Oito patas sob o sol

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     Um sol quente castiga o dia lá fora, os animais caminham pacificamente pela rua, roedores, aves, alguns canis e felis, o mundo mudou de forma incrível depois dos incidentes envolvendo a supremacia racial há pouco mais de um ano, nem todos os culpados foram capturados ainda, Roman Turing está foragido junto de sua esposa, Marduk está preso, mas sua ideologia não morreu, as feridas deixadas na sociedade foram inúmeras, e aos poucos animais como o Grupo Alfazema tentam reparar essas feridas como podem.

     Chloe está tentando aos poucos reconstruir o antigo refugio do Pata-suja, voltar para a ideia inicial do lugar, tornando-o menos fechado e mais transparente para todos, ela faz o que pode e está a seu alcance para ajudar animais sem casa ou perdidos.

     Baransha continua morando no mesmo lugar de antes, mas por conta de alguns movimentos do governo e principalmente do Grupo Alfazema, seu povo consegue existir de forma mais segura e saudável, apesar dela ainda não falar com Lionel.

     Num geral o governo da Cidade das Bestas agora com um novo presidente, tenta amenizar a situação dos que sofreram com o golpe, mas as coisas são muito mais difíceis na prática.

     Um novo diretor assumiu o controle de Universidade Muridae, a gestão da escola não está tão boa quanto era com Mice, mas as coisas estão tentando se ajustar, finalmente após esse tempo, parece que o dia nasce cada vez mais vivo.

     Al sai pela porta da frente da faculdade com uma mochila nas costas, ele olha para o campus e respira fundo, caminhando gramado afora, vários animais estão por ali estudando de baixo das arvores ou simplesmente passando o tempo lendo algum livro, brincando ou lanchando, o jovem mustelo caminha lentamente até a calçada, aquele dia especialmente tem sido mais difícil que os anteriores apesar do longo tempo, aquilo tudo deixou marcas profundas nas pessoas, mas principalmente em Al.

     O mustelo caminha até um grande memorial no centro da grande praça, um enorme obelisco de ardósia com nomes das vitimas esculpidos nele, ele caminha de forma precisa até um canto especifico do grande monumento e para em sua frente.

- Que saudade... - Ele diz com uma expressão triste no rosto. - As vezes fico pensando como estaria agora... Tipo... O que pensaria, o que me diria... Ah, besteira. - Al dá um sorriso conformado e dá de ombros se virando, dando de cara com um mustelo lontra como ele, quase da mesma idade, ele está com uma mochila enorme nas costas, segurando um folheto da universidade nas mãos.

- Eita! - O menino diz dando um passo para trás. - Nunca achei que encontraria outra lontra em Muridae. - Ele indaga sem graça abrindo um sorriso acanhado no rosto.

- Ah, oi... Você é novo por aqui? - Al chacoalha a cabeça deixando o assunto a pouco de lado por um instante.

- Sim, me mudei ontem a noite, você estuda aqui né? - O garoto pergunta seguindo andando apontando para a mochila de Al com o símbolo da universidade, Al dá uma ultima olhada para o nome escrito na pedra e o acompanha

- Estudo, faço história...- Al responde confirmando.

- Sério? Acho demais! Eu quero entrar em geografia, mas historia é minha segunda opção. - O outro diz enquanto para na frente de Al. - Prazer, me chamo Mi'rio! - Ele dá com a mão em direção a ele.

- Al'cyr. - Ele responde cumprimentando abrindo um sorriso forçado no rosto, o garoto claramente percebe, mas continua a conversa.

     Ambos seguem andando pela rua enquanto conversam, o garoto está claramente entusiasmado com a universidade, os dois caminham até uma esquina pouco movimentada quando Al para.

- Bem, eu fico por aqui, nós podemos nos conversar outra hora... - Ele diz dando com a mão.

- Err... Quer tomar um café? Ou comer alguma coisa, dai pode me falar mais daqui, é por minha conta! - Mi'rio diz levantando as mãos com um sorriso amigável.

- Foi mal, eu não posso hoje... - Al diz dando um passo para trás, o garoto dá de ombros e confirma. 

