eu respiro fundo e me seguro para não dar um peteleco em sua testa.

- Jura? Vai se fazer de idiota comigo? 

- Maria... - Seus olhos vacilam, finalmente encontrando os meus, e é ali, naquele franzir de testa e o tom de voz adoçado que me preocupo de verdade. Salvatore bravo eu tirava de letra. Salvatore hesitante? Eu não fazia ideia. - Não quero falar sobre isso agora. Não aqui. Não hoje. 

- Você está me deixando nervosa. - Digo, sentindo meu estômago revirar. - Fiz algo que te magoou? 

- Tesoro, não. Nunca. - ele dá um passo em minha direção, a mão fazendo um carinho suave em meu braço. - Só precisamos esclarecer as coisas. Esclarecer o que estamos fazendo. 

Eu olho no fundo daqueles olhos cor de avelã que eu reconheceria em qualquer lugar do mundo e respiro fundo antes de fazer a pergunta que muda tudo. 

- Foi por causa dos quadros? - digo, baixinho. 

E Salvatore nem precisa dizer nada porque seu corpo inteiro se retesa e sua mão escorrega do meu braço. 

- Vamos falar sobre isso outro dia, Maria Clara, não aqui com minha família de platéia. - Ele diz, olhando para os Fiori-Montenegros que parecem muito dedicados em fingir que não estão prestando atenção em cada um dos nosso movimentos. 

- Vamos sim. Vamos falar sobre isso agora. - Insisto. - O que te assustou tanto que você mal consegue olhar para mim agora? 

Salvatore troca o peso entre as pernas, parecendo completamente desconfortável e quando seus olhos finalmente voltam aos meus, estão completamente desprovidos de qualquer emoção. Salvatore me olha com distância, com sofrimento, tudo misturado. 

REDENÇÃO - Irmãos Fiori: Livro III - COMPLETOOnde histórias criam vida. Descubra agora