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1984

"Nunca reveles com facilidade o teu pensamento, nem executes nunca o que bem não tenhas ponderado"




Regra número um: não dar trabalho.

Regra número dois: sem drogas e bebidas.

Em uma noite, Rafe tinha quebrado duas regras. Regras que Arthur estabeleceu desde que o mais novo teve uma overdose antes de um grande jogo.

Assim que acordou em sua cama, ainda com as roupas da noite anterior, cheirando a vômito e bebida, ele soube que estava fodido. Nunca enrolou tanto pra se arrumar, demorando propositalmente. Não queria descer.

Enquanto tomava banho, as memórias da noite anterior vieram como uma avalanche. Passando as mãos pelos cabelos e rosto, ele pensou em tudo que disse pra Elizabeth. Não devia ter falado tudo aquilo. Se sentia... Humilhado. Fraco.

Afinal, Arthur sempre o ensinou que expor seus sentimentos e demonstra-los é uma fraqueza.

Fraco? é o que não tem energia moral, espiritual, firmeza: caráter fraco. Desprovido de capacidade intelectual; insuficiente, medíocre.

Rafe foi chamado de fraco a vida inteira, por todos ao seu redor. Ele não queria ser fraco. Ele só queria poder ser ele mesmo.

Assim que colocou os pés na sala, sentiu algo se impactar contra seu corpo. Observou o jornal dobrado no chão, pelo menos não tinha sido algo de vidro dessa vez.

Arthur: me lembro de ter deixado claro que não queria mais que usasse essas coisas.

Rafe: não... Não foi tanto assim.

Não deveria ter aberto a boca. Ouviu o arrastar do vaso de flores da mesa, e logo o estalar dele na parede atrás de si, os pequenos cacos machucando seu pescoço e rosto. Virou o rosto a tempo do estrago ser menor.

Arthur: não me responda!

Com os ombros e cabeça baixa, ele só escutou. Escutou por minutos o surto do pai. Sua mãe encostada na parede da sala de jantar, não aguentava olhar quando Arthur surtava com o mais novo.

Arthur: acha que vai conseguir entrar pra polícia com essa atitude?!

Rafe: eu não quero entrar pra polícia!

E de novo, não devia ter aberto a boca. Mas já era tarde agora.

Arthur: como é que é?!

Rafe: eu não quero entrar pra polícia, eu nunca quis!

Levantou a cabeça pra finalmente olhar pro homem que o deu a vida, e o tirou a vontade de tê-la.

Arthur: você não tem que querer nada! Eu sou seu pai, eu te coloquei no mundo! Você tem que fazer o que eu mandar você fazer!

Ele deu a volta na sala, se aproximando do mais novo.

Arthur: eu não te coloquei no mundo pra ser um vagabundo sem futuro! Te coloquei pra você ser o que Elizabeth não pode ser!

Rafe: é só pra isso que eu sirvo?! Pra fazer o que Elizabeth supostamente não pode?!

Os dois se aproximaram ao mesmo tempo, o mais velho apontando o dedo pra ele.

Arthur: nem pra isso você presta. Até Elizabeth está sendo melhor que você.

Comparação. Ele amava aquilo. Comparar Elizabeth e Rafael.

Elizabeth é mais inteligente que você. Elizabeth é mais dedicada. Elizabeth é mais popular. Elizabeth tem notas melhores. Elizabeth nunca se envolveu em nenhuma confusão. Elizabeth não usa drogas. Elizabeth Elizabeth Elizabeth.

A vida de Rafe se resumia em ser melhor que Elizabeth. Só porque ele era homem. Porque ele era o filho que seu pai sempre quis ter. Porque ele precisava de um filho pra seguir seus passos. Porque Elizabeth queria ser artista. Porque Elizabeth nunca o obedeceria.

Arthur: Elizabeth conseguiria o mundo se ela quisesse. Você... Você não consegue nem se manter sóbrio.

O diminuir. Também era algo que gostava muito.

A verdade era que Arthur gostava de tudo que o fizesse se sentir um nada. Que o fizesse querer morrer. Ele parecia se divertir com isso.

Arthur: agora some. Não quero ver sua cara nem tão cedo.

E assim o mais novo fez. Simplesmente saiu porta a fora, o peito apertado, assim como os punhos. Sentia a garganta fechada e os olhos arderem, mas estava cansado de chorar.

Ignorou todos que tentaram falar consigo na escola, procurando por um lugar que pudesse ficar sozinho. Matou as primeiras aulas, sentado no chão de um beco perto da quadra de basquete.

Não sabe quanto tempo ficou lá, mas devia ter passado muito tempo, já que agora Nancy Wheeler estava andando em sua direção. E ela nunca estaria alí se ainda estivesse tendo aula.

Nancy: ei... Tá tudo bem?

Ela estava receosa, percebeu isso. Também estaria no lugar dela. Só andava com babacas.

Rafe: tá, Wheeler, eu tô ótimo, não tá vendo?

Levantou completamente o rosto pra olhar ela, e viu os olhos dela aumentarem um pouco. Tinha esquecido dos cortes em seu rosto e pescoço. Estava tão alterado que nem sentia a dor, até se lembrar que eles estavam alí.

Nancy: eu... O que aconteceu com você?

De forma receosa, ela se aproximou mais, e se ajoelhou a sua frente, olhando pro sangue seco.

Rafe: nada.

Ela o olhou irônica e ele revirou os olhos.

Nancy: me deixa só... Limpar isso tá?

Ela abriu a mochila, mexeu um pouco, e logo tirou uma garrafa de água e um lenço. O loiro apenas a observou molhar o pano, e estender a mão receosa. Com um suspiro, apenas virou um pouco o rosto, a dando acesso aos machucados. Mordeu o lábio ao sentir a ardência do contato.

Nancy: desculpe...

Ainda assim, ela percebeu que tinha doído. Ela limpou com calma e delicadeza, tentando não fazer doer mais do que já estava. O loiro apreciou isso. Quando ela passou pros machucados do rosto, teve que se aproximar mais pra enxergar bem. O loiro agora a olhava vidrado.

Nancy era ainda mais linda de perto.

Nancy: pronto...

Terminou depois de poucos minutos, e o contato cessou, pra infelicidade de Rafe.

Nancy: vai me contar agora como arrumou isso?

Olhou pra ele, percebendo que ele já a olhava. Os olhos se conectando. Azul no azul.

Ao invés de responder a Wheeler, o loiro apenas se inclinou em sua direção, pousando a testa no ombro dela, o que a surpreendeu. Depois de alguns minutos, ela levou a mão aos fios loiros, os acariciando devagar. Foi o suficiente pra Rafe derreter, e as poucas lágrimas que segurou descerem, molhando a camisa da garota.

Ela não disse nada, apenas o ouviu chorar baixo, e fez carinho em seu cabelo.

Ele se sentia bem com ela. Não sabia o porquê, mas se sentia muito bem com ela. Tão confortável ao ponto de chorar em seu ombro por causa do pai idiota.

Estava ficando mais fraco.

Mas por um momento, não pareceu tão ruim.










[Não revisado]

Capítulo pra vocês conhecerem mais do Rafe e sua vida de merda.

Sim, planejo fazer a Nancy ser pro Rafe, o que o Jonathan é pra Lizzie. Eles obviamente vão aparecer menos que os Jonzzie, mas vou tentar postar capítulos extras deles se vocês quiserem.

Em relação ao Steve... Não planejei acrescentar um interesse romântico pra ele, mas quem sabe.


Always you - J.B Onde histórias criam vida. Descubra agora