- Tudo bem, quando puder é só me dar um toque. - Ele diz tirando um papel do bolso e anotando o telefone.

- Pode deixar. - Al mostra um sorriso para o garoto que retribui seguindo a rua em direção ao centro.

     O mustelo caminha terreno adentro, um quintal simples, grama verde e algumas plantas em frente a um deck de madeira da casa, ele sobe pelo mesmo e leva a mão até a mochila, tirando um molho de chaves, caçando a correta.

     Logo que abre a porta uma bofetada de ar fresco vem até ele, um cheiro que remete a tranquilidade, Lionel emprestou essa casa ao mustelo para que morasse na universidade sem problemas com aluguéis superfaturados e pudesse focar mais nos estudos.

     Al caminha pesadamente até a sala, um lugar bem arrumado e bem maior do que ele, já que foi do leão no passado, e se joga no enorme sofá, ele pega o papel nas mãos e o olha.

 "Mi'rio 451-8852
        Me liga :D"

     Então coloca o papel em cima da mesa de centro e relaxa recostando a cabeça para trás, respirando o ar fresco dali de dentro profundamente enquanto permanece com os olhos fechados, acabando por cair no sono.

     Então ele sente algo lhe cutucar em um dos ombros, Al abre os olhos pesados e dá de cara com Math, o canis abre um sorriso de deboche e chacoalha o papel com o nome e número.

- Ah... É um garoto que veio falar comigo... - Al responde passando a pata nos olhos, Math coloca o papel em cima da mesa. - Ah droga! Quanto tempo eu dormi?! A gente tem que fazer as malas. - Al levanta do sofá assustado correndo até uma escadaria se ponto a subir, ele corre alguns degraus acima e escuta no fundo.

- Al... - A voz de Math sai muito baixa e rouca, o mustelo para e se vira, Math caminha até ele e gesticula em linguagem de sinais apontando para a porta, que ele mesmo já fez as malas.

- Porque não me acordou seu bobão?- Al pergunta descendo os degraus ate ficar na altura do canis.

     Math abre um sorrisinho e gesticula dizendo que Al estava tão fofo dormindo que ele não teve coragem, além de que, ele está cansado depois da semana de provas, então tem que aproveitar como pode.

     Al olha para a porta e em seguida para o canis e dá um sorriso.

- Eu te amo Mathinson. - Ele diz agarrando o canis pelo pescoço com os dois braços, Math leva a pata até o pescoço apertando aparelho acoplado a sua garganta.

- Eu também te amo Al. - O canis diz com a voz pesada e profunda, em seguida encostando um focinho no outro.

- Agora não se esforça! - Al dá um tapinha na cabeça dele e pula escada abaixo. - Você lembra o que o Lionel disse, se não descansar pode acabar perdendo ela para sempre! - Ele indaga agarrando uma mochila pequena com rodinhas enquanto Math agarra outra de mão maior fingindo imitar Al'cyr falando e reclamando, mas sem soltar sons pela boca.

     Al corre deixando a mochila na calçada, o sol está mais fraco do que quando chegou em casa, ele dá uma olhada de longe para a universidade e outra para o obelisco que é quase visto de qualquer ponto da cidade.

     Math se aproxima e coloca a mochila no chão, gesticulando com as patas, dizendo que ficará bem, Al confirma com a cabeça e sorri abraçando o cão.

- Só sinto falta da minha mãe... Queria que ela visse onde cheguei. - Al diz olhando o nos olhos.

     Math diz que Baransha contou para ele uma vez que eles sempre estão no céu, olhando para eles, esperando que eles possam chegar na hora certa, e coloca a pata no peito de Al.

- Você já me disse isso pelo menos umas vinte vezes... - Al ri e dá de ombros. - Gosto de saber disso. -

     Math faz um sinal agarrando a mala de mão e a mochila, seguindo a calçada em direção ao porto, fazendo um sinal para que Al o siga, o mustelo dá uma ultima olhada para o obelisco e corre atrás do canis.

     Oito patas sob o sol.



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