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Quando você cresce em uma realidade dolorosa a sua mente busca subterfúgios para amenizar as feridas causadas pelos abandonos e traumas. É um esquema maluco que encontramos quando não podemos lidar com o que está na nossa frente.
No meu caso, eu corri em direção aos livros. Lia até adormecer e acordava para ler mais um pouco. Eu sonhava acordada e mergulhava em delírios, porque parecia bom imaginar, mesmo que fosse só um pouco, que eu teria em algum momento a sorte de viver aquele conto de fadas ideal.

E acho que cresci assim: incapaz de deixar as ilusões embaixo do tapete do passado.
Eu me arrastei para o começo da vida adulta com muitos delírios, caminhando nos dois mundos; o mundo real e o que eu imaginava.
Qualquer psiquiatra adoraria abrir a minha mente, porque eu certamente tenho algo de profundamente equivocado. No entanto, já passei da fase de lutar contra.

E é por isso que me pergunto se estou realmente com os pés fincados na realidade eu só me refugiando no que é mais fácil para superar os fatos dolorosos que me ocorreram nos últimos tempos.
Uma vida repleta de rejeições e abandonos te transforma numa pessoa que você provavelmente não teria sido se as circunstâncias fossem outras.
E, com todos essesquestionamentos pairando sobre a minha cabeça, levanto da cama, lançando-me nodesconhecido, porque há uma ligeira esperança de que seja mesmo real.

E acredito que o meu apego ao Ruggero se deve a todas essas coisas. Ele é o mais próximo dos meus devaneios que a vida já me deu. E não que eu deva viver para isso, contudo, eu quero vê-lo de novo, quero pedir perdão, desejo fazê-lo entender que me arrependo da minha atitude do outro dia.
E se ele ainda quiser ir, ao menos irá sabendo o que eu sinto. É só isso que importa agora; a honestidade.

Ele seria a melhor ou a pior coisa da minha vida. Não tinha outra opção. Mas eu só saberia disso se quebrasse a barreira dos delírios e visse a realidade tal e qual ela é.

— Ruggero?! — Chamei ao abrir as janelas do meu quarto.

O vento açoitou o meu rosto, jogando os meus cabelos para trás.

Gotas de chuva beijaram a minha pele corada pela emoção, mas não causou nenhum arrepio sequer. A frieza da água que vinha do céu não se comparava ao calor que se propagava dentro de mim. Vinha das solas dos meus pés e corria pela minha corrente sanguínea, se misturando ao meu sangue.

Meu coração batia tão forte que doía; eram como marteladas contra a minha caixa torácica. 

— Se estiver por perto... — Falei, a voz trêmula pela ansiedade. — Por favor, aparece. Eu sinto a sua presença. Que droga! Eu te sinto perfeitamente. E eu não quero pensar que estou maluca. Então, por favor... só me dá um sinal de que está por aqui, de que não me abandonou apesar das bobagens que eu disse na quadra.

Meus olhos vasculhavam a rua. Pessoas iam e vinham, então se não era um sonho, isso queria dizer que também não era tão tarde. Talvez o parque ainda estivesse aberto, por isso a movimentação anormal.

O ruim era que com tantas pessoas perambulando por ali, eu não conseguia distingui-lo, caso estivesse mesmo pela rua.

Merda!

— Você ainda está irritado comigo, não é? O Emmett me contou a verdade. Agora eu sei que você tinha escutado o meu pedido, que queria se conter. Desculpa, tudo bem? Eu errei. Mas... eu sinto a sua falta. Eu sinto mais do que pensei que seria capaz. Porque... por mais que você seja um idiota egocêntrico, você se tornou o meu idiota egocêntrico.

Corri as mãos pelo rosto, tentando assimilar que nada estava dando certo.
Agarrei as trancas da janela e já a ia fechando quando uma luz irritante bateu nos meus olhos. Quero dizer, não era exatamente como uma lanterna ou uma lâmpada, mas tinha um brilho muito forte e refletiu exatamente no meu rosto, chamando a minha atenção.

O Príncipe LoboOnde histórias criam vida. Descubra agora