A casa do vizinho

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Os pesadelos não me abandonaram essa noite. Acordava, ofegante, a cada visão que se repetia durante meu sono... meu único conforto era perceber estar nos braços aconchegantes de Lúcia. Era a terceira noite que esses pesadelos me assombravam, e sinceramente, prefiro os dias que estive desmaiada.
Sete da manhã, finalmente desisti desse ciclo atormentante de cochilar brevemente e acordar desesperada, então, com cuidado para não acordar Lúcia, me levantei. Isso foi difícil, considerando o frio desanimador que envolvia o ar daquele dia.

Quando me dei conta que o dia de ontem tinha realmente acontecido, uma felicidade sobressaiu em meu coração. Eu estava na casa de Lúcia, havia a beijado, e havia dormido com ela! Meu coração palpitava e um sorriso enorme ilustrava meu rosto corado. Então é assim se sentir apaixonada...
Esse sentimento foi bruscamente interrompido. E se Lúcia quisesse apenas esquecer isso? E se foi apenas um surto pelo qual ela se envergonha? Não posso julgá-la, até eu ainda me sinto um pouco envergonhada por isso...

Lavei meu rosto e coloquei as roupas mais quentes que tinha, mas mesmo meu melhor casaco não era suficiente para o frio de hoje. Repentinamente, escutei barulho de motor de carro, e parecia vir daqui. Olhei pela janela, eram os pais de Lúcia. Por que estariam saindo tão cedo?

Quando me virei para trás, Lúcia havia acordado, estava sentada em sua cama, esfregando os olhos.

— Bom dia, Ágatha.

— Bom dia... — me dirigi até a cama e deitei ao seu lado — Você sabe por que seus pais saíram?

— Eles sempre saem nas férias. Sempre fico sozinha enquanto isso. Devem estar em alguma festa ou restaurante. Pelo menos agora fico com você.

Senti uma pontada de pena de Lúcia. Mesmo com o escasso tempo que estive aqui, consegui perceber que ela tinha uma relação muito distante com seus pais. Digo, apesar das dificuldades do orfanato, nunca fui solitária.

— Você parece estar com frio, quer um casaco melhor? — ela dizia, enquanto fuçava seu guarda-roupa, pegando suas roupas.

Alguns instantes depois, estávamos bem mais aquecidas, ambas de calça, camisas de botão e casacos pesados. Enquanto nos olhávamos no espelho, Lúcia colocou uma boina em minha cabeça, completando meu visual.

— Sabe de uma coisa? — Lúcia disse, abraçando minha cintura — Você é a garota mais linda do mundo.

Um arrepio percorreu meu corpo, o toque dela me trazia sensações que nunca havia sentido antes, e agora eu me sentia tão bem! Talvez ela quisesse continuar me amando, talvez conseguiríamos ter algo...

— Não mais do que você. — retribuí o abraço.
Ao descermos as escadas, encontramos uma surpresa indesejada. Era Antônio. Pensei que ele tinha ido embora ontem! Que tipo de pais deixam a menina sozinha com o noivo em casa?

— Olha quem acordou. Bom dia, princesa.

Lúcia revirou os olhos, e saiu de sua frente sem dizer uma palavra. Fiquei extremamente sem graça e não saberia o que fazer se ela não tivesse me puxado pelo braço.

— Não aguento mais esse desgraçado. — ela disse, enquanto ia para os fundos da casa comigo.

— Lúcia, ele também não tem culpa de nada... isso tudo foi arranjado por suas famílias, não foi?

— Por isso mesmo, não quero iludir o coitado. Não gosto dele, e a partir de agora deixarei isso claro, cansei de ser boazinha!

Ela tinha razão. Não era obrigada a fingir algo que não sentia.

— Está frio, não é? — agora eu e Lúcia estávamos no quintal, que era pequeno, havia apenas um tanque e um varal entre os muros da propriedade. — Por coincidência, meu vizinho, que se encontra viajando, tem uma lareira em casa!

A Maldição de Ágatha | ⚢Onde histórias criam vida. Descubra agora