O lugar era muito bonito, um pátio rodeado de árvores grandes, arbustos floridos e bonsai, com uma longa mesa de pedra para banquetes, e um enorme torii na borda oposta às escadas, mas dado o lugar onde estava, quem o atravessasse simplesmente cairia montanha abaixo.
Porém, o que realmente atraiu os olhares de todos foi Arashi, ajoelhado em frente ao portal vermelho, com uma postura rígida digna de um samurai, a katana inclusive deitada sobre seu colo. Mas o elmo, bem como as demais peças da armadura, estavam espalhados pelo chão, descartados.
Os cinco procuraram as melhores posições para agir. Mikoto e Sayuri empunharam as naginatas, prontas para se defenderem. Takako gesticulou para Yasha ir até o rapaz possuído, e mostrou o ofuda com o kami "exorcismo". O mesmo que Sayuri e Yumeko usaram para libertar Mikoto.
Yasha assentiu. Com um movimento gracioso, ela se transformou em raposa e correu para Arashi, as patas com almofadinhas batiam no chão sem produzir quase nenhum som. Quando chegou a dois passos de distância, ela voltou à forma humana e estendeu as mãos para agarrá-lo.
E esbarrou numa parede maciça e invisível. A mulher desabou de costas, o nariz sangrando, enquanto Arashi lentamente se levantava e voltava-se para os recém-chegados. A queimadura em seu rosto destacava-se ainda mais escura na luz fraca da lua que se erguia.
— Uma barreira – Takako sibilou. Sayuri estreitou os olhos.
— Mas é fraca. Dá para ver.
Ela tinha razão, Mikoto percebeu ao examinar a parede translúcida. Era uma barreira puramente física, então podia resistir a armas, mas não aguentaria um ataque feito com magia.
Sabendo disso, Takako ergueu um ofuda com o kami "raio". A corrente elétrica estilhaçou a barreira, e seus pedaços se desfizeram no ar como fumaça. Arashi, ou melhor, Akumi, sequer piscou com aquele único olho aberto que brilhava prateado. Mikoto conteve um estremecimento ao pensar que seus próprios olhos já estiveram assim.
— Você está fraca, Akumi, não é nem um décimo do que já foi, principalmente nesse corpo ferido – Yasha limpava o sangue do rosto enquanto recuava para perto das miko. Takako concordou.
— Ela tem razão. Se você não resistir...
— O que vai acontecer?! – Akumi rosnou com a voz de Arashi – Vocês vão terminar de queimar a minha alma. Farão isso de forma indolor? Sequer se importarão em matar a última youkai?
Diante dos olhos surpresos dos seus inimigos, Akumi estufou o peito e prosseguiu:
— Não bastou aos humanos apenas banir todos os youkai do mundo. Tiveram que nos exterminar – ela fuzilou Mikoto com o olhar ao final da sentença – Voltando as minhas criações contra seus propósitos originais e nos levando à extinção. Por que me impedir de salvar minha espécie de um destino tão terrível?
— Porque você ameaçou a nossa espécie – Sayuri respondeu com determinação – Você teria feito o mesmo conosco, nos condenando a ser eternamente as presas dos youkai.
Mikoto não teria dito melhor, embora a acusação de Akumi tivesse pesado um pouco em seu íntimo.
— Nosso clã e toda a humanidade nos incumbiu da tarefa de protegê-los de ameaças como você. Se extinguir a sua espécie de monstros salva a nossa, que seja. Vocês já tiveram sua chance – Takako disse com uma frieza profissional que surpreendeu um pouco Mikoto.
Akumi estreitou os olhos para a sacerdotisa da terra e expirou com irritação.
— Então que assim seja.
O que ela queria dizer? Sua expressão não era a de quem aceitava a derrota passivamente, mas o que a fantasma de nogitsune poderia fazer? Ela não tinha condição de enfrentar três miko, Yasha e Haku. Um mau pressentimento acelerou o coração de Mikoto.
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O Conto da Donzela Celestial
FantasyTerceiro volume da trilogia O Conto da Donzela Três meses após os eventos de O Conto da Donzela do Sonho, Yumeko está morando com o clã Kairiku, aprendendo a ser uma miko e procurando uma forma de encontrar Mikoto e trazê-la de volta. Mas esse não é...