CAPÍTULO 03

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Inácio saiu do quarto, desligou a TV e ainda jogou fora as bitucas de cigarro que deixei no cinzeiro, mas não vi a sua cara naquela manhã

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Inácio saiu do quarto, desligou a TV e ainda jogou fora as bitucas de cigarro que deixei no cinzeiro, mas não vi a sua cara naquela manhã. Nada mais além da minha cara amarrotada no banheiro da Amália. Como em todas as outras vezes que Oscar aparecia por ali, a casa estava de cabeça para baixo e tinha aquele cheiro do perfume caro dele. Chegava a me dar enjoo.

Da última vez que tentei falar com Amália sobre a sua situação ela me cortou na hora, como se tudo ali fosse a coisa mais normal do mundo, mas nunca vai ser normal uma garota foda que já passou por tanta merda como ela abaixar a cabeça de maneira tão fácil para uma situação podre. Era como se ela acreditasse que merecia aquilo. Às vezes queria ter pelo menos um terço da coragem do Vicente só para mandar aquele merda pro quinto dos infernos.

A verdade é que o Vicente fazia falta pra caralho.

E foi ele que ocupou espaço nos redemoinhos da minha cabeça e nos entrelaçamentos dos meus pensamentos. Não prestei atenção durante a semana, mas Amália havia feito outros sacolés e só por causa disso que juntei a trouxa e fui pra praia depois do café. Repus meu maço, mostrei a identidade para um ou dois policiais, comi uma quentinha, vendi todos os sacolés, cantei com uma roda de samba que burlava as regras de distanciamento no quiosque, curei os efeitos colaterais do álcool na visão do pôr do Sol na mureta de Ipanema, no meio de um bando de gente mesquinha que talvez nunca entenderia o prazer que eu tinha em contemplar aquela infinitude toda.

Vicente ia gostar daquilo, mas ele não estava mais ali. Seu Venceslau também gostaria de ver o mar, mas os olhos estavam cansados e ele não confiava mais em mim, nem sequer lembrava de mim. Estranho ter tanta intimidade de lembranças com pessoas que não existiam mais como eu lembrava.

Só voltei depois das oito.

— Que susto! — Encontrei o tom castanho e surpreso dos olhos da Amália de pé na cozinha. — Onde você estava? — Ela estava ocupada com algo no fogão, tinha uma travessa envolta por papel alumínio sobre a pia.

Larguei o isopor e tirei a máscara antes de encurtar a distância até o objeto curioso que reconheci ao levantar o papel. Era a minha lasanha intacta.

— Como isso veio parar aqui?

— Porra, Tobias! — Ela reclamou sem me responder. — Tá sujando tudo de areia. — Analisou o piso claro antes de intercalar o olhar entre mim e o molho na panela.

Tinha frango temperado em uma vasilha. Aquele jantar não era para mim

— Como isso veio parar aqui? — repeti a pergunta começando a ficar puto com o Inácio.

Por mais que não tenha jogado fora, via aquilo como uma desfeita.

— O Inácio trouxe, disse que era pra gente jantar. — Havia confusão sobre as linhas de sua pele negra. — Mas o Oscar odeia lasanha.

🏳️‍🌈| O Mar que Aqui RetornaOnde histórias criam vida. Descubra agora