001

1.5K 151 52
                                    

1983



"A arte é o espelho e a crônica da sua época"

Os suaves rabiscos na folha branca formavam lentamente uma silhueta. Uma silhueta muito bem conhecida por Elizabeth. Silhueta? Silhueta é o desenho que representa o perfil de uma pessoa ou objeto, de acordo com os contornos que a sua sombra projeta.

Aquela em específico, era a silhueta de sua mãe. A silhueta de Alessandra O'hara. A ex pintora que faleceu devido a uma doença chamada tristeza.

A arte sempre foi um conforto pra Alessandra. Que passava a maior parte de seus dias em seu ateliê, pintando e se misturando entre os quadros e tintas. Elizabeth se lembrava da primeira vez que pintou com a mãe. Se lembrava de todas as vezes que foi levada ao ateliê, e foi ensinada sobre a arte. Sobre o amor da vida de sua mãe.

Foram tantas vezes, que se acostumou com o cheiro da tinta. Com os calos nas mãos, e as dores constantes pelos movimentos repetitivos e incessantes, mesmo que suaves. As diversas roupas descartadas pelas manchas permanentes das tintas. Se acostumou com aquilo. Amava aquilo.

Amava porque era o que sua mãe amava. Era o que a manteve firme, a manteve viva. Era o que a alegrava em seus dias mais tristes. Era o que a consolava em seus piores dias. E foi onde ela se despediu. Onde morreu. Deitada sobre o plástico no chão, manchado com diversas cores de tinta. O pincel descansava na mão, enquanto ela sorria uma última vez pro seu último quadro. Sua filha.

Elizabeth que a encontrou. No auge de seus dezesseis anos. Estava tão animada para contar pra mãe sobre o elogio que recebeu na aula de artes. E sobre como o seu crush, Theodore, sorriu pra ela depois de elogiar sua pintura. Seu mundo caiu quando a viu no chão. Os olhos fechados, a pele fria e o coração parado.

Seu pai nem mesmo estava na casa quando ela morreu. Voltando da viagem em cima da hora pro enterro, organizado pela vó de Elizabeth. Que também se foi dois meses depois. A tristeza também a levou.

Tristeza. Elizabeth odiava. Odiava com todas as suas forças. Aquela maldita doença que levou as duas pessoas mais importantes de sua vida. Sobrando apenas Steve. Mas ela também tinha medo de perde-lo pra dona tristeza. Felizmente, Steve estava seguro longe dela. Já Elizabeth, bem, ela não estava muito longe.

Os olhos de Elizabeth se ergueram pra janela a frente da escrivaninha onde desenhava. Ela pode ver a silhueta de Dustin e Will, iluminados pela fraca luz do poste. O último citado continuando seu caminho floresta adentro enquanto Dustin guardava a bicicleta e entrava em casa.

Elizabeth não gostava daquilo. As crianças sempre estavam andando sozinhas por aí a noite. E como uma ótima medrosa mas também amante de filmes de terror, ela sentia medo por eles.

Não era próxima do quarteto. Apesar de ter cuidado de Dustin boas vezes pra Cláudia resolver alguns assuntos. E ter sido o refúgio do garoto durante a separação dos pais. Mesmo assim, ela temia tanto por eles. Talvez por perceber que nenhum adulto realmente se preocupava com eles andando por aí a noite. A negligência dos pais. Ela conhecia aquilo, e isso afetou negativamente em si. Não queria aquilo pras crianças.

Foi tirada de seus questionamentos pelo telefone do andar de baixo tocando. Desceu as escadas lentamente, acendendo todas as luzes no processo. Enfim. Medrosa lembram.

Assim que puxou o telefone do gancho e o levou a orelha, sentiu um arrepio ruim em sua nuca. A respiração do outro lado da minha a deixou travada. Demorou minutos pra conseguir pronunciar um baixo.

Lizzie: alô?

Sem respostas. Apenas a respiração. Parecia que estava na sua nuca.

Lizzie: se isso for um trote eu juro-

E então a ligação foi encerrada. A garota riu incrédula, batendo o telefone contra o gancho pra encaixa-lo de volta.

Lizzie: eu odeio esse lugar.

Gemeu em irritação, seguido de um grito quando sentiu uma mão em seu ombro, se virando pra trás e acertando um soco na pessoa que cambaleou pra trás com a mão no rosto.

Lizzie: mas que... Porra!! Qual o seu problema?!

Steve: qual o seu problema? Que droga! Acho que quebrou meu nariz.

Ele realmente sangrava, e Elizabeth precisou respirar fundo pra não esgana-lo.

Lizzie: que droga Harrington. Você me assustou.

Steve: você que é medrosa pra caralho.

Ela o bateu no braço e e se afastou, seu nariz realmente estava doendo de mais.

Steve: acho que você realmente quebrou meu nariz. Aonde aprendeu a socar assim? Deus me livre.

Lizzie: você sabe que eu fazia artes marciais com meu tio em Los Angeles.

Cruzou os braços vendo o moreno inclinar a cabeça pra trás pra conter o sangue.

Steve: droga eu sempre esqueço... Seus reflexos são melhores que os meus.

Choramingou e a garota revirou os olhos, voltando pro andar de cima e pro seu quarto, sendo seguida por ele. Que sentou na cama esperando que ela voltasse com um pano.

Lizzie: é. Você joga basquete, eu luto desde os cinco anos.

Jogou o pano na cara do moreno que a olhou irritado. Mas pressionou o pano contra o nariz, limpando o sangue.

Steve: tudo bem... Eu me consolo em apanhar de mulher bonita.

A garota revirou os olhos quando e piscou pra si, voltando pra escrivaninha e guardando seu caderno e seus lápis.

Lizzie: por que tá aqui?

Steve: vim me desculpar de novo. Não gosto de saber que te machuquei.

Ela cruzou os braços e o olhou encostada na mesa.

Steve: eu trouxe sorvete, se ajuda.

Ergueu a sacola que ela nem tinha visto que ele segurava.

Lizzie: abacaxi?

Steve: e uva.

Um pequeno sorriso se formou nos lábios da garota antes de ela pegar a sacola dele.

Lizzie: vai pegar as colheres na cozinha.

Steve: sim senhora.

Se levantou e logo foi fazer o que lhe foi pedido. A garota riu fraco enquanto tirava o pote da sacola e o colocava na escrivaninha. Vendo um bilhetinho em cima e uma florzinha, ela soltou um riso meio alto.

"Perdoa o Stevezinho minha rainha?"

Ele era um idiota. Com toda certeza. Um idiota que manipulava sua imagem na frente dos outros, e era estúpido com pessoas consideradas estranhas ou fora do círculo social em que estava. Um idiota que fingia não ter sentimentos, e dores. Que escondia seus problemas familiares com a pose de riquinho bad boy festeiro. Mas era seu idiota. Seu melhor amigo idiota. Seu rei idiota.

Ao olhar pela janela, Elizabeth pode ver as árvores balançando, o vento adentrou o quarto arrepiando o corpo pequeno. E ela se apressou em fecha-las, vendo uma silhueta desconhecida e estranha perto do carro de Steve antes de realmente fechar as janelas. Puxou as cortinas pra cobrir totalmente a janela, e se virou pensando naquilo.

Se assustou ao ver a silhueta do rapaz na porta do quarto. A luz do corredor acesa permitindo que ela fosse vista. A silhueta dele era bonita. Linda na verdade. E isso era frustrante. A silhueta de Steve Harrington era tão linda quanto ele.























Always you - J.B Onde histórias criam vida. Descubra agora