Capítulo 3

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• Fernando •

Junho — Ano Passado

Pego o celular e confirmo a hora: sete horas da manhã. Quem me ligaria a uma hora dessas? Apenas Hugo.

Fernando: O que houve, Hugo?

Hugo: Nossa avó Olívia acaba de falecer.

Fernando: Como aconteceu? — a dor vem forte comprimindo meu peito, as lágrimas se acumulam e em seguida escorrem livremente pelo meu rosto.

Hugo: Parecia estar dormindo e estava com um semblante sereno. — suas palavras são objetivas e diretas, como sempre — Era como ela estava quando a cuidadora entrou em seu quarto seguindo a rotina diária, apesar de sempre levar uma bronca.

Lembro-me de como Dona Olívia respondia sua cuidadora ao acordá-la: "Por acaso eu sou uma inválida ou estou demente? Estou ótima, lúcida e viva. Não foi dessa vez que parti dessa para a melhor". Ela esbravejava para qualquer um que entrasse no seu quarto de manhã cedo. Mas dessa vez nenhuma bronca foi ouvida. Quanta saudade eu sinto dela!

Fernando: Entendi. Já avisou meus pais? Está certo. Vou me arrumar e ir para o aeroporto, vamos nos falando.

Levanto o mais rápido que posso e vou para o Aeroporto Internacional JFK (John F. Kennedy) tentar qualquer voo para o Brasil. Claro que viajar de primeira classe tem suas vantagens e sempre há um lugar disponível. Às dez horas da manhã estou embarcando. Mando mensagem para Hugo avisando meu horário de chegada e ele me responde que é melhor ir direto para o cemitério rezando para o trânsito não estar caótico e conseguir chegar a tempo para a cremação.

A vó Olívia é uma das pessoas mais importantes da minha vida, se não for "a mais". Minha conexão com ela é tão forte, que várias vezes eu recebia suas ligações certeiras sempre que algo não ia bem. Isso sempre gerou um certo ciúme nos meus primos, principalmente em Hugo. A competição entre nós dois faz parte da nossa história desde moleques, em qualquer coisa, brincadeiras, amigos, família, profissão e, especialmente, mulheres!

Desembarco no horário previsto, quase sete da noite. Trouxe apenas uma bagagem de mão, já que foi impossível remanejar as reuniões do escritório para a outra semana. Então em dois dias eu tenho que voltar para Nova York para resolver a transição no comando do escritório e organizar minha mudança definitiva para o Brasil.

Fernando: Hugo, já estou no táxi a caminho do cemitério. Eu sei que não tem como adiar o horário da cremação. Não se preocupe, eu consigo chegar! — repito para mim mesmo que eu tenho tempo suficiente para me despedir de uma das pessoas mais queridas e amadas que tenho. Aperto minhas mãos e rezo. Peço à Deus para que me ajude a estar lá antes das oito horas da noite na capela.

Minhas preces são ouvidas e, quase por um milagre, escapamos do trânsito infernal dessa cidade e chego a tempo no cemitério. Conseguiria entrar na capela e passar algum tempo com minha avó antes do cortejo até o local de cremação. Desço do táxi apressado, arrastando minha pequena mala e digitando uma mensagem para Hugo, perguntando para onde devo ir e qual o número da capela. Quando, de repente, sinto o choque de alguém batendo o corpo em mim. Só tenho tempo de ver uma bolsa indo para longe e todos os seus objetos sendo espalhados no chão. E por um reflexo automático eu passo os braços pela cintura da pessoa que quase cai no chão.

Tem uma cintura fina e posso tocar a ponta dos cabelos que encostaram na minha mão espalmada em suas costas. Abaixo minha cabeça e meus olhos se prendem na visão de uma mulher de cabelos ruivos compridos, com os olhos castanhos tão penetrantes que sou incapaz de desviar meu olhar. Por alguns instantes, eu percebo seu semblante de raiva — sim, ela está muito puta por eu ter trombado nela e ter feito suas coisas se espalharem pelo estacionamento.

Como Dominar Um CretinoOnde histórias criam vida. Descubra agora