2

19 5 7
                                    

Haku bocejou pela terceira vez em cinco minutos. Já escurecera lá fora, e Takako continuava a trabalhar com uma papelada que parecia não ter fim, e como não havia nada que o rapaz pudesse fazer, ele agora estava entediado e cansado.

— Aposto que quando viajávamos juntos, você nunca imaginou que meu trabalho como miko envolvia tanta burocracia – Takako falou como que lendo seus pensamentos.

— É verdade, sim.

— A magia pode ser fascinante, ou divertida para a Sayuri, mas é só uma parte do nosso trabalho.

— E tem aumentado, não é? – Haku notara que a pilha de papéis se tornara mais alta nos últimos três meses. Takako assentiu.

— O número de legados tem aumentado, e desde que o clã anunciou que daria assistência, muitos entraram em contato. Alguns pedindo asilo, outros querem saber como isso realmente funciona, e ainda tem aqueles que só perguntam se estamos loucas por ajudar gente desse tipo.

— "Gente desse tipo"?

— Sabe como são as pessoas quando estranham algo nas outras.

Haku sabia sim. No ano em que esteve por conta própria, o rapaz tivera sua cota de olhares desconfiados, por ser pouco mais que um adolescente andando sozinho, à procura de trabalhos pesados até para homens adultos. E teve que explicar isso para Ame também.

Ele parou aí. Era muito perturbador pensar no irmão agora.

— Você pode ir para casa se quiser, Haku. Ainda tenho um último relatório para revisar.

Reprimindo outro bocejo, Haku levantou-se e deixou a sala amarela, como era chamado o escritório da sacerdotisa da terra. A sala verde, usada por Sayuri, a sacerdotisa do mar, ficava muito mais tempo desocupada. Sayuri preferia não ficar sentada atrás de uma mesa.

Enquanto Takako não se abalava em lidar com a burocracia, Sayuri preferia trabalhar lá fora, com as pessoas. Ela tomara para si o dever de ensinar os legados a dominar seus dons youkai, e por enquanto seus alunos se limitavam aos cinco adolescentes, mas ela esperava que a turma crescesse logo.

A aula tinha acabado de terminar, e os alunos deixavam o jardim da casa de Sayuri quando Haku chegou. A miko esperou que eles se afastassem para deixar cair os ombros e substituir seu sorriso por uma expressão de total cansaço.

— Ensinar é tão difícil assim? – Haku perguntou.

— O problema são os mais novos. São muito agitados e não se concentram direito. Pensando bem, acho que eu era assim na idade deles, devo ter infernizado demais meus professores – Sayuri balançou a cabeça – Eu devo tantas desculpas... Mas em parte você tem culpa!

— O quê?! – por essa Haku não esperava – Eu? O que eu fiz?

— Você disse que seria professor deles também.

— Bom, eu não esperava que seria tão rápido e – ele parou diante do olhar de Sayuri – Desculpe, eu simplesmente não estou com cabeça.

— Eu entendo. Ela não sai da sua cabeça, não é?

— Não, e me sinto um inútil por não poder fazer nada.

Todos pareciam fazer algo para ajudar. Nos últimos meses, Setsuna e os outros bibliotecários do clã trabalhavam dia e noite pesquisando antigos pergaminhos, os legados se dedicavam completamente às lições com Sayuri (os mais velhos mais do que os caçulas), e Yumeko e Kouta iam ao reino onírico todas as noites à procura de pistas sobre Mikoto.

Enquanto isso, Haku sentia-se deslocado e inútil. A ajuda que tinha a oferecer era pouca, tanto para as miko quanto para os demais. Força bruta não servia de nada no momento.

O Conto da Donzela CelestialOnde histórias criam vida. Descubra agora