Untitled Part 42

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Coisas que se desfazem

Na manhã seguinte, no caminho para a escola, enfiei nosso cartão por debaixo da porta

trancada da lanchonete de Jimmy. Na hora do almoço, Colin, Annemarie e eu subimos até

a Broadway juntos. Jimmy estava atendendo um cliente, mas nos viu pela porta de vidro,

fez cara feia e balançou a cabeça em negativa.

— Acho que ele está falando sério — disse Colin.

Ficamos parados na porta por um minuto, só para ter certeza. Quando o cliente saiu

com o sanduíche, Jimmy nos olhou novamente. Colin juntou as mãos sob o queixo como

se estivesse rezando e fez cara de cachorrinho. Uma piada besta, mas bem bonitinha.

Jimmy pegou um pano e

começou a limpar o balcão, depois levantou um braço e fez um gesto para que

entrássemos, sem nem levantar os olhos.

— Quer dizer que podemos voltar ao trabalho? — perguntou Colin quando estávamos

amontoados na porta.

Jimmy nos fitou.

— Vocês são bons garotos — disse ele —, mas na metade do tempo não sabem o que

estão fazendo.

— Não pegamos o cofre! — comecei, e ele fez um gesto para que eu ficasse quieta.

— Eu sei. Estive pensando sobre isso. Podem voltar ao trabalho.

— Eba! — Annemarie começou a bater palmas.

Colin correu batendo na mão de todo mundo, inclusive na do Jimmy, que até sorriu.

— Mas tem uma coisa — disse Jimmy quando Colin terminou a volta da vitória atrás

do balcão e na sala dos fundos. — A amiga de vocês, a pequena Miss Suíça. Não quero

mais vê-la aqui novamente. Nunca mais.

— Quem? — perguntou Annemarie.

— Acho que ele está falando da Julia — respondi.

— Você acha que a Julia pegou o dinheiro? — Colin riu. — Julia precisa de dinheiro

tanto quanto um peixe precisa de uma bicicleta.

Jimmy balançou a cabeça:

— Algumas coisas estão no sangue. Nem todo o dinheiro do mundo pode mudar o

sangue de alguém.

— O que você quer dizer com "sangue"? — Annemarie estava com as mãos na cintura.

— Que sangue?

Jimmy apontou seu grande dedo para mim.

— É como você disse: Miss Suíça, chocolate quente.

— Hã? — Colin me olhou e depois voltou a olhar para Jimmy.

Eu estava começando a entender. Annemarie já tinha entendido muito bem.

— Seu... seu porco — disse ela. — Seu porco racista.

Eu nunca tinha visto Annemarie brava. Ela estava de dar medo, e também prestes a

chorar.

Jimmy deu de ombros.

— A vida é sua. Não quero mais ver aquela pequena ladra aqui dentro. Você também

não precisa voltar.

— E não vou! — gritou Annemarie e bateu a porta.

— Mas não é por isso que eu a chamo de Miss Suíça! — eu disse.

Jimmy deu de ombros novamente, e eu saí atrás de Annemarie. Colin foi também. Nós

a encontramos chorando no meio do quarteirão, andando rápido.

Ela cuspia palavras:

— Aquele. Grande. Gordo. Idiota. Aquele. Porco. Eu. Odeio. Ele.

Colin olhou para mim.

— Eu nem entendi o que aconteceu!

Annemarie se virou e ficou de frente para nós.

— Ele acha que Julia roubou o cofre porque ela é negra.

— Tá brincando? — exclamou Colin. — Esse cara é maluco.

Annemarie então se dirigiu a mim.

— É assim que você a chama? Miss Suíça?

— Eu... não! Chamei uma vez, mas não quis dizer... Disse isso porque ela está sempre

falando sobre a Suíça, seu relógio, o chocolate e...

— É? — perguntou Colin. — Eu nunca a ouvi falando sobre a Suíça.

— Se alguém precisa de dinheiro — Annemarie disse para mim, com frieza —, esse

alguém é você, e não a Julia.

— Está falando sério? Eu não peguei aquele dinheiro estúpido!

— Esqueça — disse ela. — Quero ficar sozinha. — E saiu batendo o pé na direção da

escola.

Colin levantou as sobrancelhas e depois me mostrou uma nota de um dólar enrolada.

— Quer comer uma fatia?

Então fomos à pizzaria. Mas não foi divertido. E, ao voltar para a escola, percebi que

talvez Colin não gostasse de mim. Talvez ele apenas gostasse de pizza.

— Eu queria saber uma coisa... — falei antes de entrarmos na sala de aula. — Aquele dia

que faltaram dois pãezinhos na encomenda. Foi você que pegou?

— Foi — disse ele, ensaiando um sorriso. — Pensei que seria... Ei! Você sabe que eu não

roubei o cofre do Jimmy! — Ele me olhou com a franja no rosto, com cara de cãozinho

ofendido.

— Eu sei — apressei-me em dizer. — Sei que você não faria isso.

— Peguei os pãezinhos para fazer graça — falou ele. — Mas pegar o cofre seria, você

sabe... roubo.

— É.

Não falei com Annemarie pelo restante da tarde. Depois da leitura silenciosa, ela foi

para as aulas de arte e de música, e eu para educação física e ciências. E depois alguns

alunos do jardim de infância foram à nossa sala para cantar "Rudolph, a Rena do Nariz

Vermelho".

E depois vieram as férias de Natal.

Férias de Natal

Por

amanhã você vai entenderOnde histórias criam vida. Descubra agora