Anna
E mais uma vez eu pago com a língua, mas me arrependo? Definitivamente não.Perdi a conta de quantas vezes transamos, fizemos várias vezes na cama e terminamos no banheiro.
Agora ele tá se vestindo pra ir embora, porque tem coisas pra resolver lá no morro.
- Como a gente fica agora?- ele pergunta e eu me sento na cama.
Essa era a última pergunta que eu queria que ele fizesse.
- Ficamos como estávamos antes, a gente só transou, mas isso não vai mudar nada.
- Beleza, vou nem discutir- nega com a cabeça e veste a camisa.
Agradeço mentalmente quando escuto os berros do Theo, ajeito minha blusa no corpo e me levanto, passando pelo Filipe e indo até o quarto do Theo que já tá em pé no berço.
Ele ainda dorme no berço, isso quando não dorme comigo, não confio muito em deixar ele em uma cama sozinho, sem contar que ele pode acordar do nada e sair da cama como se fosse um adulto e se perder pela casa.
Digo isso por experiência própria já que uma vez ele saiu sozinho e ficou escondido atrás de um armário enquanto eu berrava feito uma louca procurando por ele.
Palhaçada isso.
- Você fez xixi?- pergunto e ele esconde o rosto no meu pescoço.
Não sei de onde ele puxou esse ótimo humor depois que acorda.
Ah, foi de mim.
O Filipe aparece no quarto e vem até o Theo dando um cheiro nele.
- Você tira a fralda dele? Vou preparar um lanche, ele deve estar com fome.
- Da ele aqui- responde seco e eu faço uma careta colocando o Theo no colo dele e saindo do quarto em seguida.
...
- Não vaiii- o Theo grita enquanto agarra o pescoço do Filipe que disse que vai embora.
Faz uns minutos que eles estão assim.
Depois que o Theo lanchou, eles ficaram brincando enquanto eu resolvia algumas coisas do trabalho.
- Filho, seu pai tem que ir embora- tento convencer ele que se esperneia mais ainda.
- Não papai, não vai- faz um biquinho.
- Tenho que trabalhar, garotinho, logo logo eu tô de volta.
Juro que eu sinto raiva quando o Theo começa a fazer essas manhas, sei que ele ainda é criança e tals, mas é chato.
Odeio ver ele chorando, no começo eu sentia vontade de devolver pra mãe, mas a mãe era eu, então não tinha o que fazer.
- Theo, para com isso! Ele tem que ir- tento tirar ele do colo do Filipe, mas quem disse que consigo?
Respira... Inspira...
Eu vou surtar!
Será que se fosse ao contrário ele estaria assim também?
- Tá bom então, Theo, ele fica e eu vou- digo e ele me olha limpando as lágrimas.
- Tchau- diz rindo e se soltando do pescoço do Filipe que cai na gargalhada.
- Quem te carregou na barriga foi eu, quase saí rolando de tão redonda que fiquei, sofri com os inchaços, quase morri no parto, vi minha alma indo embora milhares de vezes, sofri com seus choros desesperados na madrugada e você faz isso?- cruzo os braços olhando indignada pra ele que ri com o pai.
- Aceita, Anna, ele gosta mais de mim- o babaca diz e eu reviro os olhos.
- Theo, seu pai vai embora.
Se eu falar que ele fechou a cara e começou a chorar vocês acreditam? Pois então.
- Se você for embora eu vou te xingar até sua oitava encarnação, porque eu sei que ele vai continuar chorando desse jeito aí- falo pro Filipe.
- Theo, papai tem que ir embora, carinha, mais tarde eu venho pra brincar com você de novo.
- Não papai, ficaaaa.
Depois de mais um tempão o Filipe decide ficar, mas antes teve que ligar pra um dos meninos continuarem no comando e deu mais algumas ordens do que fazer.
Não é fácil comandar um morro, viu?
Agora a gente tá aqui na salinha de brinquedos do Theo, os dois estão no chão brincando e eu tô sentada no sofázinho que mal cabe a minha bunda.
Quem diria, o demo que mete medo em todo mundo brincando de brinquedo com o filho que até em tão a maioria das pessoas não sabem da existência.
Eu sei que quando a gente vai lá no morro o Filipe fica morrendo de vontade de sair com o Theo e esbanja-lo por aquele morro todo, eu vejo isso em seu olhar, mas por enquanto eu não acho seguro.
O celular dele toca e ele atende mudando de expressão rapidamente, se levanta rápido e começa andar de um lado pro outro.
Pelo que eu entendi o morro foi invadido por uma operação policial.
Agora esse homem vai ter um treco dentro dessa casa.
Depois que ele desliga o celular, eu consigo ver a raiva em seus olhos.
- Tá vendo? Invadiram o morro e eu não tô lá, o dono da favela não tá lá pro confronto, se o Theo não tivesse me segurado aqui eu estava lá batendo de frente, coisas que um chefe deve fazer, mas não, tô aqui brincando de brinquedo- diz nervoso enquanto passa a mão pelo cabelo que tá precisando de uma hidratação.
- Você já parou pra pensar que se ele tivesse te deixado ir, era bem provável que você fosse pego subindo o morro? Pensa bem, porra.
- Pola- o Theo repete e eu lhe repreendo com o olhar- dicupa mamãe- volta a brincar.
- Primeiro, eu nem deveria ter saído de lá, mas que caralho, minha vida é lá, eu não posso ficar saindo não, olha o que acontece. Por isso que eu queria que vocês fossem morar lá.
- Pro nosso filho presenciar isso? Chorar por conta dos barulhos de tiro? Pra eu morrer de preocupação e criar paranóias de que a casa poderia ser invadida a qualquer momento e tirassem ele de mim? Ele não nasceu pra isso.
- Ninguém nasce pra essa vida, somos jogadas nela.
- Você pode não ter tido escolha, outras milhares de pessoas que vivem nessa vida também não, mas o meu filho tem, e eu vou fazer de tudo pra que ele não cresça vivenciando isso, não quero ter a preocupação de ver o meu filho saindo de casa e saber que ele pode voltar morto.
Só de pensar nisso o meu coração aperta.
Ele não diz nada pois o celular toca de novo.
- Papai- o Theo chama.
- Agora não- diz alto fazendo o Theo correr até mim.
- Tá vendo? Vai pra lá com a porra desse celular, some daqui- digo puta da vida e me levanto pra pegar o Theo.
Respiro fundo quando o Filipe sai avoado.
Vontade de dar um chute na bunda.
- Tá tudo bem, neném, ele só tá bravo com algumas coisas que aconteceram, não é com você.
- Ele guitou comigo.
E eu vou gritar também se você não parar de ligar tanto pra ele.
- vamos continuar brincando?
- Uhum- sorri animado e faz movimentos pra descer do meu colo.
Criança é uma coisa estranha, né? Ninguém entende.
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𝗣𝗮𝗴𝗮𝗺𝗲𝗻𝘁𝗼 𝗩𝗮𝗹𝗶𝗼𝘀𝗼•• 𝗙𝗶𝗹𝗶𝗽𝗲 𝗥𝗲𝘁
RomanceTudo começa com uma dívida, que no caso, terá uma pessoa como o pagamento. Duas pessoas totalmente diferentes, aquele tão famoso oposto, mas será que dessa vez eles irão se atrair? ••iniciada em abril de 2022•• •• Republicada em dezembro de 2023••