POV ANNE
Salto no tempo.
- Como foi a aula? – Carolina perguntou quando entrei no quarto e desabei sobre a cama.
- Como sempre. – Ela olhou para mim, esperando. - Monótona. – Completei.
As duas aulas da manhã tinham sido com Dayane Durand, que ministrou biologia avançada na primeira hora e herbologia fitoterápica na segunda.
- Sobre o que foi a aula? – Carolina insistiu.
- Sobre as propriedades de um matinho rasteiro que, quando chamuscado, camufla sons e cheiros no ambiente para aqueles que estiverem fora.
- Não parece monótono para mim.
- Kol me ensinou sobre todas as 5 diferentes espécies dessa planta há 1 ano e meio. – Eu disse, me virando de barriga na cama. - Basicamente, a senhorita Durand está atrasada em alguns meses. – Falei. O rosto enterrado nos travesseiros.
- Exibida. – Murmurou Carolina.
- Ei! – Eu disse rindo e arremessei um travesseiro nela. – Eu ouvi isso.
- Sei que ouviu.- Ela arremessou o travesseiro de volta. – O que você vai fazer essa tarde?
Mesmo depois de um mês nesse lugar, me vendo fazer as mesmas coisas quase todos os dias, Carolina ainda se importa comigo o bastante para me perguntar com o que é que eu vou desperdiçar o meu precioso tempo.
- Eu...- Hesitei, tentando lembrar com o que eu poderia ocupar minha tarde. – Tenho lição de biologia e herbologia. – Mas a lição não tomaria nem uma hora inteira do meu tempo. E pela expressão impressa no rosto de Carolina, ela sabia disso.
- Entendi. – Ela disse friamente, se virando para mexer em algo na cômoda de madeira clara do quarto.
O último mês tinha sido todo assim, praticamente. Nós saiamos para o café as 07:00 e depois, as 08:00, eu saia para a aula. Carolina ficava por conta de qualquer coisa que fosse do interesse dela, assim como o restante das acompanhantes, que deviam somar pelo menos duas dúzias de mulheres humanas. Eu só saia da aula as 10:00 e me obrigava a caminhar o mais lentamente possível para poder chegar ao meu quarto só quando o relógio estivesse perto de bater as 10:30, deixando só 30 minutos de tempo livre até o almoço, nos quais eu geralmente jogava conversa fora com Carolina. O almoço era tão aterrorizante quanto o café. Todas as bruxas, as acompanhantes e as anciãs se sentavam e se obrigavam a conviver e conversar, mantendo o mínimo de civilidade entre si. Cada mesa comportava 52 pessoas, entre alunas, anciãs e acompanhantes, e existiam três dessas mesas no refeitório, fora a pequena mesa retangular posicionada diante delas, na qual a diretora de perfume enjoativo se sentava e avaliava em silêncio o comportamento das alunas. Eu nunca me dignava a manter uma longa conversação com ninguém, mesmo Carolina só obtinha respostas quando ela se dirigia diretamente a mim. Eu não precisava me preocupar em construir uma reputação, afinal, todos lá sabiam quem eu era e de onde eu tinha vindo e isso bastava para que elas tirassem suas próprias conclusões ao meu respeito. As únicas que não eram tão afetadas quanto a mim, eram as acompanhantes, com quem Carolina fizera amizade logo na primeira semana. Essas mulheres não tinham o costume de me olhar de soslaio que nem as suas pupilas sempre faziam.
O relógio marcou 10:45. Carolina e eu nos dirigimos até o refeitório exageradamente grande, em total silêncio.
- Eu estou fazendo o meu melhor, sabe. – Ela disse, como se estivesse jogando as palavras ao vento, enquanto virávamos para o corredor que dava acesso as portas do salão de refeição.
A tristeza e o cansaço manchavam a bela voz gentil de Carolina e ouvi-la falar aquilo para mim... foi como ter a cabeça mergulhada em um balde de líquido viscoso. A vergonha inundou meu nariz, se arrastando até a minha garganta, me impedindo de respirar ou responder. Pigarreei, buscando palavras.
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A filha de Marcel
FanfictionNascer bruxa no quartel francês já não era uma coisa muito boa, mas ser abandonada ainda bebê pela mulher que deveria me amar, foi ainda pior. Mas eu tive a sorte de encontrar um pai que me amou e que me deu uma família. Eu sou Anne Marie Gerard, um...