Capítulo 64

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Os cômodos de Grimmauld Place eram exatamente como Harry se lembrava deles no verão; escuros, sombrios e perfeitamente compatíveis com seus espíritos decadentes.

Ele podia ouvir vozes na sala de estar, murmúrios entrecortados. Ele hesitou, congelado no local, antes que seus pés começassem a levá-lo para frente sem permissão consciente.

Lá estavam os Weasleys. A roupa preta contrastava fortemente com a chama alaranjada de seus cabelos, Sirius Remus e Hermione também estavam lá.

Ele podia sentir sua garganta apertando com a visão.

Ninguém na sala estava chorando, mas em vez disso havia um silêncio terrível, frio e mortal, e traços de dor por toda parte. Rostos totalmente brancos, olhos vermelhos e inchados, lábios pressionados em linhas finas e mãos trêmulas.

A tristeza permeava a casa, pesada e opressiva. Eles pareceram notá-lo, mas por um momento ninguém disse nada.

Gina imediatamente passou por ele, as feições contraídas, batendo a porta atrás dela sem dizer uma palavra. Harry se encolheu quase visivelmente.

- Sinto muito por sua perda.- disse ele calmamente.- Há algo que eu possa fazer?

A Sra. Weasley estava ao redor dele instantaneamente, seus braços esmagando-o em um abraço.

- Oh, Harry, graças a Deus você está bem, não havia sinal de você ontem à noite.- disse ela. Harry instantaneamente se sentiu um milhão de vezes pior. Ela o soltou depois de um momento, com os olhos marejados.- Ele ficaria feliz por você estar bem.- ela declarou trêmula, antes de se dissolver em lágrimas.- Desculpe.- ela soluçou.

- Não se preocupe com isso.- Harry respondeu suavemente.- Está tudo bem...eu entendo...você está de luto.- ele hesitou impotente em suas palavras.

O que ele estava fazendo aqui? Ele não sabia o que fazer para ajudar, não conseguia encontrar palavras significativas para dizer. Harry não sabia como lidar com essas emoções, como preencher a lacuna ou torná-la melhor ou mesmo confortar...ele nunca realmente deu conforto, especialmente não para algo assim.

Ele já havia recebido consolo antes, mas, a menos que fosse Tom, parecia estranho. Toda a sua experiência nesse tipo de segurança veio de um momento de embriaguez com um psicopata...e esse provavelmente não foi o melhor exemplo para seguir. Deus.

Rony estava olhando para ele, uma expressão estranhamente plana em seu rosto. Harry resistiu à vontade de se encolher.

- Estou surpreso que você se deu ao trabalho de aparecer.- o ruivo falou, oferecendo um sorriso tão obviamente não caloroso que nem poderia ser realmente classificado como um sorriso.

- Rony, dá um tempo.- murmurou um ruivo mais velho, que ele presumiu ser Bill ou Charlie.- Agora não é hora de brigar.

- Claro que eu vim.- Harry disse, cautelosamente.- Você é meu melhor amigo.

Rony fez um barulho no fundo de sua garganta.

- Sou mesmo? Porque ultimamente, parece que seu melhor amigo é Riddle.

Harry reprimiu um suspiro.

- Não, não faça isso.- disse ele calmamente.- Não traga Tom para essa conversa só porque você está com raiva de mim. Ele não tem nada...

- Ele não tem nada a ver com isso?- a voz de Rony aumentou tanto em tom quanto em ruído, incrédula.- Ele tem tudo a ver com isso! Talvez se ele não tivesse te arrastado para fora da escola a noite toda, meu pai ainda estivesse vivo!

Houve um silêncio chocado, tão alto que poderia ter sido um grito.

- Na verdade, Tom não me arrastou para lugar nenhum. Eu fui por conta própria.- Harry corrigiu, a voz muda em comparação com os gritos de Rony.- Da mesma forma que eu faria se você ou Hermione me pedissem. Sinto muito pelo seu pai, mas não foi culpa de Tom. Foi minha. Eu escolhi ir, e não tive a visão...

Ele não teve a chance de terminar antes que Rony saísse da mesma forma que Gina. Hermione parecia completamente dividida.

