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Gatilho: Transtorno alimentar, tristeza profunda 

Um dia melhor

Andrade

O cansaço me venceu, em qual momento a vida seguiu e me deixou aqui? Qual foi o momento em que ela olhou para mim e apenas seguiu sem mim. Um suspiro pesado deixou o meu peito, eu tomei minha medicação, eu o chamo de pílula da felicidade. Ainda não estava feliz, os cachorros estavam correndo de um lado para o outro, eles estavam me chamando para brincar, eu joguei o brinquedo e os dois correram para buscar. Me joguei em cima da minha cama bagunçada, peguei o meu celular e vi que minha mãe tinha me mandando uma mensagem, "Sarah, meu amor, como está? Eu e o seu pai, queremos conhecer sua casa nova, e onde será a sua empresa, quando podemos ir?", nunca seria uma boa opção, eu não vejo meus pais a um bom tempo, mas minha mãe nunca me deixou de me vigiar mesmo de longe.  Suspirei cansada, respondi que no fim de semana era uma boa ideia.
Fui até o meu banheiro, tomei um banho rápido e vesti algo mais confortável, penteei o meu cabelo, desembaraçando todos os nós que tinha, eu olhei  para o lado de fora enquanto a escova pelos fios castanhos escuros enquanto os arrumava no lugar, a vista era linda da minha janela do quarto, eu chamei os cachorros e saímos os três para o campo, eles se deitaram cada um de um lado, minhas pernas encostavam no meu peito, meus olhos observavam o lindo campo florido, nesse momento senti meus pensamentos tão distantes, estavam tão longe, eu me senti em paz, finalmente eu tive um momento em que minha cabeça não pensava em, milhões de coisas a cada segundo, eu tento a tanto tempo me sentir assim, ao mesmo tempo acho que minha escuridão não tem mais volta, eu não conseguiria mais ser a mesma, acho que eu me perdi, me perdi dentro da dor e sofrimento que eu sinto, como se a cada segundo, minuto, hora, dia, semana, mês e ano, um pedaço de mim fosse embora, da minha verdadeira eu, não existe mais volta a esse sofrimento sem fim? Onde fica o mundo perfeito que idealizamos? A casa dos sonhos, o trabalho dos sonhos, ganharmos dinheiro, o homem perfeito e a família perfeita? A maioria das pessoas, como eu, já idealizaram isso, pelo menos uma vez na vida, meus pais são casados a 38 anos, eles namoravam desde os 14 anos, mais eu não tive a mesma sorte no amor, na família, eu só queria estralar os meus dedos e apagar todas as más memórias, quero a minha vida antiga de volta, a garota loira, dos olhos claros, que namorava o cara mais desejado do colégio, se formaram juntos, casaram, construíram uma empresa juntos, começaram a gerar uma vida juntos, quando a garota loira não manteve a vida dentro de si, o casamento acabou, o amor saiu pela porta dos fundos, em um piscar de olhos não estava mais lá, como em um estalar dedos, a garota loira, bonita, dos olhos claros, era na verdade burra, nunca existiu o tal "amor verdadeiro", isso foi apenas uma invenção criada pela sociedade hipócrita, enganando pessoas, com o seu chamado "alma gêmea", a garota loira, eu, criei uma nova face, dentre todas as facetas que eu tive, jovem, apaixonada, mãe, morta por dentro, eu só cansei de sentir, amor, sexo, paixão, ódio, nada disso tem graça ou até mesmo importância, tudo se torna uma banalidade quando você vê que sua vida não anda mais, eu estou presa como se estivesse em uma cadeia, bem, eu estou, ela se chama passado, meu rosto estava molhado, as lagrimas desciam pelo meu rosto sem parar, eu estava pensando novamente, por que essas memórias não podem sumir, como o nosso amor sumiu, substituído pelo traição por alguém tão próximo, sangue do meu sangue, como pode, era minha própria irmã, como eu confio em alguém novamente? Minha confiança não é crê nem em minha sombra, como em outra pessoa? Eu nunca vou me encontrar  novamente, essa minha face, ela foi perdida, ou morta, a muito tempo atrás.                                                                                                                                              Ouço os pássaros cantando, eu limpo minhas lágrimas e suspiro, olho de longe avistando a mulher de ontem saindo de um carro, com sacolas de mercado, ela parecia ser uma boa pessoa,  talvez fosse alguém que eu pudesse ser colega, bem, ou talvez apenas a minha vizinha, nunca fui muito boa para fazer amigos. Me levantei e peguei meus cachorros, entramos para dentro de casa, tranquei as portas, janelas e fechei as cortinas. Peguei uma taça de vinho e um chocolate da cesta que a minha vizinha a via me dado, me sentei no tape da sala, liguei a televisão e comecei a ver um filme, um filme de terror, era o meu gênero favorito, "Iluminado", um clássico dos filmes de terror, acabo bebendo todo o vinho e comendo sozinha duas caixas de bombons que tinham na cesta, quando olhei os papéis abertos e vazios, a garrafa de vidro completamente vazia, a culpa recaiu sobre os meus ombros, eu não deveria ter feito isso, não deveria ter comido isso, eu não podia, por isso que você foi abandona, garota imbecil, nunca vai ser bonita dessa forma, me levantei e comecei a recolher papéis, joguei no lixo as embalagens plásticas e a garrafa de vidro verde escura, nesse momento a culpa era tão grande em mim, os meus cachorros estavam dormindo juntos, isso com toda a certeza foi um erro, eu me sentei ao lado do sofá no chão, com as pernas encostadas no meu peito, esperei por míseros minutos, fui até o banheiro, encarrei o vaso sanitário, levantei a tampa, me abaixei, os meus dedos entraram no fundo da minha garganta, eu fiz isso algumas vezes até que o meu vomito saiu, eu fiz isso duas vezes, segurei o meu próprio cabelo para não sujá-lo e me encostei na parede, a tristeza fazia morada dentro de mim e então eu comecei a chorar, eu apenas chorava sentindo a culpa por tudo o que eu fiz na minha vida, eu era a real culpada por estar aqui agora, estar nessa situação de merda enquanto a vida das pessoas seguem e continuam, mesmo tendo altos e baixo, talvez eu esteja muito embaixo para subir. 

Eu ainda te procuroOnde histórias criam vida. Descubra agora