6| O acidente

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O som do carro não me deixava dormir. Alice brincava com seu coelhinho barulhento,  qual eu também já havia desejado jogar janela à fora, mas o seu possível escândalo não valeria a pena. Então, me contentei em admirar a estrada. Mamãe dirigia rápido, parecia estar com presa.

Normalmente ela tinha presa, mas isso era por conta do trânsito... E agora, não estávamos na cidade. Na verdade, mamãe havia saído da cidade já fazia alguns minutos, e Daniel não estava com a gente.

Mãe...ㅡ a chamo, mas ela não me olha. ㅡ Para onde estamos indo?

Um breve silêncio se perdurou antes dela dizer:

ㅡ Para a casa da vovó. ㅡ sua voz sai baixa demais.

Pisco algumas vezes à medida que Alice comemora, batendo as mãos. Vejo seu olhar recair sobre nós através do retrovisor, e depois voltar para a estrada.

ㅡ Por quê? ㅡ perguntei, curiosa. Vovó morava longe, e nem havíamos entrado em casa. Mamãe havia nos buscado na escola e decidido ir para a casa da vó. Ainda estávamos de farda, e ela estava pinicando a minha pele.

ㅡ Porque sim, Marie. ㅡ disse, dessa vez mais firme.

ㅡ Está calor. ㅡ murmuro, o que a faz suspirar. E estava mesmo. Eu estava transpirando muito, mesmo que as janelas estivessem abertas. 

ㅡ Você poderia aguentar até chegar lá? O ar está quebrado. 

Fico alguns segundos quieta, até Alice perguntar:

Onde está o papai? ㅡ sua voz sai baixinha e um pouco embolada por conta de sua idade, mas Alice era esperta.

Mamãe não a responde.

ㅡ Onde está o papai, mamãe?!ㅡ se irrita, falando mais alto agora.

Escuro mamãe exalar pesado, mas permanecer quieta. Então, como se tivessem a ferido, Alice começa a chorar.

ㅡ Eu quero o papai!ㅡ bate o boneco no banco antes de jogá-lo contra meu rosto, o que me faz gemer de dor.

ㅡ Ai, Alice!ㅡ seguro seus braços, o que a faz chorar mais. ㅡ Para!

ㅡ Dá pra vocês duas se comportarem aí atrás?!ㅡ mamãe briga, me fazendo soltar Alice que ainda se esperneava. ㅡ Alice, já chega!

Eu quero o papai!

Mamãe dá um tapa no volante antes de explodir:

ㅡ O seu pai nos deixou, Alice! Ele estava com a puta da Valentina antes mesmo de...ㅡ avisto um carro vindo em nossa direção, e é quando grito para que mamãe olhe para frente, que sentimos o impacto.

Não lembro de muita coisa, não quando estávamos girando e girando e girando e girando e girando e girando...


ㅡ Marie...ㅡ abro meus olhos, ofegante e assustada. Alice me encara de cima, com a luz da tela do celular em meu rosto. ㅡ Está tudo bem... Foi apenas um sonho. ㅡ sussurra.

Me sento na cama, respirando fundo e passando a mão pelo cabelo um pouco bagunçado.

ㅡ Que horas são? ㅡ pergunto, mas no fundo eu não me importava com as horas, e sim se eu tinha acordado vovó.

Alice olha o aparelho em suas mão e depois diz:

ㅡ Três da manhã. ㅡ suspira, parecendo cansada. 

ㅡ Te acordei de novo, não foi? ㅡ pergunto um pouco decepcionada comigo mesma. Alice havia se oferecido para voltar a dormir aqui, e isso havia feito com que ela não dormisse bem, já que eu sempre a acordava com meus espasmos.

Alice sorri fraco.

ㅡ Relaxa. ㅡ desliga o celular e anda até a sua cama. ㅡ Você estava falando sozinha.

Pisco algumas vezes, ainda me lembrando do acidente.

ㅡ Me desculpe.

Ela se ajeita na cama e me olha.

ㅡ Já disse que não precisa se desculpar. Não é sua culpa.

Engulo em seco e volto à deitar, encarando o teto. Vovó não havia conseguido uma forma de afastar os pesadelos, e ultimamente eu estava os tendo todas as noites.

ㅡ Boa noite, Alice. ㅡ murmuro, me virando para voltar à dormir.

Alice responde algo inaudível, antes de também cochilar. Quando o sono e bate novamente, é como se o pesadelo já estivesse me esperando...

 Quando o sono e bate novamente, é como se o pesadelo já estivesse me esperando

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Calma, vamos tirar vocês daí!ㅡ uma voz masculina nos disse.

Alice chorava ao meu lado, e como irmã mais velha, eu deveria acalmá-la... Mas não conseguia. Meu corpo estava paralisado. Meu olhos não desgrudavam do copo de mamãe sobre o parabrisas, em meio aos cacos de vidro.

Ela não se mexia desde o tempo em que ficamos aqui, esperando o socorro. Algumas pessoas acalmavam Alice da janela, mas não chegaram a nos tocar.

Não conseguia interagir com elas. Não conseguia se quer pensar. Eu estava com dor. Muita dor por conta do impacto, mesmo que o cinto tivesse me segurado.

Mamãe não devia estar com cinto.
Por que ela ainda não tinha acordado?

ㅡ Vai ficar tudo bem...ㅡ alguem disse.

Fiquei ali por um tempo, até escutar máquinas contra a lataria e sermos retiradas dali por homens fardados.
Só então que reagi para pedir que não levassem Alice para longe.

ㅡ Sua irmã está bem. Ela vai ser avaliada assim como você...ㅡ o homem me disse.ㅡ Fique calma, pequena.

Não consigo me mexer, estou imobiliza.

ㅡ Onde está mamãe? ㅡ é a última coisa que pergunto antes de me levarem.

Ninguém me responde, talvez, não tenham me escutado. Ou a minha voz que havia sido muito baixa.

Tento me concentrar em perguntar isso outra vez, mas há algo em meu rosto, me fornecendo o que parecia ser "ar". Sem contar na moça que não parava de falar coisas para mim.

Encaro o teto, piscando lentamente, sentindo minhas pálpebras pesadas. Cedo ao cansaço. Eram apenas alguns minutinhos de sono... E estava difícil respirar.

Mas acho que não queriam que eu dormisse.




Me And The Devil ( Em Andamento)Onde histórias criam vida. Descubra agora