— "Finalmente chegamos à costa"? — diz Theo. — Você realmente disse isso pra ela? Em voz alta?
Eu me remexo no sofá, constrangido.
— Quando éramos mais jovens, a gente gostava de Procurando Nemo.
— Você citou uma animação. — Theo balança a cabeça, dramaticamente. — E não deu certo. Faz mais de oito horas que vocês se encontraram, e ela ainda não deu sinal de vida.
— Talvez esteja ocupada.
— Ou talvez você tenha sido intenso demais — responde Theo, inclinando-se para a frente. Ele une as mãos entre os joelhos e se concentra. — Bem, e o que aconteceu depois que você disse essa breguice aí?
Ele é cruel.
— Nada. Nós dois tínhamos que ir trabalhar. Perguntei se ela ainda tinha meu telefone, e ela disse que tinha decorado o número, então a gente se desp...
— Calma aí — interrompe Theo. — Ela decorou seu número?
— Pelo jeito, sim.
— Tá. — Ele parece esperançoso. — Isso quer dizer alguma
coisa. Ninguém decora mais o número de ninguém.
Estava pensando o mesmo, mas também me perguntei se ela
não teria decorado meu número por outros motivos. Quando o anotei e o coloquei dentro da capa de seu celular, foi para o caso de uma emergência. Talvez parte de Lily temesse precisar dele um dia, e assim ela o teria decorado por motivos que não têm nada a ver comigo.
— E o que eu faço então? Mando uma mensagem? Ligo para ela? Espero até que entre em contato comigo?
— Faz só oito horas, Atlas. Pega leve.
Os conselhos dele estão sendo contraditórios.— Dois minutos atrás, você disse que oito horas sem receber nenhuma mensagem era tempo demais. E agora está dizendo que devo pegar leve?
Theo dá de ombros e chuta minha escrivaninha para fazer sua cadeira girar.
— Eu tenho doze anos. Nem tenho celular ainda, e você quer minha opinião sobre as regras para enviar mensagens?
Fico surpreso por ele ainda não ter celular. Brad não parece ser um pai rígido.
— Por que você não tem celular?
— Meu pai disse que vou ganhar um quando fizer treze anos. Faltam dois meses — responde ele ansiosamente.
Theo tem vindo ao restaurante depois da escola umas duas vezes por semana desde que Brad foi promovido, seis meses atrás. Ele me disse que quer ser terapeuta quando crescer, então o deixo praticar comigo. No começo, nossas conversas eram para beneficiá- lo. Ultimamente, porém, acho que sou eu que estou me beneficiando.
Brad espia meu escritório, à procura do filho.
— Vamos. Atlas tem que trabalhar.
Ele gesticula para que Theo se levante, mas o menino
simplesmente continua girando na minha cadeira.
— Foi Atlas quem me chamou aqui. Ele estava precisando de
conselhos.
— Nunca vou entender esse lance de vocês — comenta Brad,
apontando para o espaço entre nós dois. — Que conselhos são esses que você recebe do meu filho? Como evitar ajudar nos afazeres domésticos e como vencer no Minecraft?
Theo se levanta e alonga os braços por cima da cabeça.
— São sobre garotas, na verdade. E o que importa no Minecraft não é vencer, pai. É mais para socializar mesmo. — Theo olha para mim por cima do ombro enquanto sai do escritório. — Mande logo uma mensagem para ela — sugere ele como se fosse a solução óbvia.
E talvez seja mesmo.
Brad o puxa para fora do escritório.
Eu me recosto na cadeira e encaro a tela sem notificações do celular. Talvez ela tenha decorado o número errado.
Abro seu contato e hesito. Talvez Theo tenha razão. Pode ser que eu tenha sido intenso demais hoje de manhã. Não dissemos muita coisa quando nos encontramos, mas o que foi dito tinha intenção e significado. Talvez ela tenha se assustado com isso.
Ou... talvez eu esteja certo e ela tenha decorado o número errado.
Meus dedos pairam por cima do teclado do celular. Quero mandar uma mensagem, mas não quero pressioná-la. No entanto, nós dois sabemos que nossas vidas teriam sido bem diferentes se eu não tivesse cometido tantos erros com ela no passado.
Passei anos inventando desculpas que explicassem por que minha vida não era boa o bastante para ela, mas Lily sempre se encaixou. Ela sempre se encaixou perfeitamente. Desta vez, não vou deixar que ela se afaste sem me esforçar um pouco mais. A primeira coisa que vou fazer é garantir que ela tem meu número certo.
Gostei de te ver hoje, Lily.
Espero para ver se ela vai me responder. Quando vejo os três pontinhos aparecerem, seguro a respiração de tanta expectativa.
Eu também.
Encaro sua resposta por tempo demais, esperando que ela mande mais alguma coisa. Mas ela não manda. É só isso que recebo.
Foram apenas duas palavras, mas consigo ler nas entrelinhas. Suspiro frustrado e largo o celular na escrivaninha.