Era um dia frio de maio. Combinei que me encontraria com Kayo num café da esquina. Acordei duas horas antes e tomei um bom banho de banheira, queria que aquela água lavasse toda a tristeza que eu carregava. Vesti uma roupa quente e saí de casa. O vento gelado me cortava o rosto. Juntei as mãos na esperança de que se esquentassem. Logo começaria a nevar, a época mais linda do ano. Eu e meus pais sempre saiamos para fazer anjos de neve, era demais. Agora o triste é que esses dias nunca mais vão se repetir. Encontrei Kayo sentado junto a uma mesa do lado de fora do café.
- Desculpa, as mesas do lado de dentro já estão todas ocupadas.
- Tudo bem. - sorri.
- Então... Como você está, Anna? Nossa, mas que insensível. É claro que não tá nada bem. Desculpa!
- Não, tá tudo bem. De verdade! - menti. Era perda de tempo mentir pro Kayo, ele sabia ler a minha mente.
- Está tudo bem não estar tudo bem, Anna. Mas não vamos falar disso, só vai trazer mais dor. O que é que você tem de tão importante pra me dizer?
Ali, olhando para Kayo, consegui lembrar de cada momento que passamos juntos desde que nos conhecemos. Os sorrisos, as lágrimas. Ele era muito importante pra mim e eu sabia que aquilo era recíproco, por isso era tão doloroso tomar aquela decisão. Aquilo partiu meu coração. Mas eu precisava daquilo.
- Kayo... Desde que aquilo tudo aconteceu, meus avós tem morado comigo, eu disse que não precisava, mas eles insistiram. Só que eles tem a vida deles, eu não posso obrigar eles a ficarem aqui, não é justo. Então meu avô me fez uma proposta... Disse que eu poderia ir morar com eles, disse que eu não precisava ficar sozinha. E eu pensei muito sobre isso, no começo achei loucura, mas... Kayo, eu acho que preciso disso. Acho que preciso sair dessa cidade, eu não aguento mais. Tudo aqui me lembra eles. Tudo.
Kayo escutava tudo com atenção. Quando terminei de falar ele baixou os olhos por um instante. Quando me encarou, pude notar nos olhos dele uma profunda tristeza. Aquilo acabou comigo.
- Eu sabia que essa conversa não podia ser das boas. - sorriu. - Anna, eu sou seu amigo e eu te amo mais do que você pode imaginar. É claro que eu estou triste, mas seria muito egoísmo da minha parte se eu te pedisse pra ficar. Eu quero que você seja feliz e se isso significa você ir pra outro país, tudo bem, eu aceito.
Não pude falar nada. Apenas levantei da cadeira e fui até ele. O abracei o mais forte que pude.
- E sabendo disso, trouxe um presente. - ele disse enquanto eu voltava pro lugar.
- Um presente? Sério?
Observei-o abrir a mochila e tirar lá de dentro um álbum. Sim! O álbum! Fui pegar da mão dele e ele o puxou de volta.
- Opa, espera aí! Tem condições pra você poder vê-lo, espertinha.
- É claro que tem! Você não cederia assim tão fácil.
- Quero que abra só quando estiver no avião. Me promete?
- Vou tentar.
- Anna...
- Tá bom, eu juro!
Terminamos o nosso café e decidimos caminhar um pouco no parque, até que chegou a hora de nos despedirmos. Depois daquela despedida eu voltei a ver Kayo um ano depois e então, nunca mais.
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sur(real)
RandomQuando pequena minha avó contava histórias de vampiros malvados, e eu adorava. Dizia para eu tomar cuidado, que eles adoravam sair a noite. Eu ria e debochava dela, porque é claro, vampiros não existem. Hoje, depois de alguns anos, percebi que a min...