A assistente social da Sofie teve que ir embora e eu me senti tão mal por ela ter que ficar sozinha em um lugar que não conhece que eu acabei dormindo na poltrona do quarto.
Por algum motivo que não sei explicar, tive uma conexão com ela. Sei que não posso me apegar aos meus pacientes pois toda hora acabam morrendo.
———— Não sabia que incluíam hora do sono na creche.
Me assustei. Odiava ser acordada desse jeito.
———— Não sabia que babacas entravam na creche. ———— me levantei da poltrona ———— Já tem o resultado do exame de sangue?
Assentiu. Peguei o papel de sua mão. Que droga, não acredito nisso.
———— Merda. Eu vou ligar para a assistente social. Cuida dela para mim, tudo bem?
Saio do quarto e me encostei na parede. Pego meu celular, disquei o número e esperei alguns minutos até ser atendida.
Dar notícia ruim não é meu forte, sempre trabalhei com notícias boas. Mas eu sabia meus riscos quando quis me formar na pediatria. Um deles é ter que dar notícia ruim aos pais das crianças.
———— Alô?
———— Oi, Emily. É a Dra. Paliwal. Saiu o resultado do exame de sangue.
———— Sério? E..?
———— Vamos ter que fazer cirurgia.
———— Nossa.. não sei o que dizer. Eu não vou poder ir ao hospital.
———— O quê? Você é a responsável pela Sofie.
———— Eu sei. Mas eu não posso.
Desligou a chamada sem mais e nem menos. Sei que a notícia pode ser triste, mas ela é a responsável dela então é a obrigação de Emily vir.
Suspirei fundo. Não sabia como dizer a Sofie que sua assistente social não iria vir, ela é uma criança, não merece passar por isso.
Mas talvez eu tenha uma ideia. Se for realmente a miocardite, posso tentar falar com Alex ———— o chefe do hospital ———— e tentar convencer ele de deixar eu assumir como responsável da Sofie.
Sempre tive conexão forte com as crianças que eu trabalho, mas com a Sofie é algo diferente.
———— Ei, podemos trocar uma palavrinha?
———— Claro. O que foi?
———— A assistente social da Sofie não vem.
———— Como não? O que você falou para ela?
———— Por que acha que fui eu?
———— Porque você está sempre fazendo besteira.
———— Uma delas é ter beijado você, seu idiota! ———— digo quase sussurrando para que ninguém pudesse escutar.
Cometi muitos erros no passado e uma delas foi ter beijado ele. Eu sei, eu sei, fui idiota. Mas ele também queria.
———— Você vai marcar a cirurgia enquanto eu converso com a Sofie.
———— Por que eu sempre fico com as partes mais chatas?
———— Porque eu te chamei para o caso e eu sou muito melhor que você com as crianças.
Revirou os olhos. Ele sabia que eu estava certa nesse ponto.
———— Vou marcar para daqui uma hora.
———— Certo.
Bati duas vezes na porta do quarto antes de entrar. Me sentei na poltrona.
———— Ei, Sofie, como se sente?
———— Cansada.
Sua voz estava bem fraca. Fazia tempo que não trabalhava em um caso que me deixasse tão ligada a uma criança.
———— Pequena, seu exame de sangue não conseguiu mostrar algo que possa nos confirmar qualquer coisa para garantir que você está bem.
———— E o que vão fazer agora?
———— Vamos ter que fazer uma cirurgia.
———— Cadê a Emily? ———— pergunta.
Conheço esse tipo de criança que é apegada aos pais. Mas nesse caso é totalmente diferente, não sei nada sobre os pais dela, somente sobre a assistente social. E ela não está aqui.
———— Ela não vai poder vir.
———— Tenho medo de ficar sozinha.
———— Ei, você não vai ficar sozinha. Eu e o Dr. May vamos ficar com você o tempo todo. Você pode confiar na gente.
———— Eu não sei seu nome.
Acho que foi a primeira vez que eu não apresentei meu nome para uma criança.
———— Eu sou a Dra. Paliwal. Mas para você, pode me chamar de Shiv.
———— É um nome bonito.
Sorri. Conversamos mais um pouco e talvez eu tenha a deixado mais tranquila.
Quando fomos até a sala de cirurgia, comecei a ficar nervosa. Não precisava disso, mas tinha medo do que poderia acontecer depois da cirurgia.
Mas tudo parou por um milésimo de segundo. Minhas pernas ficaram bambas de repente.
———— É miocardite. ———— diz.
———— Pode fechar para mim?
———— Claro.
Saio da sala o mais rápido possível. Precisava de ar. Que droga, odeio me apegar as crianças, não que seja ruim, mas sei que ou elas morrem ou a situação delas sempre pioram. Eu amo meu trabalho, mas esse é um lado ruim dele.
———— Ei, o que foi aquilo? Quase surtou na sala de cirurgia.
———— Ela tem cinco anos e está com miocardite.
———— Achei que já estava acostumada com isso.
———— Tive dois casos com miocardite. No primeiro, o menino tinha melhorado e estava bem, de repente, ele morreu. E agora, a Sofie tem.
———— Pessoas morrem toda hora.
———— Como você pode ser tão insensível? Não sei como se tornou cirurgião.
———— Desculpa. Mas parece que a creche é muito mais que morte.
Não acredito que ele falou isso. Como ele ainda tem um emprego?
———— Você é idiota? Nunca falei nada da sua área médica e você faz questão de chamar a pediatria de creche. Todo dia, aquelas crianças enfrentam a morte e os pais não sabem se vão poder abraçar seus filhos de novo ou passar um aniversário juntos porque ninguém sabe o que acontece amanhã. Assim como na cardiologia, onde as pessoas têm problemas no coração toda hora e morrem também. E eu nunca fui insensível com você, nunca em toda minha vida. Então, se formos trabalhar nesse caso, você vai ter que parar de ser um babaca.
Falar tudo isso foi tirar um peso das minhas costas. Aguentei isso por muito tempo e ainda não sei como consegui.
———— Se você não se importa, eu preciso ir.
Abro a porta e ando pelo corredor. Não sei para onde ia, mas eu precisava de um tempo. Agora seria uma longa jornada para fazer com que Sofie melhorasse logo.
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ᴛᴏɢᴇᴛʜᴇʀ ғᴏʀ ᴀ ᴘᴀᴛɪᴇɴᴛ
FanfictionShivani Paliwal é uma das médicas da pediatria mais renomadas de Seattle e agora está encarregada de um caso sério, mas terá que trabalhar com um médico que odeia. Bailey May é um médico cardiologista que também trabalha em Seattle e por incrível q...