A primeira prova
— Eu não falei? — disse Jimmy no almoço, naquele mesmo dia, batendo alegremente no
balcão com as duas mãos. — Eles não acham que as pessoas contam mesmo os pães. Nem
em um milhão de anos achariam que alguém os conta!
A encomenda de pães viera com dois a menos. Contei duas vezes para ter certeza.
Jimmy foi até o telefone com um grande sorriso no rosto.
— Você fez o dia dele — sussurrou Colin. — Talvez a semana.
Ele estava dobrando fatias de presunto e arrumando-as sobre pequenos quadrados de
papel celofane.
Observei os dedos de Colin enquanto pegava cada pedaço de presunto. Ele não os
dobrava simplesmente ao meio como vi Jimmy fazer. Colin dobrava cada fatia quase na
forma de um belo leque. Quando comecei a olhar, não consegui mais parar. Era, de
alguma forma, hipnotizante.
— Falei com Annemarie ontem à noite — comentei. — Acho que amanhã ela volta para
a escola.
Colin fez um gesto positivo com a cabeça.
— Legal.
Era difícil imaginá-lo se escondendo para deixar uma rosa na porta de alguém, mas
acho que às vezes os garotos podem nos surpreender.
— Ei — disse ele de repente —, sabe de uma coisa? Estou cheio de comer sanduíches de
queijo com alface. — Ele olhou, culpado, para Jimmy, que ainda estava ao telefone falando
sobre os pãezinhos que faltavam. — Quer sair para comer um pedaço de pizza?
Agimos como se estivesse tudo normal, fizemos nossos sanduíches e os embrulhamos
como se planejássemos comê-los na escola. E então corremos para a pizzaria da rua de
baixo. Parece loucura, mas foi como se estivéssemos fazendo algo errado. Voltamos para a
escola enfiando pizza na boca e nos abaixamos ao passarmos pela janela de Jimmy, para
que ele não pudesse nos ver. Não sei por quê, mas ficamos tão empolgados que ainda
tínhamos o que mamãe chama de ataques de riso quando chegamos à escola.
Acho que entramos com tudo na sala de aula, porque todos interromperam a leitura
silenciosa para nos olhar. Julia revirou os olhos.
— Vocês estão atrasados de novo — disse o Sr. Tompkin, e então toda a nossa histeria
se esvaiu e fomos pegar os livros.
* * *
Sentei com o livro aberto sobre a mesa, pensando no bilhete no bolso do meu casaco: Hoje,
às 15h: Mochila do Colin. Sua primeira "prova". Eu tinha que olhar dentro da mochila dele
para descobrir o que estaria, ou não, esperando por mim.
Às 15h em ponto fui ao armário de casacos e peguei minha mochila para ir para casa. A
de Colin estava a apenas alguns cabides de distância. Dava para ouvir que ele conversava
com Jay Stringer no fundo da sala, perto da maquete da Rua Principal. Julia estava lá com
eles, tentando novamente convencer Jay do estúpido óvni de papel alumínio e de como ele
sobrevoaria a rua preso a um estúpido fio de náilon. O projeto dela ainda não havia sido
aprovado.
Alcancei a mochila de Colin e abri o zíper. Dentro, estava o fichário dele, forrado com
jeans e cheio de papéis que saltavam para fora, um livro e o sanduíche de queijo que não
comemos no almoço — enfiado entre os papéis e cheirando a picles. Nada fora do normal.
Senti o fundo da mochila e toquei algumas chaves em uma argola e um monte de
sujeira, talvez folhas esmagadas. Virei-a para a luz e vi que não era sujeira: eram migalhas.
Migalhas de pão.
Apalpei atrás da bolsa e percebi um calombo, enfiei a mão nas costas do fichário e tirei
dois dos pãezinhos de Jimmy. Estavam se esmigalhando por todo lado. Colin devia tê-los
tirado do saco quando ninguém estava olhando.
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amanhã você vai entender
AcakPara Sean, Jack e Eli, campeões de risadas em horas impróprias, de amor intenso e de questões extremamente profundas. A experiência mais bela que podemos ter é o misterioso. — Albert Einstein Como vejo o mundo (1931)