CAPÍTULO 06

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PARTE 1 - A Princesa e o Cavaleiro
CAPÍTULO 6

Com olhos rasos de lágrimas, Amber encarou a face do cavaleiro à sua frente com pesar. O que ela estava prestes a contar talvez não machucasse só a ela.

— Você sabe a real história por trás da morte do rei Matthew? — perguntou sem desviar o olhar. Precisava que ele enxergasse a honestidade em suas palavras.

— Conheço apenas a versão dos fatos que me foi contada — Ethan respondeu, evasivo. O fatídico evento que levou a cabo a vida do seu tio e dos demais membros da família real era um tabu em Ilíria, por isso, ouvir alguém falar tão abertamente sobre o surpreendeu.

— Minha mãe me contou tudo — sua voz embargou antes de concluir a frase — inúmeras vezes, para que ficasse gravado em minha memória e eu nunca cometesse os mesmos erros.

Amber não conseguiu se conter e irrompeu em choro. Não desejava mostrar tanta fragilidade, mas era inevitável sentir dor ao tocar em feridas abertas.

— Senhorita, acalme-se — disse Ethan, apressando-se em oferecer-lhe um lenço. — O que sua mãe contou? De que erros está falando?

Ethan sabia que não deveria forçá-la a dizer coisa alguma, visto o estado emocional no qual se encontrava, mas um forte impulso por saber mais acerca da tragédia que mudou para sempre a vida de sua família o impelia a questioná-la. Mesmo assim ele ignorou a urgência que sentia por mais informações e não se atreveu a falar até que Amber estivesse mais calma.

— Se sente melhor?

— Sim — respondeu sem conseguir erguer o rosto, constrangida pela cena lamentável que ele presenciou. — Perdoe-me por isso.

— Não se preocupe, é natural se deixar levar por lembranças muito dolorosas — ele disse, condescendente.

Amber ergueu o olhar e, por um segundo, pensou ter visto perpassar pela feição imperturbável do cavaleiro um vestígio de dor.

Amber narrou para Ethan toda a triste história de sua mãe, a princesa Ema Sofia Murrough, do antigo reino de Liech, que tinha o descabido sonho de se casar por amor.

— Ela era a mais nova de quatro filhos e, em teoria, a família real não deveria ter grandes expectativas sobre ela — Amber contava com melancolia. — Por isso estava certa de que, diferente do que aconteceu com seu irmão e suas irmãs, que se casaram para o bem do reino, ela seria capaz de se apaixonar e viver uma vida tranquila com quem amasse.

— Era um pensamento razoável — Ethan comentou, para mostrar que estava atento a cada palavra.

— Meu avô, o rei Alex Murrough, não pensava assim. — Um pesado suspiro deixou os lábios de Amber. — Ao menos, não após a chegada do meu pai.

— Se não estou enganado, nessa época, seu pai era Primeiro-Ministro e fez uma viagem a Liech para fechar um acordo.

— Sim, está correto. Mamãe dizia que Ilíria e Liech eram reinos amigos desde a dissolução das grandes potências, então visitas como essa eram comuns — ela explicou. — Porém, o acordo discutido entre meu pai e meu avô era diferente daquele que o rei Matthew havia ordenado. Foi naquela visita que o Primeiro-Ministro ofereceu incontáveis riquezas ao rei de Liech se, em troca, o ajudasse a tirar seu tio do trono.

Ethan levou a mão direita ao queixo, refletindo no que tinha acabado de escutar. Ele já suspeitava, mas naquele momento pôde ter certeza que o plano de atacar Ilíria foi idealizado por Leonard Eisenwald, pai de Amber.

— Suponho, então, que sua mãe foi envolvida nesse acordo contra a vontade?

— O matrimônio dos meus pais existiu com intuito de selar aquela aliança. Mas mamãe não sabia disso quando meu avô anunciou o compromisso, ela imaginou que seria um mero casamento arranjado para manter a amizade entre os territórios.

— Sendo assim, ela não conseguiu realizar seu sonho — concluiu o comandante.

O silêncio que se seguiu foi incômodo.

— Mas, para o meu pai, esse não foi o real motivo do casamento — ela quebrou o silêncio com a voz rouca. — Alguém precisaria assumir a culpa pelo ataque ao palácio de Ilíria. E essa pessoa foi minha mãe.

— Está dizendo que sua mãe nunca passou informações privilegiadas para o reino de Liech.

— Claro que não! — Amber respondeu com veemência. — Minha mãe não tinha acesso à informação alguma, ela sequer imaginava que estavam tramando uma invasão. Tudo foi planejado pelo meu pai.

A narrativa inconformada de Amber voltou a ser regada por grossas lágrimas.

— Ela foi acusada de traição e condenada, pelo próprio marido, ao exílio. Descartada como um sapato velho. — Os soluços da jovem ressoaram alto pela tenda, competindo com o som da insistente chuva que caía lá fora. — Minha mãe passou os últimos anos da sua vida sofrendo por não ter sido mais do que uma ferramenta para o pai e para o marido.

Amber respirou fundo antes de continuar:

— Em seu último suspiro, ela me fez prometer que eu não me deixaria ser usada como ela e que eu viveria uma vida muito diferente da dela. — O peito da jovem princesa doía como se estivesse revivendo aqueles dias infelizes.

Comovido com o pranto da moça, o comandante alcançou uma das mãos dela e a apertou de leve.

— Não diga mais nada. Se é doloroso demais, não é necessário seguir com o seu relato.

Ela assentiu, levando a mão livre à boca, na vã tentativa de conter os soluços ruidosos.

A versão que acabara de ouvir pegou Ethan de surpresa, pois jamais poderia imaginar que Ema Sofia Murrough tivesse sofrido tamanha injustiça. No fim, ela foi apenas mais uma vítima de Leonard. O cavaleiro gostaria de dizer a Amber que sentia muito, mas não sabia se seria adequado para o momento. Decidiu, então, que o melhor seria permanecer em silêncio, mas seguiria segurando sua mão até que fosse capaz de acalmar as emoções.

O Desabrochar da FlorOnde histórias criam vida. Descubra agora