O segundo bilhete
Os pães de sanduíche são entregues na loja do Jimmy de manhã cedo, antes de ele chegar.
Ainda vejo o grande saco de papel encostado na porta fechada todos os dias quando vou
para a escola. Não coloco os pés na lanchonete desde dezembro, mas adquiri o hábito de
olhar para aquele saco, e quando o vejo, sempre acho que estou sentindo o cheiro do pão
que está ali dentro, mesmo sabendo que não passa de uma lembrança.
Em novembro, eu contava a encomenda de pães de Jimmy todos os dias, tirando os
pães de dois em dois e colocando-os no saco vazio do dia anterior. Lembro-me de ter
encontrado seu segundo bilhete no meio do saco, na segunda-feira.
A mesma letrinha esquisita, o mesmo papel enrugado. Mas esse começava com meu
nome.
Miranda:
Sua carta deve contar uma história — uma história verdadeira. Você não pode
começar agora, pois a maior parte dela ainda não aconteceu. E mesmo depois que
acontecer, não precisa ter pressa. Mas não espere muito, pois suas lembranças
podem se apagar. Exijo o máximo de detalhes que possa dar. A viagem é dicil, e
preciso pedir meus favores enquanto ainda consigo ouvir minha mente.
Mais uma coisa: sei que você mostrou meu primeiro bilhete a alguém. Peço-lhe
que não mostre os outros. Por favor. Não estou pedindo por mim.
Li e reli o bilhete. Mas preciso dizer que não tinha ideia do que ele significava... até
recentemente. E preciso dizer mais uma coisa: fiquei com medo. Você me assustou de
verdade.
* * *
— Você está contando esses pãezinhos ou memorizando-os?
Jimmy estava atrás do balcão, empurrando um pedação de presunto bem rápido para a
frente e para trás no fatiador elétrico, como ele gostava de fazer.
Enfiei o bilhete no bolso e voltei a contar os pães, mas havia me perdido e tive que
começar tudo de novo.
Alguns minutos depois, um caminhão de entregas parou em frente à loja, e Jimmy foi
falar com o motorista.
— Ei — disse Colin assim que Jimmy fechou a porta —, vamos descobrir o que está no
cofrinho do Fred Flintstone.
— De jeito nenhum — falou Annemarie. — Você enlouqueceu?
— Você fica vigiando — eu disse a ela enquanto seguia Colin até a sala dos fundos. Ele
já estava com o cofre nas mãos, sacudindo-o, mas quase não havia barulho.
— Gente — disse Annemarie. — É melhor não...
— Estamos só olhando! — gritei. — Ande logo — disse a Colin.
Ele estava tentando tirar o tampão de borracha que havia debaixo do cofre.
— Deixe-me tentar — sussurrei.
— Não. Já consegui — disse ele, e o tampão estava em suas mãos.
Batemos as testas tentando olhar dentro do buraco ao mesmo tempo e então juntamos
os rostos, algo que eu não esperava fazer. Quase não dava para ver o rosto de Colin
daquela posição, mas senti que ele sorria.
— Legal — disse ele. — Está cheio de notas de dois dólares!
Ele estava certo. O cofre estava praticamente lotado de notas de dois dólares, dobradas
em pequenos triângulos, com o número "2" aparecendo dos lados.
— Gente, ele está vindo! — Annemarie parecia em pânico.
Afastamos as cabeças, e Colin enfiou o tampão de borracha de volta no lugar. Eu estava
na frente quando Jimmy abriu a porta para o cara da entrega, que carregava uma pilha de
refrigerantes em um carrinho.
— Ei, moça! — gritou Jimmy. — Preciso de você. Isso é trabalho para homem.
— Desculpe. — Colin veio cambaleante, dos fundos, usando seu avental. — Pausa para
ir ao banheiro.
Annemarie sorriu para mim enquanto Colin e Jimmy colocavam os refrigerantes na
geladeira grande perto da porta.
— Vocês são malucos, sabia? — disse ela.
Eu ainda podia sentir o ponto onde a cabeça de Colin ficara colada à minha.
— Eu sei. O que fizemos foi meio estúpido.
Voltamos para a escola com Colin entre nós duas. Ele andava em zigue-zague e batia os
ombros nos nossos, dizendo:
— Boing! Cinco pontos. Boing! Dez pontos.
E nós ríamos como idiotas.
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amanhã você vai entender
RandomPara Sean, Jack e Eli, campeões de risadas em horas impróprias, de amor intenso e de questões extremamente profundas. A experiência mais bela que podemos ter é o misterioso. — Albert Einstein Como vejo o mundo (1931)