WANDINHA

400 48 8
                                    


Estava com minha mãe naquele quarto de hospital, olhava para ela naquela situação, nunca imaginei vê-la em tal estado de fragilidade. Sempre fomos próximas, mas ultimamente me afastei porque não quero ser uma sombra do que ela foi. Me arrependo de não estar perto para ajudar quando ela precisou.

Eu sabia que aquilo não era uma simples maldição, lembro de ter lido nos livros da senhora Nera. Mas uma coisa não encaixava, aquilo era uma maldição que obriga uma pessoa a ser fiel a outra em qualquer sentido, e não faz sentido meu pai lançar algo assim contra minha mãe, eles estão sempre juntos e sempre demonstrando de maneira exagerada o tamanho do amor que os dois sentem.

Estava sentada na maca segurando as mãos da minha mãe e meus longos pensamentos e dúvidas são interrompidos por pessoas que pareciam estar discutindo de forma alterada ao longo do corredor. Eu reconheço a voz do meu pai e da professora Elise, isso me chama atenção e vou ao encontro dos dois. Vejo a cena e nada mais faz sentido.

_ O que está acontecendo aqui? – Digo ainda sem entender.

Vejo meu pai dar desculpas e agir de maneira diferente do que sempre agiu, não sabia o que era, mas podia ter certeza de que por algum motivo ele estava mentindo. Sempre fui observadora e consigo perceber leves deslizes que parecem o condenar. A professora ainda estava em posição de ataque olhando para meu pai, que começou a esboçar um leve sorriso, isso fez com que ela virasse para trás e quando o fez vi sua expressão mudar para total choque e seus olhos começaram a marejar.

O fato de eu não saber o que está acontecendo e ninguém faz o mínimo esforço para explicar está me deixando com raiva e frustração, me viro para ver o que se passa e assim que o faço eu me esbarro em algo ou alguém, apenas sou levada dali e apareço no que parece ser minha casa, mais especificamente na porta do quarto dos meus pais.

Percebo que estou tendo uma visão e começo a olhar ao redor do quarto com mais atenção. Vejo que ao lado da cama está um pequeno berço preto com pouquíssimos detalhes, um ou dois laços dos lados, e percebo que aquele era o meu berço. Me aproximo e me vejo tão indefesa e pequena, escuto a porta do banheiro sendo aberta e me escondo no armário mais próximo, assim que a porta se abre vejo minha mãe sair de lá, ela era jovem e tinha a mesma beleza de agora, mas seu semblante que sempre é indiferente com seu sorriso sínico estampado, estava triste, cabisbaixo, com olheiras profundas e olhos inchados, parecia que havia chorado bastante. Me espanta o estado dela, eu nunca vi minha mãe daquele jeito, ela tinha seus altos e baixos, mas isso era demais.

Ela se aproxima do berço e fica a me observar com um olhar melancólico, ela é interrompida de seus pensamentos quando a porta do quarto se abre e dela aparece meu pai, mais novo e com uma expressão que eu nunca havia visto antes, seus olhos estavam completamente negros.

Quando ela o viu seu olhar melancólico se tornou de medo, ele começou a se aproximar e ela estava se afastando, pedindo, implorando para que ele se afastasse, mas parecia que ele não estava ouvindo. Naquele exato momento eu vi o que ele fazia com ela, eu o vi forçando a minha mãe a ficar com ele. Aquilo me destruiu por dentro, fez meu sangue ferver de ódio, não consigo imaginar como ela estaria e porque se mantinha junto a ele depois do que havia feito. Sou levada dali antes de ter qualquer reação e me encontro na sala da nossa grande casa, e lá estão os dois, minha mãe sentada no sofá tricotando e meu pai se aproxima, quando ele tenta tocá-la, ela tenta o acertar com uma das agulhas que estava usando para tricotar, mas ele foi mais rápido e segura a mão dela, e seu rosto que estava amável e meio bobo como sempre havia mostrado pra todos os outros, muda completamente para seus olhos negros e seu aspecto muda totalmente para um homem louco e sem escrúpulos. O ouço dizer:

_ Lembra o que isso vai te custar cara mia?

Assim que pronuncia as palavras  ela abaixa a agulha e ele a puxa pelo braço e aponta para mim e Feioso brincando do lado de fora.

_Você vai ser minha esposa feliz para sempre, não tem como fugir de mim sem prejudica-los. – Ele diz com um sorrisinho de canto no ouvido dela.

Ela se vira e o olha nos olhos.

_ Pra todo mundo eu serei, mas você sabe que eu amei apenas uma pessoa e nada do que diga vai mudar isso!

Nesse momento eu o vi levantar a mão pra minha mãe e acertá-la no rosto com tanta força que vi escorrer um pequeno fio de sangue de seus lábios. Meu sangue ferve ainda mais e vou indo em direção a ele para defende-la, mas assim que me aproximo eu simplesmente volto, como fui tão tola ao nunca ter percebido o que ela passava.

Acordo na sala da diretora Weens?

Era a sala dela em Nunca Mais, mas como eu vim parar aqui?

Quando começo a levantar ela me para por um instante me mantendo deitada no pequeno divã de courino marrom.

_ Continue descansando, você demorou bastante nessa visão, deve estar cansada. – A diretora diz calma olhando para mim.

Mas parecia que ela estava escondendo algo, odeio quando tentam esconder algo de mim.

_ Onde meus pais e a professora Nera estão? – Digo com minha expressão de sempre.

_ Eles foram resolver alguns problemas.

_ Você não sabe onde eles foram não é mesmo?

Assim que eu digo percebo que realmente ela não sabe e me levanto para ir em direção a porta, não importa onde eles estão eu vou encontra-los, preciso deixar minha mãe longe dele, não sei porque, mas ela não consegue se afastar por conta própria. Sou interrompida pelas mãos da diretora a segurarem meu braço, tento me soltar, mas ela põe mais força me mantendo presa, e então ela me vira e diz:

_ Não posso te deixar ir. Não sei o que está acontecendo, mas me pediram para te manter segura e é isso que irei fazer. – Fala de forma firme e irredutível.

_ Eu tenho que ir. Minha mãe está em perigo e eu não vou ficar aqui sentada apenas esperando.

Consigo me desvencilhar da diretora que vacilou por um instante quando disse que minha mãe estaria em perigo, corri o máximo que pude para fora de sua sala e a ouço tentando me acompanhar. Sigo o corredor, mas sou parada por uma silhueta me encarando logo no final do mesmo, não dava para ver quem era, mas assim que me viu começou a parar e a tirar o que parecia ser uma arma de fogo das costas e a ponta em minha direção.

Tudo por elaOnde histórias criam vida. Descubra agora