As aulas daquela manhã foram normais, mas a professora de inglês trouxe um desafio inesperado ao nos dar um trabalho individual. Eu secretamente agradeci; sempre achei fazer trabalhos em dupla exaustivo. Só havia um problema: o inglês.
- Não acredito! - disse Anderson ao deixar o colégio ao meu lado. - Você fala três idiomas incríveis, mas não sabe inglês? Como pode isso?
Dei de ombros, tentando esconder minha frustração.
- Não sou perfeita - brinquei. - Para mim, qualquer idioma é mais fácil que o inglês. Sempre tive um bloqueio com essa língua.
- Tudo bem, se precisar de ajuda, ficarei feliz em ajudar.
- Obrigada - sorri, apreciando a oferta.
Parados no cruzamento, aguardamos o sinal abrir. O sol brilhava intensamente, tornando o calor quase insuportável.
- Calor, né? - comentou ele, limpando o suor da testa. - Que tal um sorvete?
- Não sei...
- Manda uma mensagem para sua avó. Não vamos demorar mais que trinta minutos.
Concordei com um aceno, peguei o celular e avisei minha avó onde estaria e com quem. Cruzamos a rua em direção à sorveteria e entramos, o ar condicionado oferecendo um alívio imediato do calor lá fora.
- O que vai querer? - perguntou ele.
- Sensação - respondi, decidida.
Ele foi até o balcão e voltou logo depois com dois sorvetes em pequenos recipientes, me entregando o meu. O sabor fresco do sorvete era uma delícia no dia quente.
- Onde você quer estudar? Se sua avó não se importar, posso ir até sua casa - sugeriu ele, com a colherzinha de sorvete na boca.
Pensei por um momento. Receber visitas em casa ainda me parecia cedo, especialmente com Adan tão presente em meus pensamentos.
- Que tal na biblioteca da escola?
- Perfeito. Começamos amanhã, então - respondeu ele com um sorriso.
A conversa fluiu com leveza, me deixando mais à vontade.
∆∆∆∆∆∆
- Depois de se trocar, venha fazer companhia para mim - pediu minha avó com um sorriso gentil.
- Claro, vovó.
Subi para o meu quarto, joguei a bolsa sobre a cadeira giratória do computador e encarei o guarda-roupa. Peguei um short jeans curto, uma camisa larga, coloquei a rasteirinha e desci para o jardim.
- Por que não deixa o cabelo solto? - perguntou ela, curiosa. - Você fica mais bonita assim.
- Ele é muito comprido. Dá preguiça de arrumar.
Servi-me um pouco de chá, enquanto ela continuava a me observar.
- Deveria deixá-lo solto mais vezes.
Olhei para ela, admirando sua força. Vovó envelhecia graciosamente; suas rugas contavam histórias de lutas e vitórias, seu cabelo grisalho e seus olhos verdes mostravam o cansaço, mas também o brilho de uma vida bem vivida. Ela tinha mais de setenta anos, ainda muito charmosa, embora um pouco descuidada com a aparência desde que o vovô falecera após uma gripe severa. Mas, mesmo assim, ela mantinha seu otimismo inabalável.
- Claro, vovó. Vou arrumar mais - sorri para ela, recebendo um sorriso amoroso em troca.
- Preciso ir à casa dos Connor para devolver a vasilha que Ettan trouxe com a lasanha. Não vou chamar você para ir comigo porque sei que Adan estará lá.
- Não se preocupe comigo, vovó. Espero você aqui e preparo o jantar.
- Imagina, volto logo e cuido do jantar - disse ela, levantando-se e pegando a chaleira e as xícaras.
- Deixe-me ajudar - levantei, pegando as xícaras e a acompanhando até a cozinha.
- Volto logo. Até breve - disse ela, beijando minha testa e saindo com a travessa de vidro.
Fui para o meu quarto e encarei o computador.
- Preciso fazer uma limpeza em você - murmurei para a máquina à minha frente.
Empurrei a bolsa para o chão, sentei-me na cadeira giratória e liguei o computador. Minha meta era apagar tudo que me lembrava de Adan: músicas, arquivos e, principalmente, as inúmeras fotos que tínhamos juntos. Eu tinha um longo trabalho pela frente, um processo necessário para começar do zero.
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Você Nunca Se Foi
Fiksi RemajaApós a trágica perda de seus pais em um acidente de carro, Sophi vê sua vida virar de cabeça para baixo. Ela retorna à casa de sua avó, um refúgio familiar em meio ao caos. A dor da perda é intensa, mas a acolhedora presença da avó lhe oferece um co...