- Vá atrás dele.- Harry instruiu. Rony precisava mais de uma amiga agora. Hermione sorriu levemente, abraçando-o com força, antes de correr atrás do ruivo. Um silêncio constrangedor caiu sobre as pessoas restantes na sala.

- Eu deveria ir fazer o almoço.- a Sra. Weasley murmurou, saindo apressada, parecendo tentar enxugar as lágrimas discretamente.- Vocês todos devem estar com fome.- ela continuou, enquanto a porta se fechava.

Ela estava claramente tentando fingir um falso brilho, procurando um motivo para permanecer forte por seus filhos.

- Bem.- Sirius disse fracamente no silêncio seguinte.- É bom ver você, filhote.

- Você também.- ele murmurou.

Foi muito mais tarde, quando Harry estava desfazendo a mala (ele dormiria com Sirius e Remus no antigo quarto de Sirius, pois não havia espaço suficiente para cada um ter seu próprio quarto com o súbito fluxo de visitantes, e ele achou que não seria uma boa ideia dormir com os gêmeos e Rony) que a porta se abriu.

Era Fred e Jorge.

Ele se endireitou imediatamente, ficando tenso quando eles fecharam a porta atrás deles e dispararam um feitiço silenciador. Eles estavam tão cheios de ódio em relação a ele quanto seu irmão mais novo?

Sua garganta apertou. Sua mão se fechou ao redor do cabo de sua varinha em paranóia, mas os dois simplesmente se aproximaram, gesticulando para que ele se sentasse entre eles. Ambos haviam guardado suas varinhas.

Harry deu um suspiro silencioso de alívio, culpado por pensar que os gêmeos iriam atacá-lo. Esta casa só o deixou nervoso. Ele não sabia por que, mas se sentiu estranhamente inquieto o dia todo.

- Você deveria ignorar Rony...- Jorge começou.

- O idiota só está de luto...- Fred continuou.

- Ele realmente não quis dizer nada do que disse a você até agora, ele só está com raiva do mundo.- os dois terminaram, olhando para ele com expectativa. Harry simplesmente acenou com a cabeça, sem saber o que dizer sobre isso, mas então as palavras escaparam antes que ele pudesse pegá-las em sua língua e colocá-las de volta em sua garganta.

- Vocês não parecem zangados comigo.- disse ele.- Por que não?- Os gêmeos lhe lançaram sorrisos idênticos e cansados.

- Isso é porque somos incríveis.- disseram.

Harry sorriu levemente apesar de si mesmo.

- Obrigado.- agradeceu, sem especificar pelo que estava grato.

Eles pareceram entender, cada um apertando um de seus ombros antes de sairem novamente.

- Ah, e mamãe disse que o jantar é daqui a meia hora.- gritou um deles, enquanto fechavam a porta atrás de si.

Harry observou a porta por um momento, inexpressivamente, ouvindo seus passos desaparecerem no corredor. Ele se sentiu tocado por eles terem se dado ao trabalho de tranquilizá-lo, mesmo de uma maneira tão pequena, aparentemente insignificante e sem palavras, apesar de estarem no meio de seu próprio luto.

Esse era exatamente o tipo de filho que o Sr. Weasley havia criado.

Ele ficou sentado entorpecido por um momento, perdido em pensamentos e memórias, antes de continuar desempacotando com um vigor renovado, desesperado para não ser deixado sozinho com as sombras em sua mente.

Ele estava apenas sacudindo uma camisa (o funeral seria em uma semana, ou assim a Sra. Weasley havia dito, feito rapidamente devido ao fato de que a ordem precisava não chamar a atenção) quando ele notou o pedaço de papel amassado preso a uma pequena coisa parecida com um folheto que ele definitivamente não havia colocado na mala.

Ele o pegou, olhando-o desapaixonadamente, antes que seus lábios se contraíssem com relutância.

Era um livro sobre os cinco estágios do luto.

É normal sentir raiva? Sentimentos de abandono...culpa...difícil aceitação...

Não tendo certeza se deveria ficar irritado com isso ou não, ele o escondeu entre sua pilha de camisetas, antes de voltar seu olhar para o bilhete anexado.

Não desmorone, e culpe Zevi pelo livro ruim.

O Favorito do DestinoOnde histórias criam vida. Descubra agora