Não sei se foi por piedade ou pela minha grande insistência, mas Ruggero e Emmett me deram o espaço que eu precisava nos dois dias que se seguiram à volta das minhas memórias daquela noite terrível.
Agora eu compreendia muitas coisas. E, principalmente, sabia com todas as forças que jamais fui culpada de algo. Inclusive, pude tirar um peso horroroso das costas.
O único problema era que nenhuma absolvição moral arrancava de mim o fato de que fui violada de todas as formas possíveis. Abusaram e brincaram com a minha vida durante meses...
Ninguém tinha que passar por algo assim. Jamais....— Faltando aula, mocinha?!
Afastei o carrinho cheio de livros que eu tentava organizar na prateleira.
Eu estava na biblioteca. Havia passado o dia inteiro ali. Era melhor do que ir à escola. Eu não tinha cabeça alguma para estudar com tantas coisas acontecendo. Minha mente precisava processar todas as merdas que me lembrei. E o melhor lugar do mundo sempre foi ali, junto dos livros.
— Graças a Deus você chegou. — Bufei, cruzando os braços. — Tive que passar a manhã toda aguentando o idiota do Don. Ele é um saco! E o pior, não conhece nada daqui. Não sabia onde estava um livro sequer.
Benjamin abriu um sorriso largo e balançou a cabeça.
— Ele nem deveria ser nosso superior, não é? No dia em que ele souber encaixar bem aquela peruca fajuta que usa, aí sim vou ter um pouco de respeito por ele.
Eu não ria sinceramente há dias, mas naquele momento foi fácil fazê-lo.
Benjamin Louis era a minha parte humana. A parte que eu não queria esquecer de forma alguma.
— Estou feliz que esteja aqui, Ben. Você não sabe o quanto!
— Ora, ora, estamos sentimentais hoje? — Brincou, esticando a mão. Eu segurei a mão dele, grata pelo carinho. — O que houve, hein? Está com uma cara tão triste.
Deus, por onde começar?!
Seria horroroso trazer tudo à tona e envolver Benjamin nisso. Além do mais, só de pensar em tudo aquilo eu já queria correr para um canto e me esconder. Esconder-me, principalmente, das lembranças.— Eu só queria que... só queria que você soubesse que é muito importante pra mim. É sério, Ben, você é.... a coisa mais real da minha vida agora. E fico feliz que esteja aqui.
— Ei, ei, não chora. — Ele trouxe a cadeira para perto e eu me agachei, ficando de cócoras na frente dele. — Porque está me dizendo estas coisas, Karol? Hein? O que foi?
— Não é nada. Eu só... eu senti que tinha que falar.
— Aconteceu algo, não foi? Aqueles babacas da escola continuam te...
— Não. — Funguei, segurando as mãos dele nas minhas. — Não é nada disso. Na verdade, sinceramente, eles pouco me importam. Agora eu não tenho medo de mais ninguém, Ben. Juro. Algo mudou dentro de mim.
Seus olhos se estreitaram. A preocupação em sua fisionomia era palpável e eu queria arrancar aquele sentimento dele, porque não era justo que se preocupasse comigo.
Eu estava bem por tê-lo na minha vida.— Jura que ninguém te fez nada?
— Eu juro. — Menti, porque a verdade era péssima. — Para ser sincera, acho que... posso me defender muito bem agora. Fiquei bem fortona. Não sei se notou.
Ergui o braço e depois o flexionei, exibindo-me, fingindo uma animação que não sei se soou sincera.
— Ah meu Deus! Olha esses músculos! Caramba. Você já pode lutar com um ursinho de pelúcia!
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O Príncipe Lobo
Fantasía#1° Em Ficção dia 22/09/2022 ~ #3° Em Juvenil dia 22/09/2022 "Desde quando completou sua transformação em lobo aos quinze anos, Ruggero Pasquarelli resolveu que abdicaria do trono e viveria pelas florestas de Hidden, o submundo onde nasceu. Ele não...