Vinte e oito

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Rafaella desligou o motor do carro do lado de fora do apartamento. Segurou firme o volante.

Merda. Merda. Merda.

O que ia fazer? Tinha ido longe demais. Bianca sabia disso. Ela também. As duas tentaram se conter a semana toda, mas era impossível. O gênio já tinha saído da lâmpada.

A porta do passageiro rangeu e se abriu, assustando-a. Segundos depois, Gizelly se sentou ao seu lado e bateu a porta.

- Você deveria trancar o carro, sabe Qualquer maluco com uma faca conseguiria abrir e te pegar desprevenida.

- Ou ainda pior, você mesma. — Rafaella ofereceu um sorriso, apesar da sua confusão.

Gizelly ligou a luz interna do carro e se virou, examinando a amiga.

- Você a encontrou? — Ela assentiu. - E? Tudo resolvido?

Rafaella lançou a ela um olhar significativo.

- Claro. Tivemos uma transa de despedida e agora tudo acabou. — Gizelly riu.

- Para o bar então? — Rafaella suspirou.

- Quem me dera.

Gizelly deu um soco no painel.

- O que aconteceu?

- Vi o Martin e então Mariana desceu para me entregar as chaves. Depois a Bianca apareceu e foi a coisa mais estranha do mundo. — Ela suspirou. - É só que... toda vez que estamos próximas uma da outra, há uma certa tensão no ar, sabe? Alguma coisa que não posso descrever. Quando ela está perto de mim, mal consigo respirar.

- Isso se chama tesão, Rafaella. Acontece quando você beija alguém, transa com essa pessoa na surdina e não consegue pensar em mais nada até que aconteça de novo.

- É exaustivo pra caramba, isso sim. Como é que as pessoas conseguem trabalhar com tudo isso acontecendo? Eu não consigo me concentrar em nada. Só penso nela vinte e quatro horas por dia.

Gizelly colocou a mão no seu joelho.

- Acredito que o nome disso seja se apaixonar por alguém. — Rafaella ergueu as mãos.

- Não tenho tempo para me apaixonar. Especialmente quando essa pessoa foi quem me contratou para levá-la ao altar. Ela vai dizer “sim” amanhã, e eu estou aqui, sentada no carro me perguntando se ela vai mudar de ideia. Sério, a quem estou enganando? Sou a especialista em casamentos. Esse é o vigésimo oitavo. Sabe em quantos desses a noiva ou o noivo desistiram de ir até o fim?

Gizelly torceu a boca.

- Nenhum?

- Exatamente. Nem umzinho. As noivas nunca desistem, mesmo quando não amam o noivo. Mesmo quando transam com outra pessoa. Mesmo me dizendo que estava apaixonada por mim.

Alguns momentos de silêncio se passaram. Do lado de fora, um casal andava na calçada, rindo juntos. O que Rafaella daria para ser livre assim. Nesse momento, sua vida parecia estar em uma corda-bamba, e independentemente de qual lado pulasse, ia se machucar.

- Você precisa mesmo ir ao casamento amanhã? Se ela não vai continuar o que vocês começaram, parece cruel você ter que ficar lá vendo- a se casar.

- É o meu trabalho. O que ela me pagou para fazer.

- Mas as circunstâncias mudaram. Se você ama a noiva, e ela te ama, deveria haver alguma margem de negociação.

Rafaella estremeceu com as palavras de Gizelly.

- Ninguém disse nada sobre amor.

- O que você acha que é isso então? Só uma quedinha? Porque de onde estou vendo, não é o que parece. Você está uma pilha de nervos desde que voltou de Cannes. Pelo que me contou, ela também.

- Bem, não importa, não é? Nada vai mudar.

- A não ser que algo ou alguém faça isso mudar. — Rafaella se virou para Gizelly.

- O que está sugerindo?

- Que você não se apaixona à toa. A Bianca realmente te conquistou, e você não pode ignorar o que está sentindo. Se ela sente o mesmo, talvez você devesse perguntar o que ela acha antes que ela vá para o altar. Só perguntar.

- Ficou doida? Sei que os meus sentimentos são reais. Acho que os dela também. Mas e se eu estiver errada? Ou ainda pior, se eu estiver certa, mas ela não estiver preparada para destruir o dia do seu casamento?Porque foi exatamente isso que aconteceu até agora.

- Pelo menos você vai ter uma resposta, e não vai passar o próximo ano se perguntando o que teria acontecido.

- Não, mas vou passar o próximo ano procurando outro emprego, já que ninguém mais vai me contratar como madrinha profissional.

Gizelly balançou a mão.

- Você mesma disse que não pode ficar nessa profissão para sempre. Além do mais, é claro que pode trabalhar, só não nos mesmos círculos da sociedade.

- Acho que o boato da madrinha transar com uma noiva talvez se espalhe por aí.

- Não acho que você deva focar nisso. Vamos voltar a falar sobre seus sentimentos por Bianca. — Gizelly colocou uma mão no peito de Rafaella. - O que acontece aqui quando eu digo o nome dela?

Rafaella engoliu em seco.

- Meu coração fica acelerado.

- Como ele se sente quando falo que ela vai se casar com o Martin?

- Devastado. — Rafaella se inclinou para trás, afastando a mão de Gizelly. A resposta veio em de repente. - Se ela se casar, acho que nunca mais vou conseguir fazer esse trabalho. Sempre vou me lembrar dela.

- Uau. — Gizelly deu outro tapa no painel. - Então, se ela se casar, você vai trocar de emprego. Se ela não se casar, vai ter que trocar de emprego também. Com o trabalho fora dessa equação, o que você tem a perder? Você é a madrinha dela. Vá vê-la antes da igreja. Só diga o que você sente. E se ainda assim ela escolher se casar, é porque ela nunca valeu a pena. Porque você merece alguém que te queira, e só a você.
Rafaella encarou a melhor amiga.

Gizelly estava certa. Esse era um problema do coração. E sendo assim, não podia ignorá-lo.

O celular acendeu com uma mensagem de celular. Rafaella olhou para ele.

Era de Bianca.

Ela começou a tremer. Será que Bianca também estava pensando na mesma coisa e tinha decidido algo? Seu coração acelerou ainda mais quando pegou o celular e pressionou o botão para abrir a mensagem.

Oi, Rafaella. Estava pensando no que a Mariana disse e talvez ela esteja certa. Você não deveria vir amanhã. Vai ser mais difícil para nós duas. Obrigada por tudo. Bjs, B.

Rafaella encarou a mensagem. Todas as estrelas do universo explodiram. O sol perdeu todo seu calor. Seu coração se partiu em um milhão de pedacinhos. Bianca tinha tomado sua decisão.

Apoiou a testa no volante e um soluço pequeno escapou da sua garganta enquanto seu rosto desmoronava. Sabia que isso aconteceria. Mas quando finalmente aconteceu, a verdade era muito mais difícil de encarar.

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MADRINHA DE ALUGUELOnde histórias criam vida. Descubra agora