Capítulo #17: Aquele com (uma péssima) saída de armário

14 2 0
                                    

Sugestão de música: Take me to church - Hozier

Antes de voltar para o momento atual e dizer como realmente estão as coisas, gostaria de deixar uma breve história do momento em que saí do armário para meu pai, oficialmente.

É claro que ele, como pai, sempre soube que o filho não gostava tanto assim de garotas. Então, em certo momento, decidi conversar com ele. Naquele período, eu estava tentando entrar em um relacionamento com um garoto que conhecera havia alguns meses – apesar de não me sentir totalmente preparado para isso, pensei que poderia lidar com tudo aquilo – e não gostaria de estar escondido durante esse tempo.

Em uma manhã, acordei preparado para isso, já sem qualquer filtro na língua e fui direto para a cozinha, onde meu pai estava se preparando para trabalhar. Antes de conseguir me controlar, soltei aquelas palavras que seriam um alívio depois de tantos anos presas:

– Pai, eu gosto de garotos.

Durante aqueles dez segundos entre ele me olhar desacreditado e dizer algo, sentia cada célula do corpo entrar em combustão. Eu sabia que não tinha mais volta a partir do momento em que abri a boca.

– Eu acho que você está errado. Você sabe que é pecado e que deveria conversar com o pastor sobre isso, apesar de ter me prometido que jamais gostaria de alguém... assim.

Suas palavras talvez não tivessem a intenção de me machucar, mas magoaram meu ser de forma que eu jamais havia sido magoado antes. Eu senti como se facas afiadas estivessem sendo enfiadas em mim. Preferia que meu pai tivesse gritado comigo, me batido, ou até mesmo avançado sobre mim. É estranho, sei disso, mas a expressão serena dele era tão passivo-agressiva.

– Eu tinha 15 anos, pai... Você não pode achar que eu controlo meus sentimentos!

Ele não respondeu nada muito grandioso naquele momento, apenas disse novas palavras do ódio religioso que sentia por pessoas LGBTQIA+ e praticamente me fez jurar que conversaria com o pastor assim que possível, pois queria que eu me livrasse daquela "coisa" de dentro de mim.

Não achei que seria fácil conversar com meu pai sobre quem eu era, mas jamais imaginei que ele fosse me tratar daquela forma. Durante uns três meses, ele praticamente não olhou para mim e só conversávamos quando era realmente necessário (ou seja, quase nunca), era como se eu tivesse morrido para ele, ou como se eu fosse apenas uma pessoa que dividia o teto com ele, sem a menor necessidade de conversar.

Além disso, o óbvio: meu pai me pediu para que eu não saísse por aí comentando com as pessoas tais barbaridades, pois não queria que ninguém soubesse sobre a anomalia do filho. Foi um tempo perturbador para mim, pois meu pai seguiu me ignorando mesmo depois de termos conversado com o conselheiro da igreja (cada um em seu momento, jamais juntos).

O comportamento dele só melhorou outra vez quando decidi sair como assexual e arromântico. Ele se sentiu aliviado com aquela notícia (uma tranquilidade que, em menos de um ano, seria perturbada novamente por conta de Eduardo) e disse que o mundo poderia ser ruim comigo – assim como ele tinha sido, apesar de ele preferir fingir que nunca fizera aquilo – caso eu realmente sentisse algo por pessoas do mesmo sexo.

Depois de tudo isso, só voltamos a conversar em momentos específicos sobre minha condição sexual e eu decidi que não me daria ao trabalho de tentar mudar o pensamento de meu pai se não fosse realmente essencial. Hoje, ele está mais tolerante e talvez até queira tentar ser uma pessoa melhor, pois já disse a ele quão machucado fiquei nos períodos em que ele mal olhava para meu rosto. Por mais difícil que seja, lutarei pelas pessoas que amo até que não seja mais necessário fazer isso.

Ás de EspadasOnde histórias criam vida. Descubra agora