Como nossos pais

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Quando me dei conta, abri meus olhos em pleno domingo: a reunião de pais.

Noite passada, antes de dormir, avisei Stef para não me acordar cedo, pois de forma nenhuma eu iria aparecer no jardim para ver meus colegas com seus pais, enquanto eu estava sozinha. Pelo amor de Deus, isso era dar motivo para ser feita de chacota.

Mesmo assim, acordei antes de Stef, por conta de meus usuais pesadelos.

A ajudei a escolher um vestido bonito para recepcionar sua família antes da reunião, e lá se foi ela.

— Por favor, amiga, não deixe isso te abalar. Você é incrível e não precisa de pais, pois você foi esperta o suficiente para juntar sua própria família! — ela disse, antes de sair da porta.

— Obrigada. — eu disse sem jeito.

— Entendo que não queira ir, mas, não fique aqui chorando, está bem?

— Eu não vou... eu nem choro.

Nem eu entendi o que quis dizer com essa frase.

— Se não chorando é assim, imagina se chorasse... — ela riu — estou brincando, está bem? Não tem problema ser emocional, mas você é chorona sim!

Antes que pudesse responder, ela fechou a porta em meio a suas risadas.

Iria escolher um vestido para usar, em algum momento eu teria que sair do quarto, certo? Pretendo não tomar café da manhã, pois ele está sendo sendo servido no encontro de famílias. Todavia, de qualquer forma serei obrigada a descer para almoçar, e não gostaria de estar usando minhas roupas velhas enquanto todas estão bem vestidas...

Foi uma lástima eu nem ter começado a escolher minhas roupas quando olhei para a janela. Que erro...
Todas as famílias reunidas, mães, pais, irmãos...
Mas eu não vou chorar, que besteira, não sou dramática a esse ponto.

Será que tenho um irmão? Será que ele ficou com minha família e apenas eu fui deixada? Devia parar de pensar isso, esses pensamentos doem...

Mas, como já disse, eu não vou chorar.

Como seria a minha vida se eu tivesse uma família? Como seria sentir o amor de uma mãe? A proteção de um pai? Os desentendimentos e momentos preciosos com irmãos? Talvez se eu pudesse me colocar no lugar de qualquer uma dessas meninas por um dia sequer...

Não. Não vou chorar. Vou provar para Stef que não sou chorona como ela acha. E além do mais, o fato de eu não ter sido criada em uma família nunca realmente me incomodou, por que está incomodando tanto agora?

Estou acostumada com isso, nem faz sentido eu chorar.

Mas eu queria.

Até que fechei meus olhos, bem apertados, e uma lágrima escorreu deles, contra a minha vontade. A esfreguei imediatamente, como se ela nunca estivesse ali.

Quando abri meus olhos, me deparei com algo extraordinário.

Eu estava, inesperadamente, num gramado verde limão, carregando duas malas pesadas. O dia estava ensolarado, aos fundos eu via uma fazenda e uma árvore fazia sombra para onde uma mulher estava deitada lendo.

Quando a mulher abaixou seu livro, consegui ver seu rosto, ela era estranhamente parecida comigo, exceto por seus olhos, que eram ambos azuis, seus cabelos castanhos caiam sobre seus ombros e ela usava um vestido da moda, que parecia caro demais para ser usado na grama.

Ela direcionou seu olhar para mim, fazendo uma expressão surpresa, logo levantando-se e correndo em minha direção.

— Minha filha! Minha filha! — ela dizia entre os soluços de seu choro, me abraçando fortemente. — Augusto, venha cá! — ela acenava frenética para um homem em um carro, na rodovia que cruzava o local.

A Maldição de Ágatha | ⚢Onde histórias criam vida. Descubra agora